A “maravilhosa língua unificada” e a não menos “maravilhosa revisão do AO90″…
Oops, peço desculpa, não é “revisão” que se diz, agora parece ser obrigatório chamar “aperfeiçoamento” à fantochada.
Os acordistas portugueses conseguiram fazer esta coisa espantosa com o Português: transformá-lo numa espécie de “brasileiro” (como se vê, por exemplo, na bandeirinha que abrilhanta o site da Babbel) e assim, entrouxando essa tremenda vigarice em delírios para deslumbrar pategos, fazer passar a golpada por uma coisa a que chamam “língua unificada”.
Tentemos ignorar o ridículo da “ideia” e vamos fingir, por uma vez sem exemplo, que não alcançamos ao certo a dimensão da fraude. Talvez seja útil desaprender amiúde tudo aquilo que julgamos saber sobre o “acordo” e voltar por sistema à estaca zero. Reciclar o espanto, digamos, depurar a indignação.
É evidente, a julgar pelas últimas investidas, que o processo de brasileirização em curso (PBC) ficaria incompleto caso não existisse um continuum gradativo. Como se costuma dizer, isto vai de mal a pior: visto que o “acordo ortográfico” propriamente dito não unifica coisíssima nenhuma e até, pelo contrário, veio criar novas duplas grafias onde elas não existiam, então vá de “melhorar” a besta (ou “despiorar”, como há já quem designe essa trafulhice), consagrando exclusivamente não apenas a ortografia brasileira como também a própria fala dos brasileiros (“norma culta”, dizem eles). A premissa é muito simples: caso no Brasil se pronuncie determinada consoante que é “muda” em Portugal (e PALOP), então essa consoante, que o AO90 eliminara em 7 países mas não no Brasil, volta a ser “válida”; portanto, as ditas consoantes “mudas” passam a “valer” de novo em todos os 8 países da CPLP, mas essa “validade” é só para aquelas que… os brasileiros articulam e que, portanto, utilizam na (sua) escrita.
Dito de outro modo, porque isto parece ser de muito difícil compreensão para quem não quer entender ou se recusa a aceitar aquilo que é por demais evidente: a anunciada “revisão” do AO90, artisticamente baptizada pela ACL como “aperfeiçoamento”, não é mais do que a segunda etapa do PBC e consiste basicamente em impor a norma ortográfica brasileira no espaço da chamada “lusofonia”. Sintetizando, meia dúzia de fulanos que nasceram em Portugal (assessorados por alguns estupefactos brasileiros) pretendem impingir ao país de origem da Língua e a seis ex-colónias portuguesas uma coisa a que chamam “língua portuguesa unificada” mas que na verdade e de facto é a “norma” da sétima ex-colónia.
O PBC, na prática, caso se verifique não haver em Portugal senão umas quantas manadas de ruminantes, significará esta coisa arrepiante, nojenta, escabrosa: para escrever uma palavra “corretamente” (em “brasileiro”) qualquer português terá de saber — de memória ou perguntando para os lados — como se redige, ou seja, como se pronuncia essa palavra no Brasil.
Os “arquitetos” do PBC não brincam em serviço. Além das habituais campanhas de intoxicação da opinião pública, vão já experimentando até uma velhíssima técnica de “marketing”: inventar de raiz uma necessidade para resolver problemas gerados por outra necessidade que eles mesmos tinham também previamente inventado prevendo a segunda campanha e destinando-se essa a resolver problemas que jamais existiram.
Mal comparado, seria o mesmo que um “expert” (“esperto”, no crioulo de Malaca) lembrar-se de lançar uma marca de sabonetes “para emagrecer” e viesse uns tempos depois colocar no mercado um antídoto para as pessoas que desataram a comer sabonetes…
A peça seguinte ilustra na perfeição estes conceitos de vendedores de banha-da-cobra com designação genérica em Inglês: o AO90 jamais serviu para coisa alguma, foi uma invenção não apenas totalmente inútil como estupidamente perniciosa, mas agora há estas “diferençazinhas” (que antes do mesmo AO90 não existiam), portanto vá de “melhorar” o AO90, eliminem-se as tais “diferençazinhas” (que antes não existiam mas isso agora não interessa nada, faz de conta que sempre foi assim).
Génios da corda. Lampadinhas.
Certains mots s’épellent différemment en portugais européen et portugais brésilien. Le mot «réception», par exemple, s’écrit au Portugal receção, tandis que la version brésilienne rajoute un -p : recepção. Cette différence s’étend à d’autres mots auxquels la prononciation brésilienne rajoute un -p là où il est absent dans la prononciation européenne.