Panlermismo

cc_0Este artigo vale pelo neologismo. De facto, convenhamos, “panlermismo” é um achado! Brilhante, caramba!

É pena que o M.I.L. seja uma organização acordista (se bem que “tolerante”, ao que consta, obrigadinho pela tolerância, ó bacanos) porque, se porventura não tivesse lá uma data de panlermas a debitar umas quantas panlermices sobre a “lusofonia”, então talvez aquilo pudesse ser levado a sério.

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Do pa(n)lermismo

Renato Epifânio

07/05/2016 – 07:30

Fazer tábua rasa das diferenças qualitativas é sempre meio caminho andado para o desnorte.

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Não há provavelmente nenhum partido político que nunca tenha defendido uma medida palerma. Entre nós, o caso mais recente é, decerto, o do Bloco de Esquerda, com a proposta de mudar o nome do “Cartão de Cidadão” para “Cartão da Cidadania” – com o “argumento” (não se riam, por favor) de que “Cartão de Cidadão” é uma expressão sexista. Só não se percebe porque se mantém o “cartão” – não seria melhor “cartoa” ou até “cartolina”? Pela nossa parte, da próxima vez que tivermos que pedir uma “Certidão”, iremos requerer, em vez disso, um “Certificado”, de modo a não ficarmos com qualquer trauma discriminatório.

Com a entrada em cena do Partido dos Animais e da Natureza (PAN), temos contudo que alargar o conceito da palermice política, a ponto de criarmos um neologismo: “panlermice”. Isto porque quando o PAN vem uma vez mais questionar a diferença entre humanos e animais, agora a propósito da proibição da entrada de animais em restaurantes, por exemplo, já não se está no estrito domínio da palermice. Há aqui uma subtil-abissal diferença que só o neologismo “panlermice” assinala.

Conhecemos bem a falácia argumentativa: o especismo (ou seja, a afirmação da espécie humana, na sua diferença irredutível) é equiparável ao racismo ou ao machismo. Assim, tal como é proibido proibir o acesso a restaurantes (mantenhamos o exemplo) em função do sexo ou do tom de pele, também teríamos que levantar a proibição aos animais. Fatalmente, depois o panlermismo tende a enredar-se nas suas próprias contradições, criando outro tipo de discriminações: desde logo, entre animais domésticos e não domésticos. Sendo que no fim parece que o universo dos animais domésticos se restringe aos cães e aos gatos (todos, escusado seria acrescentar, bem educados e muito fotogénicos).

Havendo pessoas que têm como animais domésticos todo o tipo de répteis – apenas para dar um outro exemplo –, ou até outros tipos de mamíferos menos habituais (passe o eufemismo), perguntamos, nesse caso, como se regularia a não proibição no acesso a restaurantes. Aqui, decerto, haverá alguém que apelará ao bom senso. Mas o problema é que, aberta a Caixa de Pandora do panlermismo, não há bom senso que a possa fechar. Ainda que possa não parecer, estamos aqui no domínio da defesa da nossa Civilização. E mesmo que se qualifique essa Civilização como “ocidental”, isso nada altera. Ocidental ou não, essa é a nossa melhor Civilização – aquela que, não por acaso, realmente consagrou os “Direitos do Homem”.

E não se insinue, em jeito de réplica, que o autor destas linhas seja indiferente ao sofrimento dos animais. Independentemente da questão filosófico-jurídica dos “direitos dos animais”, defendemos que esse sofrimento deve ser, tanto quanto possível, evitado – com as devidas penalizações, como já acontece no nosso Código Penal. Mas isso não passa por defender um igualitarismo jurídico, muito menos ontológico. Há uma superioridade ontológica dos humanos relativamente aos restantes animais que a nossa estrutura jurídica só pode consagrar. Por falar em ontologia, e regressando aos clássicos, acrescentamos que só as estruturas que reconhecem as diferenças qualitativas integram realmente num todo, numa unidade. Ao invés, fazer tábua rasa das diferenças qualitativas é sempre meio caminho andado para o desnorte – por mais politicamente incorrecto que hoje seja dizê-lo.

Presidente do MIL: Movimento Internacional Lusófono

www.movimentolusofono.org

[“Público”, 07.05.16. Imagem de… Bloco de Esquerda!!! (oops)]

2 Comments

  1. Não percebemos isso da “tolerância”. Na nossa Revista, a NOVA ÁGUIA, cada um escreve segundo a grafia em que mais se reconhece e nós não fazemos reparos “tolerantes” ou “intolerantes” quanto a isso.

  2. Desconheço a revista, a qual não menciono de forma alguma. No “site” do M.I.L. há textos em Português e em acordês; portanto, há ali “tolerância” e é a esta que me refiro. Aliás, em conformidade com a primeira parte da sua frase («cada um escreve segundo a grafia em que mais se reconhece») mas ao contrário da respectiva segunda parte («e nós não fazemos reparos “tolerantes” ou “intolerantes” quanto a isso»): os meus reparos a, por exemplo, não haver numa qualquer organização ligada à Língua Portuguesa uma firme oposição à demolição da mesma são absolutamente “intolerantes”; quanto a isso tem toda a razão.

    Cumprimentos.

    JPG

    P.S.: parabéns por este seu artigo no “Público”.

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