Dia: 19 de Maio, 2016

Galiza: ontem e hoje de um genocídio linguístico – VI [por Bento S. Tápia]

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Objectivos do poder

Até agora temos visto, ainda que dentro das naturais limitações deste trabalho, como os sucessivos governos autonómicos galegos têm praticado uma política que visa a perpetuação da situação de menoscabo histórico do nosso Idioma na Galiza. Hoje, não só se continua esta política com a maior das agressividades como se quer legitimar o castrapo galego-castelhano em todos os meios e níveis: sucessão ininterrupta de prémios literários a castrapeiros, prémio de tradução literária da Bíblia em castrapo, admissão do galego-castelhano como idioma de trabalho nas instituições europeias, etc.

Parte muito importante dos projectos dos governantes autonómicos galegos tem sido o labor de infiltração e “castrapeirização” de Portugal, especialmente intensa desde o acesso à presidência da Galiza de Manuel Fraga Iribarne (1989), outrora censor e perseguidor das línguas autóctones dos povos galego, basco e catalão. Os cada vez mais frequentes contactos e visitas a Portugal daquilo que podemos chamar o seu “circo castrapeiro” de teóricos escritores e intelectuais galegos inseriram-se no nunca esquecido projecto espanhol de castelhanizar o país irmão da Galiza; e não só castelhanizar, mas também partir e dividir, aliciando estranhos e suspeitos projectos como o de colaboração “Galicia-Región norte de Portugal”; tal projecto económico, irmão de outros que vão dividindo Portugal em regiões económicas, fazem-nos lembrar outras divisões de Portugal projectadas desde a Espanha, como as contempladas no tristemente célebre Tratado de Fontainebleau de 1807.

Castelhanizar Portugal é elemento indispensável para que a nossa entranhável Terra que se estende do Cantábrico até ao Algarve acabe desaparecendo como conjunto com identidade própria da face do planeta; também serve para que o Portugal oficial cale e outorgue perante o que está a passar na Galiza, na Terra-Mãe, sem preocupar-se responsavelmente pela sorte da sua Língua e Cultura ali onde elas nasceram. A invasão dos meios de comunicação social em espanhol em Portugal (sem contrapartida na Galiza e muito menos na Espanha com os meios de comunicação social portugueses), é também parte deste projecto. Lembremos aquele que foi episódio especialmente grotesco: a assinatura de um convénio para leccionar na Universidade Nova de Lisboa o castrapo ou galego-castelhano imposto à força na Galiza. Assim, os portugueses já podem conhecer como escrever o seu idioma com o sistema ortográfico e morfológico do espanhol, labor abençoado pelas instituições oficiais portuguesas que nem sequer exigem a contrapartida natural nestes casos, como seria a igualdade de condições na Galiza para com aqueles que querem utilizar o código ortográfico português.

Muito dolorosos foram para os galegos que defendem a sua identidade como Nação, a sua Língua e a sua Cultura, os reconhecimentos do Portugal oficial ao presidente Fraga Iribarne, reconhecimentos que vão desde Câmaras Municipais como a de Chaves até o outorgamento da máxima condecoração portuguesa, a Ordem de Cristo. Pouco antes de ganhar as suas primeiras eleições em 1989, em entrevista concedida ao jornal santiaguês EL CORREO GALLEGO, qualificava o senhor Fraga de “asquerosos” os defensores do reintegracionismo linguístico e dizia que a nossa Língua era apta só para falar com os amigos jogando ao dominó, do qual o senhor Fraga é consumado especialista, e não era adequada para falar de temas cultos e elevados; ideologia esta com a que foi coerente desde a sua chegada ao poder na Galiza até ao ano de 2005; nesses 16 anos, a política cultural do governo galego tem convertido em noites escuras e sinistras os dias do nosso Idioma na Galiza. Lembremos também como o mesmo senhor Fraga motejou burlescamente de “portuguesa” a uma deputada nacionalista galega no Parlamento autonómico; naturalmente, em Portugal o discurso do senhor Fraga Iribarne é completamente diferente, em harmonia com o que foi sempre a sua atitude camaleónica e que tem permitido sobreviver a tantos avatares políticos a quem no seu dia foi ministro da ditadura franquista assinando, como tal, diversas penas de morte. Em Portugal falou de “vizinhos que temos basicamente a mesma língua”, sem mencionar que a norte do Minho a instituição que ele presidia era responsável pelo constante retrocesso dessa Língua que procurava marginalizar. Portanto, atenção a essas demonstrações de camaradagem e colaboração com Portugal, verdadeiros beijos de Judas para vender Galiza e Portugal ao poder espanhol. Também não foi fácil desde 1989 a existência na Galiza das organizações e associações reintegracionistas, já que o poder oficial buscou asfixiá-las economicamente e silenciar todas as opiniões dos seus membros.

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«O AO90 afasta-nos do português do Brasil» [Maria Helena Carreira, “O Mirante”]

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logoOMMaria Helena Carreira diz que Acordo Ortográfico nos afasta do português do Brasil

Professora catedrática especialista em linguística portuguesa, Maria Helena Carreira vive e trabalha há 40 anos em Paris mas sem perder a ligação a Vila Franca de Xira. Considera que os pressupostos do Acordo Ortográfico eram interessantes mas não foram atingidos.

Edição de 18.02.2015

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Maria Helena Araújo Carreira, professora catedrática, especialista em linguística portuguesa, na Universidade de Paris 8, concorda que se tenha tentado fazer uma harmonização da língua portuguesa em termos de ortografia mas diz que o Acordo Ortográfico é um fracasso e que vai provocar efeitos negativos que não foram devidamente equacionados. Apesar de residir na capital de França, Maria Helena Carreira nunca se desligou por completo de Vila Franca de Xira para onde foi viver aos 9 anos de idade. A mudança da Avenida Duque de Ávila, em Lisboa, para o Bom Retiro foi determinada pela colocação do pai, Abel Carreira, professor de português.

Foi com o progenitor que Maria Helena Carreira ganhou o gosto pela língua portuguesa. Foi com ele que se habituou a ser rigorosa. Com o Dia Internacional da Língua Materna a celebrar-se dia 21 de Fevereiro, O MIRANTE falou com ela e o polémico Acordo Ortográfico foi tema obrigatório. “Esta mudança ortográfica faz com que se percam marcas da história da língua, o que é uma pena. Além disso o acordo afasta-nos do português do Brasil em vez de nos aproximar”, defende.

Juventude passada em Vila Franca de Xira

Foi no ano lectivo de 1973/74 que Maria Helena Carreira foi dar aulas para Paris depois de ter estudado na Faculdade de Letras de Lisboa, onde tirou o curso de Filologia Românica, especializado no estudo das línguas portuguesa e francesa. “Quando terminei o curso voltei a Vila Franca de Xira e aí permaneci durante três anos a dar aulas, tanto no colégio do meu pai como no ciclo preparatório, que se situava no edifício dos actuais bombeiros voluntários”, conta. “Depois fui para Paris”.

Diz que nunca perdeu o contacto com Portugal e com Vila Franca de Xira. Recentemente visitou o Museu do Neo-Realismo que diz ser bastante atractivo e organizado, com fácil acesso aos escritos dos escritores e ao movimento a que pertenceram. Sobre a literatura neo-realista diz ter pouca visibilidade, nomeadamente no estrangeiro. Está muito ligada a um contexto social, histórico e geográfico muito específicos, o que a torna mais difícil de transmitir e traduzir”.

Muitos dos seus alunos são brasileiros, cabo-verdianos, são-tomenses e franceses com ascendência portuguesa mas também tem alunos de outras nacionalidades que escolhem o português como uma disciplina de opção.

Lecciona português, literatura portuguesa e linguística portuguesa e, como não tem alunos de iniciação, fala exclusivamente na sua língua materna durante as aulas. “Apenas utilizo o francês para comparações ou como reflexão, tudo o resto é falado unicamente em português”, refere. Segundo ela, a pronúncia portuguesa é o maior entrave que os seus alunos enfrentam, principalmente na articulação das sílabas átonas.

Gosta de ler os bons escritores, sejam eles clássicos ou contemporâneos, portugueses ou estrangeiros, embora os africanos estejam entre os seus eleitos. É o caso de Mia Couto, José Eduardo Agualusa ou Luandino Vieira.

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