Don Quijote soy, y mi profesión la de andante caballería. Son mis leyes, el deshacer entuertos, prodigar el bien y evitar el mal. Huyo de la vida regalada, de la ambición y la hipocresía, y busco para mi propia gloria la senda más angosta y difícil. ¿Es eso, de tonto y mentecato?
Miguel de Cervantes, ‘Don Quijote de La Mancha’
Uma situação embaraçosa que se torna cada vez mais corriqueira nos desgraçados tempos que vão correndo: estão pessoas normais e educadas conversando com toda a pacatez, quando, inopinadamente, um idiota interrompe ou vários dos circunstantes resolvem esparramar em redor toda a sua boçalidade.
Foi o que sucedeu neste caso: durante uma “tertúlia” regular da RTP3, está a escritora Inês Pedrosa comentando a iminente entrega da ILC-AO no Parlamento quando, de repente, dois tipos sentados na mesma mesa desatam a largar umas “bocas”, na tentativa de abafar com ruído o que a escritora estava a dizer.
Não fora a epidérmica simpatia da senhora a salvar a situação, estivesse ali um homem e decerto outro galo cantaria, poderia ter acontecido algo muito mais aborrecido, como, por exemplo, o dito ter dado um murro na mesa e uma palmada num dos rufias ou, pior ainda, vice-versa, uma palmada na mesa e um murro no gajo.
“Não estamos na RTP Memória”, arrotou um qualquer garoto, por entre as gargalhadas postiças de outro cretino de serviço. Mas que idiotas, valha-nos Deus, mas que abjectos yuppies caseiros, rudes, ignorantes e mal-educados “fatinhos”, mas que desoladora imagem do subúrbio mental em que vegetam tecnocratas e onde apenas e sem nenhum préstimo sopra o vento.
Inês Pedrosa saiu-se muitíssimo bem, de facto, com a sua natural classe, poupando a todos os espectadores e ouvintes o enxovalho da vergonha alheia — esse sentimento já vulgarizado pela corrupção hedonista da juventude, pelo galopante enobrecimento da estupidez, pelo inexorável triunfo da mediocridade.
Honra lhe seja feita, a senhora tem o que é preciso. Conseguiu muito mais com um simples sorriso do que teria valido uma singela chapada.
Ou duas, vá.
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Creio que neste caso se impõe identificar, nomear, os (sem dúvida) «idiotas», «boçais», «rufias», «cretinos», «abjectos yuppies caseiros, rudes, ignorantes e mal-educados “fatinhos”».
Um é Joaquim Vieira, suposto jornalista, que, entre outros cargos, foi director-adjunto do Expresso e director-adjunto de programas da RTP.
O outro é Rodrigo Moita de Deus, suposto monárquico, que, é patente, ainda não compreendeu – apesar de algumas «mensagens» que já lhe dirigi nesse sentido – que as alterações sucessivas da ortografia são uma das características, um dos «vícios», que mais distinguem (negativamente) a «república à portuguesa».
Pois sim, decerto, porém desconhecia eu (em alguma coisa tenho sorte, além do Blackjack) tais alimárias e desconhecia de todo quais fossem os respectivos tachos e/ou as panelinhas em que se acoitam.
Chegou-me e sobrou-me, acompanhando isso de instintivo esgar de nojo, a profunda irritação que me provocaram nas meninges os risinhos asininos e as “boquinhas” idiotas daqueles tristes.
Mas agradeço, é claro, o esclarecimento. Parece-me sempre avisado, quando não prudente, saber a gente, ao certo, de que espécie de cavalgaduras há que esperar coices manhosos.