Dia: 23 de Março, 2016

Longe vá o agoiro!

«Um golpe dos ‘patrões’ da Língua» [Cândido Lince, “Jornal de Angola”]

 

Portanto, se Angola ratificar mesmo aquela coisa, longe vá o agoiro, cai pela base — infelizmente, mas de imediato — uma das condições sine qua non que alguns apontam como impedimento decisivo para a entrada em vigor do AO90.

Pois, se tal desgraça acontecer, Deus não permita, ainda que seja eu, como dizia Gandhi, “uma minoria de um”, mantenho – e agora por maioria de razões – que “a verdade continua a ser a verdade” e, portanto, jamais acatarei esse (ou qualquer outro) ditame estrangeiro.

Ainda no âmbito da sua nomeação pelo Governo para o Centro Cultural de Belém, o novo Director refere ele mesmo esta objecção:
«Antigo eurodeputado do PSD argumenta que “o Acordo Ortográfico não está nem pode estar em vigor” porque Angola e Moçambique ainda não ratificaram o documento» [“Expresso”, 03.02.12]

Ora, segundo esta outra linha de raciocínio quanto a factores decisivos (de impedimento), então bastaria os (2) países que (ainda?) não ratificaram o fizessem, por fim, para que tudo estivesse nos conformes?

Portanto, considera-se assim aceitável que o nosso (ou qualquer outro) país fique literalmente refém de uma decisão tomada por um ou por mais do que um Governo estrangeiro? A entrada em vigor do “acordo ortográfico” em Portugal decide-se em Luanda ou no Maputo? Uma lei passa a vigorar em Portugal quando os moçambicanos e os angolanos resolverem decidir isso?

Uma história (muito) mal contada [XVIII]

DE_logoAngola avalia novo Acordo Ortográfico antes de decidir se ratifica

12:03 Económico com Lusa

O ministro da Educação angolano explicou que, nos “próximos dias”, deverão estar concluídos os relatórios sobre os inquéritos à percepção da utilização do novo Acordo Ortográfico da língua portuguesa, que vão contribuir para a decisão de ratificação por Angola.

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O governante, que tutela este processo, falava terça-feira, em Luanda, no final da reunião de balanço da comissão multi-sectorial para a ratificação do Acordo Ortográfico, encontro durante o qual garantiu que a análise angolana está a “evoluir bem”, mas sem se comprometer com a adesão de Angola ou prazos para a decisão a tomar pelo executivo.

“Uma boa evolução do trabalho, que deve continuar a ser desenvolvido. Ainda nos próximos dias devemos concluir relatórios sobre o inquérito que foi feito sobre a percepção e a utilização do Acordo Ortográfico no seio da população, dos estudantes e dos professores”, disse Pinda Simão, em declarações aos jornalistas.

O Governo angolano ainda não decidiu sobre a ratificação final do novo Acordo Ortográfico da língua portuguesa.

Em Portugal, a moratória sobre a aplicação do novo acordo (de 1990) terminou a 13 de Maio de 2015, data a partir da qual a sua utilização passou a ser obrigatória.

A coordenadora nacional do Instituto Internacional de Língua Portuguesa (IILP), Ana Paula Henriques, explicou anteriormente que Angola pretende a “correcção de bases identificadas como carentes de informação suficiente técnica e científica”, de forma a fazer uma “gestão da língua sem constrangimentos”.

Estas conclusões resultaram de um encontro de esclarecimento realizado há precisamente um ano, em Luanda, pelo IILP, durante o qual foi divulgado que o Governo angolano pretende que todos os países de língua portuguesa tenham a possibilidade de manter um vocabulário ortográfico nacional.

O português é a língua oficial em Angola, mas o país conta com seis principais línguas nacionais, muitas das quais acabaram por incorporar alguns conceitos e palavras, face à longa presença colonial portuguesa.

O Acordo Ortográfico foi ratificado pela maioria dos países lusófonos, à excepção de Angola e Moçambique.

[“Diário Económico”, 23.03.16. Inseri “links” e corrigi a ortografia da “agência Lusa”.]

A grelha

Evidentemente, o assunto é sério, não tem piada alguma, mas ainda assim não deixa de ser (extremamente) engraçado “ver” deputados de ambas as metades do chamado “centrão” político-partidário a puxar a brasa à sua sardinha, tentando fazer com que a sardinha do parceiro do lado fique um pouco mais encruada.sardinha-9Temos já apreciado similares manobras de churrasco sendo executadas por membros de ambos os clubes, uns do PSD garantindo que foram os da sua banda (Cavaco e Santana, por exemplo) quem mais suou ao braseiro da CPLP, outros do PS jurando que os seus é que foram uns heróis, ui, fartaram-se não apenas de assar sardinhas “lusófonas” como também de virar frangos “lusófonos”. Todos eles cozinheiros e comensais, em todo o caso e em simultâneo, com iguais responsabilidades na manutenção do grelhador e no aviamento dos grelhados, tanto de carnes como de peixes, naquilo que em substância é a chamada “lusofonia” (vulgo, CPLP).

Desta vez, portanto, segundo o democrático princípio da “rotatividade” (coisa que igualmente se aplica aos grelhados em geral, isto é, há que ir virando-zi-os), temos agora um deputado do PS citando Guterres, Costa e Sócrates, por um lado, e, por outro, alvitrando que deveria quiçá a dita CPLP (vulgo, “lusofonia”) ir mais longe, isto é, variar as ementas, que isto ele de sardinha e frango até já chateia, porque não incluir no menu umas postas de peixe-espada, hem, o belo lombinho de porco, umas salsichas frescas, talvez mesmo, não abusando, uns bifezinhos de picanha, hum, que dizem vossemecês?

logo_sharePor uma CPLP que vá mais longe

Paulo Pisco

22/03/2016 – 06:50

Criar uma cidadania lusófona que facilite a livre circulação e fixação de residência, o reconhecimento de direitos e a sua portabilidade e o reforço da cooperação em várias dimensões, são medidas que darão um importante contributo para o aprofundamento e a coesão da CPLP.

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No ano em que a CPLP celebra o seu vigésimo aniversário, está também em curso a construção de uma nova visão estratégica para esta organização tão original e com tanto potencial ainda por aproveitar, que tem os seus Estados-membros espalhados por quatro continentes. Este é, portanto, um momento crucial na vida da CPLP, no sentido de criar uma comunidade mais forte, coesa e com maior capacidade de afirmação a nível global.

Independentemente do maior ou menor empenho de cada Estado-membro no desenvolvimento, dinamização e aprofundamento da CPLP, a verdade é que a organização criou uma identidade própria e aspira a alargar o âmbito das suas actividades, reforçando o peso da sua dimensão política e económica. Para isso, seria da maior relevância que cada um dos seus membros colocasse a CPLP como uma das prioridades da sua política externa, a exemplo daquilo que agora acontece com Portugal.

A afirmação a nível regional de cada um dos Estados-membros não é incompatível com o empenho em reforçar e aprofundar o papel da CPLP como organização global, com capacidade para influenciar decisões, acontecimentos e orientações nas organizações internacionais. Pelo contrário, estas duas dimensões complementam-se e reforçam-se mutuamente nas várias vertentes da sua acção e potenciam a sua influência e capacidade de projecção para além do seu espaço natural de inserção regional.

E é nesta quadrangulação continental que se joga um dos grandes potenciais da CPLP, que poderá ir muito mais longe se houver vontade política e menos resistências, para que possa desenvolver-se um relacionamento mais harmonioso, aberto e profícuo entre todos. Uma Língua comum falada em todos os continentes e as culturas e identidades diversas são um substrato fortíssimo com capacidade para garantir uma cooperação frutuosa com vantagens para todos, desde que haja capacidade para ultrapassar algumas das dificuldades herdadas da história ou relacionadas com a importância económica relativa de cada um. A força da solidariedade e a disponibilidade para o diálogo permanente, são factores muito relevantes para o aprofundamento da CPLP e para o reforço e projecção da organização.

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