19. Fala-se muito em revisão do AO90. E porque não?
Porque isso seria estúpido. Quase tão estúpido como referendar a Língua Portuguesa, mas não abusemos.
O que acordistas e assimilados pretendem, na realidade, com essa treta da “revisão” do “acordo”, é fingir que tal desconchavo seria um mal menor; exactamente a mesma táctica, portanto, que usaram os acordistas com o projecto de AO de 1986: fingir que “do mal, o menos” é menos mau do que o horror com que ameaçam. Ora, o horror, como o gigantismo ou a excelência, não é um conceito gradativo ou mensurável — ou é horror ou não é horror.
E o AO90, está bem de ver, é horroroso, sem gradações, não ficaria um horror mais pequenino com a tal “revisão”.
Porque, efectivamente, qualquer espécie de revisão do cambalacho resultaria fatalmente na “adoção” integral e definitiva da desortografia brasileira. Integral porque uma versão revista e “corrigida” do AO90 — que, apesar de horripilante, ainda prevê algumas excepções — obrigaria os portugueses (e africanos) a memorizar (ou perguntar a alguém) a forma como se pronuncia esta ou aquela palavra no Brasil para poder escrevê-la “corretamente”. Afinal, em todas as versões de projectos de revisão do AO90, apenas são apontados casos que antes do “acordo” eram grafados da mesma forma em ambos os lados do Atlântico: como em, por exemplo, “recepção”, “decepção”, “expectativa”, “perspectiva”, etc. As excepções a esta regra (“Egipto” e pouco mais) não passam de trocos a troco de nada; é tudo, como sempre, fingimento descarado.
Ou seja, se fosse aprovada a versão “revista” do “acordo”, os portugueses passariam a ser o único povo do mundo cuja ortografia seria determinada pela forma como se fala num país estrangeiro. Colonização ao contrário, portanto, e da espécie mais alienígena: a ex-colónia impõe a sua novilíngua ao ex-colonizador.
20. Como ou onde podemos ver o que foi alterado pelo AO90?
Não é “alterado”, é adulterado.
Existe online uma coisa que os acordistas baptizaram como “Dicionário de Mudança”, cuja finalidade seria, teoricamente, listar todos os lemas (entradas de dicionário) estropiados pelo AO90.
Em jeito de diálogo informal, aqui fica a “ficha” desse tal “Dicionário de Mudança”:
— Quantas palavras constam daquilo?
— 6.621 lemas (em Março de 2018).
— Só? Não há mais?
— Até ver, não. Aquilo está cirurgicamente amputado. Muitas das palavras de uso mais corrente não constam.
— Quantos desses lemas foram alterados no Português-padrão?
— 14.444.
— E na variante brasileira?
— Zero.
— 14.444 palavras (lemas!) do “nosso” Português são estropiadas pelo AO90 mas afinal nem uma da variante brasileira?!
— Exacto. Na variante brasileira nem uma foi alterada pelo AO90. O “acordo” é isto mesmo: uma parte cede 100%, a outra parte “cede” 0%.
Maravilhoso, não é? Para compreender como foi feita esta “fantástica” vigarice basta consultar os respectivos Números.
21. O AO90 pretende “unificar” as duas variantes do Português. Existem variantes em outras Línguas?
Oh, sim! Se existem! Basta abrir o Word ou outro processador de texto similar e conferir:
- 18 variantes de Inglês: Austrália, Belize, Canadá, Caribe, Hong Kong, Índia, Indonésia, Irlanda, Jamaica, Malásia, Nova Zelândia, Filipinas, Singapura, África do Sul, Trinidade e Tobago, Reino Unido, Estados Unidos da América, Zimbabwe.
- 15 variantes de Francês: Suíça, Senegal, Reunião, RD Congo, Mónaco, Marrocos, Mali, Luxemburgo, Índias Ocidentais, Haiti, França, Costa do Marfim, Canadá, Camarões, Bélgica.
- 21 variantes de Espanhol: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, El Salvador, Equador, Espanha (2 tipos), Estados Unidos, Guatemala, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Peru, Porto Rico, República Dominicana, Uruguai, Venezuela.
- 15 variantes de Árabe: Arábia Saudita, Argélia, Barhein, EAU, Egipto, Iémen, Iraque, Jordânia, Kuwait, Líbia, Marrocos, Omã, Katar, Síria, Tunísia.
- 9 variantes de Sami (Lapão): Sami, Finlândia (3 tipos), Noruega (2 tipos), Suécia (3 tipos).
- 5 variantes de Alemão: Alemanha, Áustria, Liechtenstein, Luxemburgo, Suíça
- 5 variantes de Chinês: Hong Kong, Macau, China, Singapura, Taiwan.
- 3 variantes de Quechua: Bolívia, Equador, Peru.
- 2 variantes de Gaélico (Irlanda, Escócia), Holandês (Holanda, Bélgica), Italiano (Itália, Suíça), Mongol, Nepalês, Norueguês, Punjabi, Romeno (Moldávia, Roménia), Russo (Moldávia, Rússia), Sindi (Índia, Paquistão), Sueco (Finlândia, Suécia), Tigré, Urdu.
Como vemos, o que diz Malaca sobre este particular é só mais um chorrilho de mentirolas e contradições.
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