Dia: 1 de Maio, 2016

Tristes tretas

CM010516

Vejamos a manha do correio:

  1. Título bombástico… mas pouco: Marcelo “põe em causa“? A sério? Não, claro que não é a sério, isto é só o isco para pescar anjinhos.
  2. Sub-título torce a “causa” de Marcelo: afinal, ele apenas diz que “todos os países devem ratificar o acordo“. Ah, “portanto”, quando isso acontecer então já não há problema…
  3. Logo à cabeça, a vermelho e em destaque, a “Pergunta CM” indica ao leitor uma única consequência do título, do sub-título e da “causa” de Marcelo: “Acordo Ortográfico deve ser revisto?” Esta “pergunta” visa excluir qualquer outra hipótese e, em simultâneo, implicar o leitor, levando-o a sentir-se co-responsável pela inexistência de alternativas e a aceitar a “revisão” como uma inevitabilidade.
  4. “Esclarecido” o leitor de que a questão se resume a “rever” o AO90 ou deixá-lo tal como está (e que a culpa disso é do próprio leitor) , o desenvolvimento da “notícia” começa por atirar engodo em volta do isco: o Presidente não apenas “põe em causa” como até “poderá relançar o debate“. A sério? Não, claro que não é a sério.
  5. Empastelado o título, empastela-se também o sub-título: “só poderá ter continuidade se, de facto, for ratificado por todos os países envolvidos“. Pressão para cima de Angola e de Moçambique, evidentemente; à 6.ª linha da “notícia” já não existem quaisquer vestígios de que Marcelo “põe em causa” ou que “poderá relançar o debate” sobre o AO90.
  6. Se por esta altura o leitor já estiver um pouco baralhado, como convém à desinformação, então acrescenta-se de imediato um “esclarecimento” (mais engodo) para que ele não se afaste: “Caso contrário, a questão tem de ser repensada“.
  7. “Repensada”? Ah, mas isso é bom, não é? “Repensar” é um verbo que dá para tudo! Pois sim. Isso querias tu, leitor do correio da manha! A “tradução” desse verbo está logo a seguir, umas cinco linhas abaixo: “repensar” é, afinal de contas… rever o “acordo”. E para que não restem dúvidas nos espíritos quiçá mais renitentes, lá vem a explicaçãozinha da ordem: “afetará a atividade editorial“.

“Afetará” e “atividade”, note-se, duas palavras consecutivas em acordês “fluente”. Até neste pormenor a “notícia” é capciosa: o desprevenido leitor ainda vai a meio do texto mas já levou uma grande volta, passou da surpresa para a expectativa, da expectativa para a desilusão e, por fim,  da desilusão para aquela amarga sensação, tão nossa, tão portuguesa e tão infeliz, de que “isto é fatal como o destino”.

Não, não é. Tudo isto não existe, tudo isto é triste, tudo isto é treta.

A sério.

Marcelo põe em causa Acordo Ortográfico

Presidente diz que todos os países devem ratificar o acordo.

Por Ana Maria Ribeiro

Pergunta CM
Acordo Ortográfico deve ser revisto?

O Presidente da República (PR), Marcelo Rebelo de Sousa, poderá relançar o debate em torno do Acordo Ortográfico de 1990, que entrou em vigor no nosso país em 2009 mas que ainda não se aplica em Angola nem em Moçambique.

Segundo Pedro Mexia, consultor cultural de Marcelo, têm chegado a Belém “pedidos de cidadãos e instituições manifestando-se contra o acordo” e “o PR entende que este só poderá ter continuidade se, de facto, for ratificado por todos os países envolvidos. Caso contrário, a questão tem de ser repensada“.

Em 1991, Rebelo de Sousa foi uma das personalidades que subscreveu o manifesto contra o Acordo Ortográfico, embora posteriormente se tenha declarado a favor do documento. Já depois da sua eleição para Belém escreveu um artigo no ‘Expresso’ em que usou a antiga grafia, suscitando burburinho.

Caso venha a verificar-se, uma revisão do acordo afetará a atividade editorial, mas Pedro Sobral, diretor da Leya Edições Gerais, desvaloriza a questão. “A alteração do acordo teria impacto se, na altura da sua aplicação, a Leya tivesse ‘ordenado’ aos autores para o seguirem. Não é o caso”, garante.

Da Parsifal, Marcelo Teixeira encolhe os ombros. “Fomos das poucas editoras que nunca aplicou o acordo, a não ser a pedido dos autores”, explica. A Porto Editora não comentou. “Não conheço as palavras do PR”, diz Paulo Gonçalves.

Uma alteração ao Acordo teria o seu maior impacto no mercado dos manuais escolares.

Ler mais em:

http://www.cmjornal.xl.pt/cultura/detalhe/marcelo_poe_em_causa_acordo_ortografico.html