Esta gravação tem a particularidade de condensar, em apenas 85 segundos, toda a (muito recente) rábula que teve Marcelo Rebelo de Sousa como protagonista e o “acordo ortográfico” como (pre)texto.
A começar pela introdução da “peça”, o “lead” noticioso — apinhado de tretas, pois claro: «Em visita a Maputo, Marcelo Rebelo de Sousa reavivou a polémica do acordo ortográfico. Marcelo cidadão assumiu que escrevia com as regras da antiga grafia, Marcelo presidente tem de respeitar as novas. Angola e Moçambique ainda não sabem o que escolher.»
E entra o dito “Marcelo presidente” em discurso directo, porém cheio de indirectas, ou seja, afinal não era bem aquilo, era mais o seu contrário e por suposto o oposto do inverso: «Não podemos antecipar neste momento qual possa ser essa decisão, ou, quem diz a de Moçambique diz a angolana, quanto a uma matéria que permitirá ou não ser reequacionada no quadro português.»
A sério: esta rábula deu por aí um sururu dos diabos, foi por causa disto um vê-se-te-avias, gente a amarinhar até pelas paredes, ah, ena, finalmente, é agora que o AO90 vai de vela, pronto, iupi, viva o Marcelo.
Pois bem, como já se viu, apenas uns dias passados acabou-se a brincadeira, murcharam os aplausos, calaram-se os vivas, apagaram-se as luzes de cena.
A “performance” do Marcelo presidente versus Marcelo cidadão fez-me recordar uma outra rábula, mas esta real e protagonizada por uma verdadeira artista, a inesquecível Ivone Silva, no duplo (e fabuloso) papel de Olívia patroa e Olívia costureira. Ao menos destas “duas” sabe a gente com o que pode contar, não há cá fintas nem truques nem ilusões, é tudo genuíno e são e transparente.
[Gravação “Acordo Ortográfico” TVI Jornal das 8 19-05-16, disponibilizada no YouTube em 23.05.16 por Inês Pereira.]