Dia: 3 de Setembro, 2018

“Os Maias”, bro? Yow, cena fatela!

Aparentemente, isto seria uma boa notícia: afinal os facínoras politicamente correctos (passe a redundância) que enxameiam o Ministério da “Educação” ganharam juízo e recuaram, ao menos por uma vez, se calhar sem exemplo, numa das suas desastrosas decisões.

Pois bem, não me parece. De todo. Não há nisto mais do que uma manobra táctica, aliás a do costume, consistindo esta em fingir que existe recuo quando se trata de simples adiamento: a seu tempo, quando àquela espécie de lagartixas extra-terrestres mais convier, o “recuo” de agora será mais tarde cobrado com juros exorbitantes. A real finalidade mantém-se intacta e entretanto os papalvos do costume rejubilam com o que julgam ser uma “grande vitória” a curto prazo.

Pois sim. A curto prazo o engodo da “reposição” de “Os Maias“, por exemplo, mas depois, a médio prazo, o abate sistemático de tudo aquilo que vagamente cheire a Literatura no ensino, e por fim, a longo prazo, a institucionalização da “ideia” subjacente: ler não passa de um ridículo anacronismo, às crianças e aos jovens a leitura “não serve para nada”, há que dar vazão à sua própria “criatividade” (jogando futebol, por exemplo) e promover a “inclusão” erradicando por via administrativa a “exclusão”. Sempre a mesma dicotomia simplista, a mesma premissa binária de incompatibilidade mútua,

Ou seja, patacoada pseudo-progressista atrás de patacoada pseudo-pedagógica, mais tarde ou mais cedo um “radioso” futuro de “igualdade” universal acabará de uma vez por todas com os últimos laivos de esperança em que as gerações vindouras não sejam exclusivamente compostas de perfeitos ignorantes, completos trogloditas, absolutos idiotas.

Os Maias voltaram à lista de leitura para o ensino secundário

Ministério da Educação recuou na proposta de conteúdos que devem ser leccionados no secundário. Versão definitiva das aprendizagens essenciais volta a incluir quais as obras que devem ser lidas em vez de deixar esta escolha a cada professor.

Clara Viana
“Público”, 02.09.18

 

A obra de Eça de Queirós Os Maias não vai, afinal, desaparecer da lista de leitura para o ensino secundário, como o Ministério da Educação (ME) chegou a propor. É o que se pode comprovar ao ler a versão definitiva das aprendizagens essenciais para o secundário, que foi homologada nesta sexta-feira por despacho do Secretário de Estado da Educação João Costa.

As chamadas aprendizagens essenciais vão ser aplicadas a partir do próximo ano lectivo, num processo que começará, no caso do secundário, pelo 10.º ano. Para o ME, a definição destas aprendizagens, que esteve sobretudo a cargo das associações de professores, é necessária para resolver o problema da “extensão” dos actuais programas e permitir que seja fixado um “conjunto essencial de conteúdos” que todos os alunos devem saber, em cada disciplina, no final de cada ano de escolaridade.

Na versão que esteve em consulta pública em Julho, os documentos propostos para a disciplina de Português omitiam quais as obras de Eça de Queirós que deveriam ser lidas no secundário, referindo apenas que os alunos teriam de ler um livro deste autor.

O programa da disciplina, que ainda se encontra em vigor, determina que a abordagem a Eça de Queirós, que faz parte da matéria do 11.º ano, passa pela leitura de um de dois livros: Os Maias ou a Ilustre Casa de Ramires. E é essa a prática que tem sido seguida nos últimos anos.

A supressão da obra Os Maias na versão inicial apresentada pelo ME, noticiada pelo PÚBLICO, deu origem a um coro de protestos de académicos, professores e especialistas queirosianos. Mas como o ME não tem por hábito elaborar relatórios das consultas pública que promove, não se sabe quantas propostas de alteração foram apresentadas, nem qual o seu teor.

Não foi só em relação a Eça de Queirós que o ministério recuou. Em todas as listas de leitura apresentadas agora para o 10.º, 11.º e 12.º anos, voltam a ser inscritas as obras de Almeida Garrett, Alexandre Herculano e Camilo Castelo que constam do programa, mas que tinham desaparecido da versão inicial das aprendizagens essenciais, onde foram substituídas pela referência “escolher um romance” de um destes três autores. Foi o que passou também com Cesário Verde, onde se apontava apenas que seria preciso “escolher três poemas”, o que agora foi substituído pela leitura obrigatória, como tem sido a norma, do Sentimento dum Ocidental.

Na altura, a presidente da Associação de Professores de Português, Filomena Viegas, justificou esta opção, por um lado com a necessidade de diminuir o número de obras propostas para leitura e, por outro para se permitir “o alargamento das opções que podem ser tomadas pelos docentes”, a quem ficaria entregue a escolha dos livros que os alunos deveriam ler.

Também no 12.º ano o ME desistiu de retirar a abordagem ao conto, enquanto género literário. Na lista de leitura para este ano de escolaridade voltam a estar incluídos contos de Manuel da Fonseca, Maria Judite de Carvalho e Mário de Carvalho.

Num artigo de opinião escrito para o PÚBLICO, a professora da Universidade do Porto e ex-ministra da Cultura, Isabel Pires de Lima, chamou a atenção para o facto de a supressão do conto do programa de Português não ser “uma opção desejável, até por se tratar de um género breve que os jovens nas sociedades de hoje (…) nitidamente privilegiam como é possível constatar na blogosfera onde narrativas breves e micronarrativas ocupam lugar de relevo”.

Por fim, no que respeita ao 10.º ano, a versão definitiva das aprendizagens essenciais volta a incluir a Crónica de D. João I, de Fernão Lopes, que na proposta inicial tinha sido erradicada.

cviana@publico.pt

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