«Apesar da manifesta melhoria das relações comerciais, apesar da TAP, da Embraer e dos contactos, um oceano de percepções continua a separar Portugal do Brasil. Que os brasileiros tenham cultivado o antilusitanismo, no século XIX, para construírem a sua própria identidade (que não existia antes da independência), compreende-se; que o continuem a fazer até hoje, quase 200 anos depois, já se percebe menos.» [Carlos Fino, 03.09.2018]
A expressão-chave nesta série de artigos e gravações sobre a colonização linguística brasileira é “português do Brasil” (com variantes como “português brasileiro”, por exemplo), essa tremenda mentira em que nem bebés de chupeta acreditam; para as crianças portuguesas — ou seja, para as principais vítimas da intoxicação malaco-becharense — aquilo que estão a aprender a falar e a escrever é brasileiro, é mesmo a língua brasileira. No que têm toda a razão, evidentemente, jorrando como sempre acontece pela boca das crianças a verdade crua, sem dourados, torções ou disfarces.
No caso específico de mais esta notícia, de um órgão de comunicação social português, o enunciado da matéria jornalística mantém-se mas agora com outros e mais pormenorizados exemplos da campanha neo-imperialista, racista e xenófoba em curso; esta campanha, utilizando as mais modernas tácticas (a CPLP), ferramentas (o AO90) e armamento (os OCS), foi lançada em 1986 por um “sindicato” de políticos brasileiros e portugueses que, em 1990, congeminaram um “acordo” político garantindo ao Brasil a tomada de posse administrativa da Língua Portuguesa e, re-baptizando-a como “língua universal”, outorgando àquele país o direito de se imiscuir (ou mandar) nos assuntos internos (ensino, diplomacia, exploração de recursos) de Portugal e dos ex-PALOP (agora PALOB). As medidas mais concretas e imediatas já em curso de execução incluem a priori a perversão do Acordo de Schengen, que Portugal subscreveu enquanto país-membro da União Europeia, e a “negociação” — intermediada por portugueses comissionistas — com Angola e Moçambique da exploração de petróleo, diamantes, ouro, gás natural, madeiras exóticas e mão-de-obra “barata”.
Assumir ou presumir ou pretender que a destruição da Língua Portuguesa, que a permanente lavagem ao cérebro a que são sujeitos os portugueses e que o condicionamento mental das nossas crianças são meras “coincidências”, fingir que a campanha neo-imperialista brasileira é só mais uma “teoria da conspiração” ou, em suma, como corolário do infelizmente ancestral deixandarismo lusitano, continuar a assobiar para o lado e “vê-las passar”, corresponderá fatalmente a assinar de cruz uma extensa certidão de óbito passada à maioria ainda em vida e de novo aos seus egrégios avós.
“Oi, beleza?” Como os ‘influencers’ brasileiros transformam o português dos mais novos
Rádio Renascença
rr.sapo.pt, 14.10.21
14 Out. 2021 • Pedro Mesquita , André RodriguesYoutubers
Com a proliferação de canais de youtubers brasileiros, o português do país do samba substitui, por vezes, o português original no dia a dia de crianças entre os quatro e os dez anos. A escola acompanha com preocupação, os pais procuram corrigir o mais que podem. Mas nem sempre conseguem exercer o papel de regulação. Há crianças a adormecer “por exaustão”, reconhece uma professora.
“Oi, galera”, “Beleza?”. São as expressões do português que se fala no Brasil e que estão a tornar-se cada vez mais frequentes no vocabulário das crianças portuguesas. Basta entrar no YouTube e, rapidamente, se percebe que escolha é coisa que não falta.
Um dos mais populares em Portugal é Luccas Neto, que já superou a marca dos 32,6 milhões de inscritos no seu canal.
É um negócio de família, pode dizer-se: Luccas é irmão de Felipe, um dos primeiros youtubers a fazer sucesso no YouTube. O canal mais voltado para o público adolescente conta com mais de 40 milhões de inscritos e mais de 10 mil milhões de visualizações.
Mas é na faixa entre os quatro e os 10 anos que o fenómeno regista um crescimento mais acentuado. Há poucas crianças dentro destas idades que nunca tenham visto, pelo menos, um vídeo de Luccas Neto.
O que mais preocupa pais e educadores é o facto de verem e ouvirem horas a fio, muitas vezes sem controlo parental.
E acabam por imitar: “Oi galera, como é que você está? Digo esse tipo de coisas que também aprendi com o Luccas”, conta à Renascença Vasco (nome fictício), um menino de oito anos.
“Já pedi aos meus pais, se eu podia ser youtuber, mas eles ainda estão a pensar”, confessa Rita (nome fictício), com nove anos de idade.
Da imitação ao sonho de ser uma estrela do streaming infantil, vai um passo demasiado curto. O português sambado vai gradualmente substituindo o original.
“A minha mãe não se importa, mas o meu pai não gosta muito que eu fale assim”, reconhece a menina de nove anos, aluna na Escola das Devesas, em Gaia.
Outra casa, outra família, a mesma preocupação: Vasco admite que expressões como ‘oi’ são frequentes. Mas os pais não lhe dão margem para abrasileirar o português. “Eles já me avisaram de muita coisa que eu digo em brasileiro e não digo em português”, conta.
A escola já se apercebeu do fenómeno
A fluência e a rapidez com que as crianças interagem umas com as outras em português do Brasil surpreendem as famílias e, também, os professores.
A sala de aula e, sobretudo, o recreio tornaram-se os locais preferidos para replicar falas que vão de Luccas Neto a Maria Clara e JP, de Luluca a Felipe Neto e tantos mais que tomam uma parte do tempo livre das crianças que crescem de olhos pregados nos tablets e nos smartphones.
“Eles até me ensinam, porque eu questionei como é que tenho alguns alunos que ainda não conseguem ler e eles encontram estratégias, dizem as palavras Luccas Neto no microfone do Google e aparece-lhes”, reconhece Carmen, professora do primeiro ciclo do Ensino Básico.
Também Cristina, educadora de infância, sente essa tendência nos mais pequenos: “eu sinto que as crianças com quatro, cinco ou seis anos têm livre acesso. Quase todos têm um tablet ou acedem ao telemóvel dos pais e eu vou descobrindo personagens de youtubers”.
A chave do sucesso destas personagens está nas situações que os vídeos retratam. As guloseimas estão presentes nos vídeos de Luccas Neto, a par com alguns comportamentos menos correctos que são retratados, até em contexto de sala de aula.
Vasco reconhece que o seu ídolo Youtube “goza com as pessoas e com a professora”.
Mas, depois, “aprendeu que gozar as pessoas, ainda por cima a professora é mau, porque, depois, ele tem de levar os castigos”.
E esta é a mensagem que este fã retém, a par de outras menos didácticas servidas a toda a hora.
Exaustão na aula, depois de uma madrugada ao telemóvel
Os vídeos são como as cerejas. Cristina relata duas situações em que alunos de nove e dez anos de uma das suas turmas “adormeceram por exaustão… Eles relatam que estão a ver no telemóvel dos pais ou no tablet esse tipo de vídeos”.
“Se uma criança acorda a meio da noite e tem um tablet no quarto, se estiver sozinha, pode fazer o uso que quiser do tablet. Eles podem ter os headphones e ninguém se apercebe do que eles estão a ver”, acrescenta.
Para Cristina, o mais preocupante na ausência da regulação parental no consumo destes conteúdos é a ausência “de quem os ajude a terem um espírito crítico daquilo que eles estão a ver”.
“Eles estão a ter acesso a muita coisa que não controlam, não têm ninguém que os ajude a perceber se aquilo está certo ou se foi só uma brincadeira disparatada que nós também já tivemos quando éramos crianças”, remata.
[Transcrição integral de peça jornalística da Rádio Renascença (original em rr.sapo.pt) publicada em 14.10.21, assinada por Pedro Mesquita e André Rodrigues. Destaques, sublinhados e “links” meus. Corrigi a cacografia brasileira do original. Imagem/citação de Joker de: “Joker Quotes” (Facebook).]
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