Dia: 17 de Janeiro, 2021

Ao menos coerência!

Não há-de ser difícil e muito menos será de alguma forma arriscado, seja qual for a perspectiva: os escritores estão legalmente protegidos por Direitos de Autor, o que significa que a integridade das obras literárias está de facto preservada e consignada. A nenhuma editora assiste o poder de alterar*** — seja de que forma for, a começar pela ortografia utilizada pelo autor — qualquer obra, livro, artigo, notas, comentários ou quaisquer outra formas de expressão escrita.

Por algum motivo que escapa à compreensão dos simples mortais, isto é, do público ao qual a Literatura se dirige e da qual é consumidor, porque adquirente, ou de outra forma leitor, porque destinatário, alguns escritores portugueses (e jornalistas e tradutores) admitem que as suas obras sejam estropiadas pelas editoras; estas, por seu turno, não apenas destroem alegremente a ortografia dos originais como, por requinte de malvadez, obrigam os autores a permitir que os seus escritos sejam previamente triturados pelo AO90. São imensas (e muito mal esgalhadas, como não podia deixar de ser) as desculpas que tais autores balbuciam para justificar a sua cobardia (ou pura estupidez); mesmo dando de barato as tretas e mentiras do costume (ah, e tal, o AO90 agora é lei, as editoras são obrigadas a empregar o “acordo”, o que posso eu fazer, a vida está difícil, e tal e tal), para esses esponjosos autores não há qualquer desculpa e sequer podem alegar coisa alguma em sua defesa. Admitem a cacografia brasileira nas suas publicações porque são feitos de borracha — sejamos polidos na terminologia — e portanto fingem que o problema lhes é indiferente, mera “questão de hábito” e patacoadas assim.

Não é de todo este o caso da escritora Teolinda Gersão, que desde sempre recusa liminarmente, como é seu direito, quaisquer vigarices na ortografia. Militante desde a primeira hora da luta contra o AO90, Teolinda Gersão declara expressamente em todos os seus originais que a edição e impressão de qualquer original seu terá de respeitar a versão integral do original, o que inclui, natural e inerentemente, a respectiva ortografia.

Não há cá “funfum nem gaitinhas”: ou a editora segue as instruções da autora quanto à ortografia ou então a autora mudará de editora (que as há, e bastantes, a recusar também o AO90), e adeus, passem bem.

[Nota: por respeito para com Teolinda Gersão, que além do mais é uma pessoa simpaticíssima, e para o muito improvável caso de tão honorável senhora alguma vez ler isto, devo dizer que — de boa vontade — tentei quase desesperadamente não desatar a insultar os brasileirófilos em geral e os escritores portugueses desse género em particular.]

*** Entretanto, os vigaristas ao serviço do Centrão acordista já alteraram o CDADC

 

Escritora Teolinda Gersão celebra 40 anos de carreira literária com novo livro

“Diário de Notícias” (Madeira), 14.01.21

 

A escritora Teolinda Gersão, a celebrar 40 anos de actividade literária, publica hoje um novo título, “O Regresso de Júlia Mann a Paraty”, e reedita “A Mulher que prendeu a Chuva”, de 2007, um dos mais premiados da autora.

“O Regresso de Júlia Mann a Paraty” reúne três novelas que se entrecruzam, e a que a escritora admite chamar romance, como afirmou, em declarações à agência Lusa.

“Prefiro considerá-lo um conjunto de três novelas entrelaçadas, sobre personagens históricas, que na vida real coexistiram e tiveram algum tipo de relacionamento”, afirmou Teolinda Gersão, numa entrevista por escrito, à Lusa, na qual sublinha a sua determinação em não seguir o Acordo Ortográfico vigente.

“Poderia chamar romance a este livro”, assegurou. “Obviamente há aspectos ficcionados, imediatamente reconhecíveis, mas todos os factos que refiro no livro são rigorosamente verdadeiros e estão documentados”, sublinhou.

Segundo Teolinda Gersão, “os títulos fornecem as coordenadas ao leitor”, são eles: “Freud pensando em Thomas Mann em Dezembro de 1938”, “Thomas Mann em Freud em Dezembro de 1930” e “O regresso de Júlia Mann a Paraty”, que dá titulo ao livro.

Quanto a “A Mulher que Prendeu a Chuva e outras histórias”, foi editado em 2007, venceu os prémios Máxima Literatura e Fundação Inês de Castro e vai na 7.ª edição.

A obra [de] 14 contos, que, partindo do quotidiano, se desenvolvem “insensivelmente, a outros mundos – oníricos, fantásticos, terríveis ou absurdos -, que nem por isso deixam de nos pertencer e de ser o lugar onde habitamos”, lê-se na apresentação da obra.

Sobre os 40 anos de vida literária, Teolinda Gersão faz um “balanço positivo e gratificante”.

“Sou agora muito mais lida do que há décadas atrás, os leitores estão familiarizados com a minha escrita. E os primeiros livros que publiquei tornaram-se ainda mais actuais do que na altura em que surgiram”, argumentou.

“Suponho que sou intuitiva, e me arrisco muitas vezes a ter razão antes do tempo”, acrescentou.

Sobre a actual situação pandémica, Teolinda Gersão afirmou que “é, certamente, inspiradora de novas histórias”.

“Todas as situações e épocas precisam de ser contadas, é o que distingue os humanos das outras espécies do planeta. Mas as narrativas necessitam em absoluto de ser verdadeiras. Para isso, a ficção pode ser, paradoxalmente, o melhor dos caminhos. Daí a responsabilidade enorme, e cada vez maior, dos escritores”.

“O mundo está cheio de narrativas falsas, e elas são uma das grandes perversões do mundo doente em que nos encontramos”, acrescentou.

O novo título de Teolinda Gersão, “O Regresso de Júlia Mann a Paraty”, é apresentado em ‘live streaming’ no dia 09 de Fevereiro, às 21:30, nas páginas da Porto Editora nas redes sociais Facebook e Youtube, com a participação da autora e da psicanalista Deolinda Santos Costa, numa sessão moderada pelo editor Vasco David.

Teolinda Gersão completa 81 anos no próximo dia 30. Nasceu em Coimbra, estudou Germanística, Romanística e Anglística nas universidades de Coimbra, Tübingen e Berlim, na Alemanha.

Foi Leitora de Português na Universidade Técnica de Berlim, assistente na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e professora catedrática da Universidade Nova de Lisboa, tendo lecionado Literatura Alemã e Literatura Comparada.

Teolinda Gersão recebeu mais de uma dezena dos principais prémios literários, alguns dos quais bisou, como o Grande Prémio de Conto Camilo Castelo Branco, da Associação Portuguesa de Escritores, que recebeu em 2002, com “Histórias de Ver e Andar” e, em 2017, com “Prantos, Amores e Outros Desvarios”.

Também por duas vezes foi distinguida com o Prémio Fernando Namora, atribuído pela Estoril-Sol, em 2001 pela obra “Os Teclados” e, em 2015, com “Passagens”.

O Prémio P.E.N. Clube de Narrativa foi-lhe igualmente atribuído pelas obras “O silêncio”, a sua estreia literária em 1981, e por “O Cavalo de Sol”, em 1990, ambos atribuídos ex-aequo, respectivamente com Eduarda Dionísio, “Histórias, Memórias, Imagens e Mitos duma Geração Curiosa” e Paulo Castilho, “Fora de Horas”.

“O Regresso de Júlia Mann a Paraty” sucede ao livro de contos “Atrás da Porta”, publicado em 2019.

 

[Os textos que eventualmente sejam publicados na imprensa usando a cacografia brasileira no original (por exemplo,da Agência brasileirusa) e aqui reproduzidos são automaticamente corrigidos com a solução Firefox contra o AO90 através da extensão FoxReplace do browser.]