Borrachas e erros por apagar
Nuno Pacheco
“Público”, 12.07.15
Aprender em Londres é quase sempre uma coisa catita. Vejam naquilo que toda a gente reparou em Euclides Tsakalotos, o sucessor de Varoufakis na pasta das Finanças gregas: estudou em Oxford. Mas só estudar em Londres não chega. Veja-se o que sucedeu a outro senhor que por lá estudou, por sinal um reputado cientista cognitivo, Guy Claxton. Deu-lhe para atacar as borrachas! Segundo ele, essas pequenas companheiras de todas as infâncias devem ser banidas. Apagadas para sempre. E porquê? Porque, diz ele do alto da sua sabedoria cimentada no King’s College, elas promovem “uma cultura da vergonha e do erro”. E também da mentira. Pois quem apaga e reescreve estará a mentir aos outros e a si próprio, como se dissesse: acertei à primeira, não emendei nada, sou genial! Ora este raciocínio é, no mínimo, idiota. Uma borracha, como o botão “delete” de computadores e similares, não serve só para apagar erros. Serve também para apurar a escrita ou o traço. Se no King’s College ensinam a “acertar à primeira”, pobre King’s College… É que o leque dos que “não acertam à primeira” enche toda a história das artes e do pensamento. A criação é, naturalmente, um processo de evolução onde o autor procura sempre o melhor traço, a melhor frase, o melhor som. O que fica para trás, preterido nessa escolha, é “vítima” da borracha, do pincel, do escopro, do ouvido. Não tem nada que ver com “culpabilização” nem com “coisas do diabo”, como sugere Claxton, mas sim com a mais normal das actividades humanas: o aperfeiçoamento. Se isso se aprende desde logo nas escolas, tanto melhor. Louvada seja, pois, a borracha. Apaguemos, antes, a sugestão de Claxton.