AVISO: a linguagem contida neste “post”
pode ferir a susceptibilidade dos leitores
mais sensíveis (ou lá o que é)
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Dunning-Kruger effect, in psychology, a cognitive bias whereby people with limited knowledge or competence in a given intellectual or social domain greatly overestimate their own knowledge or competence in that domain relative to objective criteria or to the performance of their peers or of people in general. [“Encyclopedia Britannica“]
«O Efeito Dunning-Kruger, também designado por “sabedoria dos idiotas”, é uma distorção cognitiva que resulta da ignorância: pessoas que sabem pouco têm excesso de confiança nas suas competências e, nas decisões que tomam, cometem mais erros mas não conseguem reconhecê-los, achando que sabem tudo ou mais do que os outros, porventura mais bem preparados. A ilusão de superioridade não se deve ao conhecimento, mas sim à ignorância. Estamos diante de um paradoxo que os investigadores ilustraram da seguinte forma: “Se alguém for incompetente, não consegue saber que é incompetente.”»
Clara Soares, jornalista.
Revista “Visão”, 30.01.2021
«“A frequência de uso dos termos que designam os órgãos sexuais, tanto femininos como masculinos, é relativamente baixa. Palavras que designam o sexo são normalmente banidas da conversação entre gente educada”, escreveu Heinz Kröll em O Eufemismo e o Disfemismo no Português Moderno. Apesar disso, em português, parecem não faltar palavras para as descrever. Uma delas é caralho.»
«Apesar de não se saber ao certo de onde terá vindo a palavra caralho, pensa-se que terá tido origem no espanhol carajo, uma expressão que pode designar um pau ou uma parte específica de um navio — a vigia, o lugar mais elevado de uma embarcação. A palavra, “muitíssimo frequente na Península Ibérica”, pode ter “uma origem ainda anterior à romanização”, defende João Paulo Silvestre.»
“Língua Portuguesa: a curiosa origem dos palavrões e das asneiras“
© 2022 Vortex Magazine – VxMag – Dez 23, 2019 – Cultura
Já todos ouvimos, porque o “fenómeno” repete-se infindavelmente, alguém asseverar com inabalável convicção que o vinho português, o queijo português, o azeite português é “o melhor do mundo”. Até o “Sol português” é “o melhor do mundo”, o que não deixa de ser curioso porque assim se nacionaliza, de uma penada, a origem da vida, o Génesis, Apolo (ou Hélio), o esfíngico Rá e a estrela central de “um” sistema em volta do qual giram uns planetas e outras “coisinhas” do género; coisa pouca, portanto, isso “agora não interessa nada”, o Sol há-de ser por força “nosso” porque, para início de conversa, à excepção de todos os outros povos do mundo, nós somos os maiores, os melhores, os mais belos, sãos, saudáveis, honestos, cultos e escorreitos do Universo. Em suma, os melhores em tudo e pronto, não se fala mais nisso. Ele é a cortiça (rolhas e assim), o bacalhau (à Braz, que está na moda, ou à Gomes de Sá, esse genial coronel de 6 dragonas), o mármore (ó Estremoz, ó, mas quais Carrara quais carapuça), a INCM (os melhores selos do mundo, toma, toma), a numismática (dólares?, isso é trocos), o leitão da Bairrada, as queijadas de Sintra, o Grandjó (ó-ó, grande pinga, os franceses são uns toscos) e por aí fora, só maravilhas, os estrangeiros que nos visitam até ficam intimidados, tão esmagador é o colosso lusitano. Portugal é uma arca do tesouro com 561 por 218 quilómetros (e 1993 metros de altura, olha a Estrela, “a maior montanha”, pois claro) e aqui — apenas aqui — podem ser encontradas não apenas 7 mas pelo menos umas 70 maravilhas (fora o resto), o que é de longe record mundial, como também é evidente.
O bom povo português reconhece a si mesmo a paternidade de tais delírios laudatórios mas, ainda assim, convenhamos, de facto o fado português é o melhor fado do mundo, disso podemos ter a certeza absoluta, assim como o galo de Barcelos é também o melhor galo de Barcelos do mundo, há que reconhecê-lo, e outros exemplos deste tipo encontramos por aí aos pontapés — literalmente –, basta ir a uma praia com seixos ou topar com uma pilha de calhaus e chutá-los.
Digamos que, tentando formular o axioma, a quantidade e a intensidade dos panegíricos patrioteiros varia na razão directa da ignorância (ou da iliteracia ou da “falta de mundo”) de quem os emite. O entusiasmo pessoal, neste fenómeno arquetípico do português, manifesta-se por regra com um afã que paradoxalmente entronca na igualmente típica “admiração” tuga por tudo aquilo que é estrangeiro, o que se faz (e usa e come e bebe e escreve e até pensa) “lá fora”. Para os mesmos que asseveram militantemente a excelência do melão pele-de-sapo ou da caralhota de Almeirim, tudo aquilo que vem “lá de fora” é que é bom: jogadores de futebol, actores de tele-novelas, publicitários carapuceiros, evangelistas e carteiristas, cambistas e sambistas, se é estrangeiro então é do melhor que há — porque, dizem os mesmos do melão e da bifana em pão especial, “isto é uma choldra” e os (outros) portugueses são “todos uma cambada de” corruptos, ignorantes e saloios.
Infelizmente, nenhum dos grandes (ou pequenos) vultos da Antropologia teve tempo para estudar um fenómeno — o melhor fenómeno do mundo, escusado será dizer — que afinal define aquilo que é o “ser português” (ser enquanto substantivo, entenda-se, não verbo no infinitivo). Parece que fulanos como Lévi-Strauss ou Malinowsky, por exemplo, estiveram sempre muito ocupados a tratar de umas minudências, o que é incompreensível porque, caso algum deles soubesse sequer onde fica Portugal, devia ter cá vindo para estudar o dito fenómeno. Nem mesmo Desmond Morris, um beef estranhíssimo mais virado para a zoologia, a sociologia e a biologia, nem esse — que ainda hoje anda a visitar jardins zoológicos e recintos naturais de outros primatas — se deu à maçada de vir cá espreitar a macacada indígena.
Mas, váláver, o que tem este relambório todo a ver com o AO90? Bom, certo, falta uma peça: a “lei de Murphy“. Assim, com esta invariável, já deve chegar para qualquer matarruano entender que a ignorância, a bajulação, o primitivismo e, em suma, as punhadas no peito com urros em coro têm tudo a ver com a manobra tuga-zuca, com a aniquilação que os dois bandos pretendem.
O busílis da questão reside, essencialmente, na forma como estão a reagir e como poderão fazer doravante uns poucos frente aos tipos e famílias de primatas anteriormente referidos. A cadeia evolutiva preconizada por Darwin não colhe, neste particular, tão intrincada e confusa é a disseminação das sub-espécies de idiotas — entretanto cruzados com variantes exóticas (ou inqualificáveis) — e portanto há que ser-se assertivo nas acepções, exacto nas conclusões e, por fim e conseguinte, transparente quanto ao que há a fazer. Até porque a lei de Murphy é de facto infalível, com “os melhores do mundo” (e arredores) que em simultâneo adoram tudo aquilo que tresande a Brasil não se pode de todo contar — e das massas inertes, pela sua natureza, também não; algo irá fatalmente correr mal, disso podemos estar certos, mas nem a absoluta ausência de saídas airosas justifica a cobardia da desistência.
Mesmo ignorando pacifistas, bajuladores, brasileiristas, tachistas e paus-mandados, convenhamos que não se afigura nada fácil derrubar o muro de silêncio que todas essas variantes de Cro-Magnon construíram em volta de um tigre de papel. A política do facto consumado, base estrutural da governamental estratégia de estupidificação em massa, encontrou desde sempre aliados muitíssimo convenientes — alguns dos quais nem se apercebendo do que estão a fazer — e por isso andam há anos a arrolar colecções de “erros flagrantes” e de “aberrações”, passando assim a peregrina ideia de que bastaria “despiorar” o AO90 “corrigindo” esses erros e aberrações para que tudo voltasse a entrar nos eixos; desde que voltemos a ter recepções nos hotéis (em vez de “receções”), dizem, desde que se volte a contar com jogadores para o Benfica (que ninguém pára), dizem, desde que voltemos enfim a repor os C e os P nas palavras que no Brasil têm P ou têm C, ah, então pronto, maravilha, está resolvido o problema, já cá temos o “nosso” Português de volta.
Coligir aqui de novo todas estas patranhas e as de igual patrioteirismo (ou lá o que é) seria não apenas irritantemente repetitivo como insuportavelmente masoquista. De mais a mais quando, como já se experimentou e viu, nem fazendo desenhos alguns cromos entenderão seja o que for, porque não tencionam entender coisa nenhuma se dita ou escrita por outros que não eles próprios, os “génios” lá do bairro, e porque o que está a dar é fazer trabalho de revisão de texto pro bono para os acordistas de cá e, de caminho, entrar na senda da bufaria (bufos estes aos quais o Estado nem se dá ao trabalho de agradecer). Não esquecer que são eles mesmos os maiores do mundo, os melhores do Universo, escusado será dizer, cá está o efeito Dunning-Kruger definidor do “milieu” intelectualóide tuga. É de facto idiota presumir que um idiota alguma vez assumirá que não passa de um idiota.
No fim de contas, em síntese, o que está de facto em jogo resume-se em poucas palavras. Por exemplo, o título da entrevista seguinte diz quase tudo e Marcos Bagno diz o resto. Note-se que o canal em que isto passou é a TV Senado (do Brasil, evidentemente). Como se vê, os brasileiros sabem perfeitamente e aceitam com a maior das tranquilidades que a “língua universau” é a brasileira. Não há cá funfum nem gaitinhas.
Tomando de empréstimo a imortal expressão de José Milhazes, na sua dimensão mais profundamente filosófica, e atendendo às raízes não menos filosóficas da mesma expressão, enquanto estado de alma, que no fundamental enforma e informa o povo português, tudo se resume a uma frase clara e concisa: o AO90 que vá para o caralho.
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[Imagem do petisco almeirinense de: “Go Discover Portugal“.
Imagem de crânio de Cro-Magnon de: “The Smithsonian National Museum of Natural History”.]
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https://www.youtube.com/watch?v=jV_SdGnkoBU
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