Feira do Livro de Lisboa diz não ao voluntariado a partir do próximo ano
APEL não vai recrutar voluntários para a Feira do Livro de Lisboa em 2019 depois de um abaixo-assinado promovido no Facebook pela escritora Alexandra Lucas Coelho.
A Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL) vai deixar de ter voluntários a trabalhar na Feira do Livro, a partir do próximo ano, uma decisão tomada na sequência de um abaixo-assinado que recebeu contra “o abuso de voluntários”.
“Foi hoje recebido na APEL um extenso abaixo-assinado contra a existência de voluntários na Feira do Livro de Lisboa. Correspondendo ao pedido que lhe é dirigido, a APEL decidiu não voltar a admitir a participação de voluntários na Feira”, lê-se na página de Facebook da Feira do Livro de Lisboa.
No dia 25 de Maio, foi lançado um abaixo-assinado nas páginas de Facebook da escritora Alexandra Lucas Coelho e da directora de Comunicação da Penguin Random House/Companhia das Letras, Helena Ales Pereira, intitulado “Não ao abuso de ‘voluntários’ na Feira do Livro de Lisboa”.
“A APEL tem dinheiro, ou devia ter, para remunerar quem recruta durante a feira”
O abaixo-assinado, em forma de carta dirigida à APEL, que organiza a Feira do Livro em parceira com a autarquia, reuniu centenas de assinaturas de pessoas “contra o recrutamento de voluntários” pela APEL, que “recebe das editoras muitos milhares de euros pela presença na feira, além das quotas e de outras subvenções”. “A APEL tem dinheiro, ou devia ter, para remunerar quem recruta durante a feira. Para aliciar estes ‘voluntários’, a APEL invoca o contacto com livros e autores. Estar em contacto com livros e autores não é remuneração de ninguém. Aqueles de entre nós que contribuem para que os livros sejam feitos e circulem recusam-se a ser usados como isco”, acrescenta.
Inicialmente, a APEL alegou estar a cumprir a lei e argumentou ser uma “instituição sem fins lucrativos”, razão pela qual o apoio financeiro da autarquia “é indispensável” à realização da feira.
Não ao voluntariado depois de uma polémica
A questão do voluntariado na Feira do Livro de Lisboa ganhou contornos ainda mais polémicos, quando, no dia 2 de Junho, durante um debate sobre activismo, promovido pela Tinta-da-China, a propósito do livro Racismo no País dos brancos Costumes, foi abruptamente interrompido, devido aos comentários alegadamente racistas de uma voluntária da APEL.
De acordo com o relato feito pela editora da Tinta-da-China, Bárbara Bulhosa, na sua página do Facebook, a referida colaboradora passou o tempo todo a dizer que não concordava com o que estava a ser dito, e a referir-se aos convidados como “esta gente”, numa “performance racista, num debate contra o racismo”, chegando mesmo a interpelar um dos convidados, Mamadou Ba, quando este falava, quase no final do debate, para lhe dizer: “Vê lá se te despachas!”.
A APEL reagiu, na altura, ao sucedido, lamentando “profundamente os incidentes ocorridos”, e garantindo que “não se revê de nenhum modo na atitude assumida pela sua colaboradora, que dava apoio logístico à sessão de apresentação”.
A decisão da Feira do Livro de Lisboa de cancelar o voluntariado a partir da próxima edição é inédita. O recrutamento de voluntários por parte de grandes eventos é há muito criticada, sendo os casos do Rock In Rio Lisboa e do Web Summit dos mais badalados.
[Revista “Shifter”, 07.06.18. Transcrição integral (sem imagens).]