Propriedade da língua
publicado por Maria do Rosário Pedreira
post no “blog” Horas Extraordinárias
Disse-vos recentemente que fui convidada para falar num congresso dedicado às artes da língua portuguesa pela Fundação Calouste Gulbenkian em Paris. A iniciativa teve um saldo muito positivo, pois pude ouvir intervenções extremamente interessantes por oradores de luxo em áreas como o teatro, o cinema ou a dança, em que sei menos e, por isso, aprendo mais (mas as da literatura também foram muito boas). Soube igualmente uma coisa curiosa nesse congresso, de que, de resto, já me podia ter dado conta: que muitas vezes, ao publicarem a obra de um autor brasileiro, os editores franceses escrevem «traduit du brésilien», e não «du portugais», como se de facto falássemos línguas diferentes cá e lá ou houvesse, pelo menos, donos diferentes da mesma língua. A este propósito contou Flora Gomes, o cineasta guineense, uma história deliciosa. Os guineenses declaram que o crioulo foi inventado na Guiné, e os cabo-verdianos afirmam que são eles os donos da língua. Ora, para evitar estes puxões para cada lado, alguém resolveu contrapor: nem num lado, nem noutro, mas numa piroga no meio do mar.
Maria do Rosário Pedreira, 23.11.15. Propriedade da língua – Horas Extraordinárias
Isto não é propriamente uma novidade, bem entendido, mas não deixa de ser interessante a recorrência do assunto, apesar de os acordistas persistirem na patranha da “unificação da língua”.
Conteúdo apontado por Octávio dos Santos.