“Speak your mind even if you are a minority of one. The truth is still the truth.” ~ Mohandas Gandhi
“Many people, especially ignorant people, want to punish you for speaking the truth, for being correct, for being you. Never apologize for being correct, or for being years ahead of your time. If you’re right and you know it, speak your mind. Speak your mind. Even if you are a minority of one, the truth is still the truth.”
A ideia do referendo “ao” AO90 é, evidentemente, antiga. Faz parte da história da ILC-AO.
Não surgiu, essa ideia, nem agora nem há pouco tempo, caída dos céus por inspiração divina, à boleia de um raio carregado de luz, sobre alguma iluminada cabeça que descobriu a pólvora, desceu-lhe de repente a “Pomba Gira”, deu-lhe uma epifania nas meninges.
Já nos primórdios, quando tudo “isto” começou, a hipótese de referendar o AO90 foi uma das primeiras possibilidades aventadas… e posta de lado. Mas de vez em quando lá se colocava de novo a questão.
“O que acha da ideia de Vasco Graça Moura de se referendar ao Acordo Ortográfico?”Acho o pior possível, porque é praticamente impossível realizá-lo, logo, é inútil: nunca antes um referendo em Portugal teve resultados vinculativos. Além disso, a pergunta de VGM está mal formulada porque restringe a escolha ao Ensino quando o AO90 afecta toda a sociedade portuguesa (e não só).
Para mais, VGM parte também de um pressuposto errado, ou seja, de que o AO90 é já um facto consumado, o que não é de todo verdade. Qualquer erro se pode (e deve) corrigir. Nada é irreversível nesta vida, salvo a morte, passe o lugar-comum.
Do mesmo modo não colhe «o argumento económico de que se torna incomportável voltar atrás». Continuar na senda do desastre, não atalhá-lo já, enquanto ainda é possível fazê-lo praticamente sem custos, isso sim, seria uma tragédia com custos incalculáveis… e não apenas económicos mas também patrimoniais, educacionais, culturais e históricos. Custos portanto que nem mesmo podem ser equacionados, já que o património nacional, a Educação, a Cultura e a História não têm preço.
Existe um mecanismo eficaz para resolver o problema: a ILC pela revogação da entrada em vigor do AO90. Não é preciso mais nada além disto para que milhões de pessoas reparem (e parem) o erro colossal cometido por pouco mais de 200 dos seus concidadãos.
“A pergunta d’O Diabo”, 13 de Março de 2012
[Recorte do semanário “O Diabo” de 13.03.12, última página.]
[A pergunta refere-se a este texto de VGM.]Nota: a pergunta foi-me colocada de forma pessoal (“o que acha”) e a minha resposta foi também, evidentemente, pessoal (“acho”); é uma simples opinião, neste caso a do primeiro subscritor da ILC; nada mais do que isso.
[transcrição de “post” publicado no “site” da ILC-AO em 15.03.12]
Questão esta que perdurou, em especial, durante os anos de 2009 a 2012; depois, praticamente desapareceu e por fim emergiu de novo das trevas já neste ano, em Junho de 2015, quando foi lançada uma “iniciativa de referendo ao acordo ortográfico”.
A Constituição da República Portuguesa prevê expressamente a figura do referendo.
Artigo 115.º
Referendo1. Os cidadãos eleitores recenseados no território nacional podem ser chamados a pronunciar-se directamente, a título vinculativo, através de referendo, por decisão do Presidente da República, mediante proposta da Assembleia da República ou do Governo, em matérias das respectivas competências, nos casos e nos termos previstos na Constituição e na lei.
2. O referendo pode ainda resultar da iniciativa de cidadãos dirigida à Assembleia da República, que será apresentada e apreciada nos termos e nos prazos fixados por lei.
3. O referendo só pode ter por objecto questões de relevante interesse nacional que devam ser decididas pela Assembleia da República ou pelo Governo através da aprovação de convenção internacional ou de acto legislativo.
4. São excluídas do âmbito do referendo:
a) As alterações à Constituição;
b) As questões e os actos de conteúdo orçamental, tributário ou financeiro;
c) As matérias previstas no artigo 161.º da Constituição, sem prejuízo do disposto no número seguinte;
d) As matérias previstas no artigo 164.º da Constituição, com excepção do disposto na alínea i).5. O disposto no número anterior não prejudica a submissão a referendo das questões de relevante interesse nacional que devam ser objecto de convenção internacional, nos termos da alínea i) do artigo 161.º da Constituição, excepto quando relativas à paz e à rectificação de fronteiras.
6. Cada referendo recairá sobre uma só matéria, devendo as questões ser formuladas com objectividade, clareza e precisão e para respostas de sim ou não, num número máximo de perguntas a fixar por lei, a qual determinará igualmente as demais condições de formulação e efectivação de referendos.
(…)
E se a Constituição o prevê, há evidentemente uma lei orgânica do regime do referendo, que regulamenta uma das formas de “iniciativa de proposta”; neste caso, a que nos interessa é a de Iniciativa Popular (Art. 16.º):
«O referendo pode resultar de iniciativa dirigida à Assembleia da República por cidadãos eleitores portugueses, em número não inferior a 75 000, regularmente recenseados no território nacional, bem como nos casos previstos no artigo 37º, nº 2, por cidadãos aí referidos.»
Pronto, se calhar já chega de leis, estamos minimamente “equipados” para raciocinar logicamente sobre o tema.
E nem vale a pena, atalhemos caminho, referir sequer a primeira fase de um processo de convocação do referendo por “iniciativa popular”, com esse “pequeno” requisito das 75.000 assinaturas válidas. Atenhamo-nos apenas à questão da realização do referendo, na hipótese académica de ele se efectivar.
Além dos pressupostos básicos mais evidentes, qualquer deles suficiente para excluir a figura referendária, existem ainda outros contras.
A começar pelo facto de nunca ter havido em Portugal uma consulta popular com resultados vinculativos (acima de 50% de votos expressos). Porém, mesmo não sendo vinculativos, nos casos dos poucos referendos nacionais já realizados, esses mesmos resultados têm servido para:
a) tomar resoluções políticas de implementação efectiva das propostas “vencedoras”, mesmo com baixíssimas afluências, isto é, ainda que os resultados não legitimem qualquer resolução atinente;
b) liquidar na prática o mais remoto direito de retorno da parte “derrotada” em determinada decisão (idem, aspas);
c) Convocação sucessiva dos referendos cujos resultados, mesmo sendo residuais, ainda assim não agradem ao establishment como “sinal político”.
Na prática, sendo o “acordo ortográfico” uma questão que interessa a uma ínfima minoria da população, nunca teríamos — numa estimativa tão optimista quanto absurda — mais do que 10% ou, no máximo, 20% de votantes num referendo sobre o AO90; portanto, 80 ou 90% dos eleitores não se aproximariam sequer de uma assembleia de voto no dia marcado.
Ainda “jogando” com essa mesma brutal, absurda afluência de 10% a 20%, mesmo multiplicando por 10 os números mais realistas, uma de duas outras coisas se poderia passar: se ganhasse o “não” ao acordo, o dito establishment diria que os números não eram vinculativos (e não eram mesmo, eram ridículos) e que, portanto, continuaria tudo como dantes, acordo ortográfico em vigor; caso o AO90 fosse “aprovado” nesse referendo — por “milagre”, por acaso, mas nunca se sabe o que fariam as máquinas partidárias–, então pronto, aí é que era mesmo de vez, o AO90 ficaria em vigor para sempre e sem qualquer chance de retrocesso. E haveria ainda uma terceira hipótese, como já referi: se o “não” ganhasse, não sendo os resultados vinculativos mas não agradando o resultado, poderia uma qualquer coligação de interesses cozinhar um novo referendo…
Com riscos de 80%, evidentemente, seria suicida sujeitar a Língua Portuguesa a plebiscito. Aliás, até por questões morais e patrióticas temos o dever de recusar esse presente envenenado: o património nacional não se vota, é o que é e o que sempre foi; nenhuma maioria — relativa ou mesmo absoluta — pode impor a uma minoria aquilo que diz respeito a uma e a outra e que sequer pertence em exclusivo a qualquer delas.
Embora em teoria referendar o AO90 até possa aparentar ser uma óptima ideia, na prática um referendo jamais poderia vir a conseguir o efeito pretendido em última instância, ainda para mais numa questão em que o conformismo tem vindo a ganhar terreno rapidamente, qual cancro em metástases, como se vivêssemos todos um pesadelo colectivo em simultâneo.
A questão ficaria “encerrada”, sim, e de uma vez por todas, mas da pior maneira: num referendo, as questões tendem a ser polarizadas pelos partidos políticos e por conseguinte esses partidos, que foram os responsáveis pela aprovação do “acordo”, não iriam certamente desligar as suas máquinas: a partidária, de mobilização, e a propagandística, de intoxicação.
Ou isso ou a abominável humilhação de 2% ou 3% de votantes no referendo…
E não é tudo.
Ainda que déssemos de barato, como se isso fosse uma opção, o inultrapassável obstáculo que é a (nossa) consciência, sucede que os Tratados internacionais não podem ser referendados a posteriori. Ora, como toda a gente sabe, ou pelo menos como toda a gente que “anda nisto” deveria saber, o AO90 é um Tratado assinado por representantes legítimos dos governos de oito países democráticos.
O que está em causa, precisamente, não é a legitimidade da assinatura daquele Tratado pelos representantes (eleitos) de Portugal — para reverter essa situação teríamos de eleger outros representantes que o denunciassem unilateralmente –, é o facto de o dito Tratado ter passado a vigorar na ordem jurídica interna através de um expediente político, esse sim, totalmente ilegítimo: a RAR 35/2008. Precisamente o objecto (e o objectivo) da ILC-AO: revogar a entrada em vigor do AO90 que a referida Resolução parlamentar viabilizou.
Cabe-nos a nós, cidadãos, lutar até à exaustão para que se mantenha a questão da língua tal como ela é: pertença de todos, património nacional, herança inalienável.
Admitir sequer a hipótese de referendar a Língua Portuguesa significa a desistência liminar de todos os princípios que sempre nortearam a nossa acção na defesa do património que herdámos dos antepassados e que temos o dever de legar, intacto, aos vindouros. Significa a admissão tácita de que afinal o “sim” ao absurdo pode ganhar à razão, que o “sim” ao assassinato do Português poderá ser afinal legítimo — e que, por conseguinte, todos nós estivemos profundamente, tragicamente, estupidamente equivocados desde sempre.
Bem, há pelo menos uma pessoa neste país que jamais admitirá que lutou, luta e continuará a lutar por coisa nenhuma. Não! Não admito isso. Nem morto.
Mas pronto, nada de mais, isto sou só eu a falar. Ninguém lê este “blog”. Andem lá com isso do referendo para a frente. Deus queira que eu esteja enganado. Estou enganado com certeza.
Imagem de topo: © AP / Daily Mail
Citação copiada de GoodReads