Dia: 18 de Março, 2016

E a Montanha Pariu um Rato [por Isabel Coutinho Monteiro]

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Todos estamos fartos e enjoados de ouvir falar na “unificação da Língua Portuguesa”, embora ninguém saiba exactamente do que se trata. Basta uma vista de olhos por alguns textos sobre a matéria para pôr a nu que, afinal, não passa de um pretexto fraco e inconsequente para justificar a imposição de uma ortografia unificada aos países onde se fala o Português nas suas diversas versões, naturalmente marcadas pelas diferenças geográficas e culturais entre esses países.

É perfeitamente natural e legítimo que cada país molde a língua que fala aos seus costumes, à sua pronúncia, à sua cultura. Até aí, estaremos certamente todos de acordo. O que parece absurdo é começar-se a tal “unificação da Língua Portuguesa” pela unificação da grafia, atropelando precisamente a cultura e a Fonética de cada país de Língua Portuguesa. Pondo de lado a Ortografia, por agora, concentremo-nos na Área Vocabular, como é moda chamar-lhe. Apesar do “machimbombo” usado em Moçambique para referir o que se chama “autocarro” em Portugal, Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e “ônibus” no Brasil, a maior diferença lexical verifica-se entre Portugal e Brasil. Atentemos então na lista que se segue:

Portugal Brasil
cancro câncer
casa-de-banho banheiro
chuveiro/duche ducha
gestão de negócios manejamento de negócios
laqueação de trompas laqueadura tubária
lavagem automática lava jato
lava-louça pia
lixívia água sanitária
sanita vaso sanitário
sumo de fruta suco de fruta

A lista acima apresenta apenas alguns dos inúmeros exemplos das diferenças de vocabulário entre os dois países. Mas as diferenças não se limitam ao Léxico – a Sintaxe e a Morfologia também marcam diferenças notórias nas duas versões – lusitana e brasileira.

Enquanto entre nós, em Portugal, dizemos O meu filho foi à escola”, no Brasil diz-se Meu filho foi na escola”. Para nós, o verbo de movimento “ir” é regido pelas preposições “a” ou “para”, mas no Brasil essa regência é feita pela preposição “em” ou “para”. No que toca aos Pronomes/Adjectivos Possessivos, é “o meu, a minha, etc.”, em Portugal, mas no Brasil o artigo definido foi eliminado. Por cá, também temos o hábito de usar advérbios para modificar/qualificar os verbos e outros adjectivos, deixando aos adjectivos a função de qualificarem substantivos, mas enquanto nós dizemos “Façam isso depressa!”, no Brasil diz-se “Façam isso rápido!”.

E qual é o problema? – perguntará alguém. Quanto a mim, nenhum, já que sou defensora de que cada país fale como melhor entender. O que me intriga é esta insistência em unificar a Ortografia, deixando à solta o Léxico, a Fonética, a Morfologia e a Sintaxe, como sendo de importância secundária no desenvolvimento de uma língua, qualquer que ela seja.

— Mas seria uma tarefa hercúlea, ocuparmo-nos dessas áreas!

— Pois… E a montanha pariu um rato!

Isabel Coutinho Monteiro

Lisboa, 18 de Março de 2016

[Imagem de topo: Filipe moedas]

CPLP a mielas

Aparentemente, esta extraordinária “sitcom” terá terminado ontem mesmo com uma não menos extraordinária decisão salomónica: como sucedeu nesse bíblico episódio, havendo apenas uma “criança” e dois pretendentes à respectiva paternidade, decidiu-se cortar o bebé a meio e entregar a cada um dos papás babados sua metade do petiz. Ao contrário do que se passou na tocante história original, porém, desta vez não se comoveu nenhum dos dois contemplados com 50% da coisa decepada e, por conseguinte, aceitaram ambos o massacre sem pestanejar.

O que significará, com certeza, pois com parábolas das Escrituras não se brinca, que teremos em breve de presenciar — com não menos horror — outras cenas igualmente sangrentas e canalhas. 

 

logo_sharePortugal divide com São Tomé mandato de quatro anos na CPLP

Nuno Ribeiro

17/03/2016 – 19:58

Angola, que acusou Portugal de querer impor um secretário-executivo, convidou Marcelo e Costa a visitar Luanda e considera que candidatura de Guterres à ONU “honra a comunidade lusófona”

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Não foi uma operação aritmética, mas uma solução diplomática para sair de um impasse. O próximo secretário-executivo da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), a ser eleito na cimeira de Chefes de Estado de Brasília, em Julho próximo, terá o seu exercício encurtado de quatro para dois anos. Os primeiros dois serão confiados a São Tomé e Príncipe e o resto do mandato será cumprido por Portugal.

“As decisões na CPLP são tomadas por consenso, essa é uma regra de ouro”, disse o ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, Augusto Santos Silva, referindo-se à fórmula adoptada. “As cedências são de todos”, afirmou o chefe da diplomacia angolana, Georges Chikoti, no final dos trabalhos da XIV reunião extraordinária do conselho de ministros da CPLP.

Santos Silva e Chikoti apareceram lado a lado, na Sala Dourada do Palácio do Conde de Penafiel – a sede da organização – para simbolizar em palavras e gestos o fim da polémica sobre o método para a sucessão do moçambicano Murade Murargy como secretário-executivo. Assim, mantém-se o princípio da rotatividade, com a peculiaridade da divisão temporal.

Aliás, durante esse tempo a CPLP volta a trabalhar nos estatutos para clarificar o imbróglio: o alegado “acordo de cavalheiros” ou “princípio não escrito” de que o país que alberga a sede da comunidade não apresenta candidato à liderança do secretariado-executivo. O facto da solução encontrada esta quinta-feira, depois de uma intensa negociação na véspera, arrancar com São Tomé e Príncipe e não com Portugal, como dita a rotatividade por ordem alfabética, teve também uma explicação diplomática. A próxima presidência da organização é do Brasil e, se Portugal ostentasse por dois anos o cargo de secretário-executivo, o eixo da CPLP deslocava-se de África, apurou o PÚBLICO. Embora, a solução não fosse do agrado do ministro de São Tomé e da sua delegação.
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