Dia: 14 de Setembro, 2015

Uma história (muito) mal contada [XIV]

cartoesTLFO estado do direito democrático – 1

Consciente da nova situação de países, como o nosso, de democracia mitigada pelos arranjos e conveniência dos representantes do poder político e outros poderes, procurei manter certos cuidados na investigação que, creio, são regras úteis de prudência e que recomendo:
1. Nunca revelar a identidade da fonte. Este é o primeiro cuidado, uma condição fundamental de honestidade. Essa protecção das fontes deve resistir até à tentativa de jornalistas e dos curiosos, e não quebrar perante a pressão judicial.
2. Despistar fontes de informação falsa, desinformações e manobras de intoxicação.
3. Usar processos de contacto encriptados, mais seguros do que as comunicações nacionais, mais ou menos controladas pelo Estado, mais fáceis de interceptar por ‘rogue agents’ ou servicinhos privados de agentes públicos. Não usar telemóvel nem telefone para conversas e fontes sensíveis e ter a prudência de considerar que as suas comunicações de telefone e telemóvel podem ser interceptadas. Não significa que sejam: podem ser.
4. Marcar os encontros pessoais com muito pouca antecedência para evitar preparativos de vigilância.
5. Em encontros e conversas importantes, desligar telemóvel e remover a sua bateria, inclusive na deslocação, e evitar a Via Verde nas auto-estradas.
6. Nos encontros, ser discreto, escolher locais isolados, e silenciosos, ou públicos, movimentados e barulhentos, de forma a tornar mais complicada a intercepção das conversas, evitando, além disso, pronunciar a informação mais perigosa, escrevendo-a codificada à frente da pessoa com quem se encontra e destruindo o registo em seguida.
7. Informar duas pessoas de absoluta confiança dos contactos que vai realizar, por uma questão de segurança face a acidentes e incidentes.
8. Escrever o mínimo, no computador ou em papel, guardando a informação na memória… do cérebro.
9. Escrever imediatamente as informações obtidas depois de as apurar, numa aplicação à edição do método FIFO (First In, First Out). A publicação imediata é o modo mais eficaz de segurança, pois a eliminação, ou comprometimento, do alvo não resolve a divulgação do que este sabe, já que, em cada momento, o alvo tende a não saber nada mais do que já publicou…
10. Finalmente, o último cuidado é não abrandar o rigor dos procedimentos de segurança.

António Balbino Caldeira*

Este pequeno excerto, retirado d’O Dossiê Sócrates, da autoria de António Balbino Caldeira*, poderia muito bem ser publicado em forma de folheto, numa simples folha A4, para servir como “Manual do Activista”. De qualquer activista, bem entendido, na presunção de que, em democracia, o activismo é, sempre e por definição, cívico; a expressão “activismo cívico” é uma evidente redundância porque, se não é cívico, então não é activismo: num Estado de Direito será, por exclusão de partes, ou subversão ou terrorismo.

Pronto, está bem, mas o que tem a investigação sobre o diploma de Sócrates a ver com a luta contra o AO90?

Tem tudo a ver.

Não apenas porque o “Manual do Activista” vale nos dois casos, serviu em 2007/8 para aquele efeito — no qual, modestamente, também participei — como serviu a partir de 2009 e continua a servir para a investigação sobre o “acordo ortográfico” e, é claro, na luta contra ele. Afinal, apesar de ter mudado entretanto a maioria parlamentar, logo, o Governo, todos os pressupostos e as consequentes regras de conduta e cuidados postulados neste “Manual” mantêm-se válidos.

Pelo contrário, o centro governamental de comando e controlo dos media vai apertando cada vez mais a malha. Pelo que, evidentemente, temos de redobrar as medidas de precaução.

É um processo extremamente perigoso. Não há um juiz, não há uma acusação, nem um processo em tribunal. O que significa que se o leitor tem um site ou um blog onde escreve regularmente e as SGC e a IGAC não gostarem da sua opinião, nada os impede de enviar o link do blog do leitor para os ISPs bloquearem no prazo máximo de 15 dias.

O blog/site é bloqueado e o autor nem sequer se pode defender.

Paula Simões

Memorando de Entendimento: Bloqueio de Sites em Portugal #PL118

Para quem nunca entendeu a estranha frequência com que o “site” da ILC-AO ficava (e continua a ficar) “indisponível”, bom, está aqui pelo menos uma parte da explicação: já não bastavam as denúncias electrónicas feitas por anónimos, havia que arranjar um pretexto e pronto, arranjou-se, o “erro 404” passou a ser opção legal.

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