Dia: 28 de Agosto, 2016

Diz que «acordo regula formas de FALAR e escrever»…

Já vi, ouvi e li muita coisa sobre o AO90 mas esta é uma estreia absoluta: uma “Doutora em linguística” brasileira diz — e a peça jornalística reproduz — que “o acordo [ortográfico] regula as formas de falar e de escrever”.

Extraordinário.

Não que isso seja novidade, pois claro, já vamos ouvindo portugueses a dizer inúmeras palavras estropiadas pelo AO90 pronunciando-as claramente conforme as lêem, ou seja, tornando agora átona a vogal que anteriormente a consoante abatida tornava tónica: fatura, receção, batismo, arquiteta, etc.

Algumas pessoas, num tão bizarro quanto voluntário esforço para falar “à brasileira”, essa mítica (e absurda)  “língua universal”, vão ao ponto de eliminar administrativamente, na escrita e por consequência na fala, sequências consonânticas que o AO90 fez o favor de não abolir no Português-padrão:  de vez em quando alguém lá arrota postas de pescada como “contatar” e “contato” ou até “fato” e “fatualmente”, por exemplo.

Mas, ainda assim, mesmo que a realidade já seja esta apagada e vil tristeza, eu cá nunca tinha ouvido ou lido fosse quem fosse declarando — e de cátedra — que o AO90 “regula” não apenas a forma de escrever como a de… falar.

“Normatizar”, disse ela. “Padronizar a vida”, disse ela.

Crime, digo eu.

Raynice Silva destaca a importância do acordo ortográfico para padronizar a vida dos 260 mi de falantes do português (Foto: Euzivaldo Queiroz)

Encontro acadêmico discute as diferentes formas da língua portuguesa

28/08/2016 às 08:00

Isabelle Valois

Nesta última semana, mais de 1,2 mil pessoas participaram do 2º Encontro Amazonense de Professores de Línguas e Literaturas, promovido pelo Programa de Pós-Graduação em Letras

A língua portuguesa é nativa em sete países, onde é usada por 260 milhões de pessoas, sendo considerada a quinta mais falada no mundo e a terceira mais falada no Ocidente. Recentemente estes países fizeram um acordo ortográfico que a cada dia a deixa mais rica em novos detalhes. A forma escrita cobra mais as questões da gramática, mas, para muitos pesquisadores, a fala caminha por outro trilho, pois o importante é a compreensão.

Pesquisas apontam que cada falante conhece em média 16 mil itens lexicais – conjunto de palavras que são entendidas por si só – e são memorizadas por cada indivíduo. Conforme a doutora em linguística Raynice Pereira da Silva, não se contam só as palavras como itens lexicais, mas também a marcação de plural pra se dizer que está falando mais de um. “Quando falamos itens lexicais incluímos essas variações de acordo com as gerações. Muitas vezes palavras novas entram no léxico e há outras que ficam guardadas, mas não são usadas. Ao todo usamos esse 16 mil ou pelo menos temos esse conhecimento”, explicou Raynice.

Influências

O falante da língua portuguesa muitas vezes utiliza expressões, termos e palavras estrangeiras para facilitar o entendimento do assunto a se comunicar. “No português a gente tem muito desse empréstimo, principalmente após esse contato constante com as novas tecnologias”, disse.

Um dos termos utilizado como exemplo pela doutora em linguística é o “Twitter”. “Com as mídias digitais, hoje utilizamos muito a situação: vou tuítar. Essa palavra não existe na língua portuguesa, mas passou a existir como verbo e o adaptamos para a nossa gramática”, detalhou.

Sobre a relação com a linguagem utilizada na internet, a doutora acredita ser algo específico, em que muitas vezes é considerado como uma variação por se tratar de uma forma escrita.

“A fala tem muita variedade, o jeito de como falamos não é como se fala no Nordeste ou no Sul. A variedade na fala não causa estranhamento. O “internetês” se considera outra variação, mas dessa vez da modalidade escrita, mas ela varia pouco. A forma como escrevemos na internet com a ausência das vogais para se ganhar tempo se considera uma modalidade ”, informou Raynice.

Acordo regula formas de falar e escrever

Desde 2012 está em vigor o novo acordo ortográfico da língua portuguesa. Conforme a doutora Raynice Pereira da Silva, a ideia do acordo é facilitar a comunicação em todos países onde a língua é nativa. Antigamente só havia o acordo se todos os sete países aceitassem, mas agora a situação se encontra de forma diferente. Se a maioria concordar, se realiza o acordo.

É estipulado um tempo para que os falantes tenham um tempo para se adaptar com as novas ortografias e depois é colocado a validade para todos. Caso não se tenha uma adaptação pode ser adotado outra medida. “A língua vai mudando e com isso vai surgindo novas formas de escrita. A ideia é minimizar a língua escrita em comparação da fala, caso contrário os falantes falam de um jeito e escrevem de outro e acaba havendo problema, principalmente quando se vai utilizar nas escolas”, explicou. Para Raynice, o novo acordo é um processo contínuo de adaptação.

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