«Lamento muito que os portugueses…» [Paulo Franchetti, Facebook]


Este “post” foi publicado por Paulo Franchetti no Facebook há exactamente três anos, mas bem poderia ter sido escrito e publicado hoje; mantém absoluta actualidade.

Trata-se de um pequeno mas extraordinariamente incisivo texto que foi aliás citado por, pelo menos, três cronistas tão diversificados quanto Filipe Zau, em Angola, João Gonçalves, em Portugal, e o Padre Belmiro Narino, no Luxemburgo.

  1. «Os falsos pressupostos do Acordo Ortográfico» [“Jornal de Angola”, 31.05.16]
  2. «O Acordo e a linguiça» [João Gonçalves, JN]
  3. “O poder despreza a cultura” [Belmiro Narino, “Luxemburger Wort”]

 

Por alguma estranha razão, com três anos de atraso (algum acesso de tuguismo ao retardador, ou então é só da velhice mesmo), só agora me apercebi de que ainda não tinha aqui reproduzido o dito “post”.

Pronto, fica rectificado o lapso.

 

Tenho acompanhado um pouco a reação e os apoios ao Acordo Ortográfico em Portugal, onde estou no momento.

Lamento muito que os portugueses passem a ser obrigados a escrever da forma abstrusa que o acordo preconiza.

Para nós, brasileiros, é mais fácil: sumiu o trema, perderam-se uns acentos, trocou-se a confusão dos hífens por outra confusão dos hífens. Saiu barato.

Em Portugal se produzem aberrações.

Espanta-me ver que há professores da área de Letras a defenderem o acordo. Alguns com argumentos tão inconsistentes quanto o próprio “acordo” que defendem.

As perguntas essenciais nunca afloram: quem precisa de um acordo desses, quem tem dinheiro para implementá-lo, qual a sua prioridade no plano das carências culturais?

Cientificamente, o acordo não se sustenta. Culturalmente, além de perverso, é irresponsável. Mas há vontade política de implementá-lo a qualquer custo.

Pobre país este… E não porque tenha de se dobrar ao Brasil. Isso é balela. O acordo tampouco interessa à cultura brasileira. Exceto à indústria dos livros didáticos e de referência. Pobre país este no qual muitos políticos e alguns intelectuais acham que a ordem que vem de cima deve ser a ordem das coisas.

Para nós, brasileiros, o acordo é inócuo. E talvez não sobreviva muito tempo, como não sobreviveu a reforma de 45, quando deixamos Portugal a escrever sozinho no novo sistema.

Mas aqui o chamado acordo é simplesmente inútil, custoso e absurdo, do ponto de vista científico e, principalmente, cultural. E está sendo enfiado goela abaixo de um grande número de intelectuais de primeira linha, implantado por lei e mandado fazer cumprir…

Paulo Franchetti

[Evidentemente, na transcrição textual, os destaques, sublinhados e “links” foram adicionados por mim. Imagem de topo de: Antero (Facetoons). ]