Português do Brasil “é língua oficial de Portugal” e sobrepõe-se à nossa “frigidez sonora”
O director da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, José Manuel Diogo, diz que o português do Brasil “é verdadeiramente uma língua oficial de Portugal”.
O número de brasileiros que imigra para Portugal continua a aumentar. Em 2022, viviam em Portugal 233.138 brasileiros, mais 28.444 (13%) do que em 2021.
Nos últimos 12 anos mais de 391 mil brasileiros obtiveram a nacionalidade portuguesa. Trata-se da principal comunidade estrangeira residente no país.
Portugal é um país com pouco mais de 10 milhões de habitantes, dos quais 400 mil ainda não falam português — por serem bebés ou crianças demasiado pequenas.
É com base nestes dados demográfico que, num texto publicado na Folha de S. Paulo, o director da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira, José Manuel Diogo, escreve que “sem compromisso com o erro, o português do Brasil é verdadeiramente uma língua oficial de Portugal”.
O também fundador da Associação Portugal Brasil 200 anos sublinha que “simplesmente caminhando nas ruas”, o número de falantes de português do Brasil parece bem maior do que é na realidade.
“O balanço doce do português de Vinicius de Moraes sobrepõe-se à frigidez sonora dos conterrâneos de Pessoa e Saramago”, escreve José Manuel Diogo. “A vida acontece cada vez mais em ônibus que nos autocarros, e a frescura mata-se cada vez mais na geladeira que no frigorífico”.
Crianças e jovens usam cada vez mais expressões brasileiras, impulsionadas por influencers brasileiros do YouTube e outras redes sociais.
“A exponencialidade do aumento da ‘demografia brasileira’ em Portugal antecipa uma nova era normativa para a língua portuguesa”, prevê o português natural de Castelo Branco. “A nova proporcionalidade na convivência de falantes no território português confronta a língua e os seus estudiosos com uma necessidade de reinvenção —será esta a palavra certa?”.
Segundo o historiador e analista político brasileiro José Murilo de Carvalho, os estudantes e imigrantes do país sul-americano vêm para Portugal “em busca de emprego e de formação académica”.
No fim de Julho do ano passado, o SEF informou que tinha atribuído 133 mil novos vistos de residência a cidadãos estrangeiros nos primeiros seis meses do ano.
Os números avançados revelam que 47.600, mais de um terço, são imigrantes brasileiros. A fila de espera para novos vistos andará por volta dos seis meses.
[Transcrição integral de artigo publicado por
Geladeira ou frigorífico?
Sem exageros, aplicando apenas cautelosas matemáticas, poderíamos afirmar sem medo que a “turma” que fala brasileiro nas ruas das cidades e vilas portuguesas representa hoje mais de 10% dos falantes totais.
Mas, pegando um 99, ou apanhando um táxi, almoçando e jantando em restaurantes, comprando nas lojas, lendo em bibliotecas, aprendendo nas escolas secundárias, estudando nas universidades ou simplesmente caminhando nas ruas, o número parece muito maior.
O balanço doce do português de Vinicius de Moraes sobrepõe-se à frigidez sonora dos conterrâneos de Pessoa e Saramago. A vida acontece cada vez mais em ônibus que nos autocarros e a sede mata-se cada vez mais na geladeira que no frigorífico. O som e as palavras da língua “brasileira” expandem-se, na mesma proporção que na “portuguesa” encolhem.
A história mostrou-nos que, nas movimentações demográficas, sempre foi a hegemonia dos falantes por unidade geográfica que definiu idiomas, acentos e sotaques. A exponencialidade do aumento da “demografia brasileira” em Portugal antecipa uma nova era normativa para a língua portuguesa.
A nova proporcionalidade na convivência de falantes no território português confronta a língua e os seus estudiosos com uma necessidade de reinvenção.
Em uma primeira fase – já em curso – ela ocorre por apropriação de palavras e expressões brasileiras pelos portugueses, sobretudo por crianças e adolescentes. Mas brevemente, por imperativos de coabitação, será necessário definir-lhe um novo momento normativo.
Em uma conversa com a escritora, curadora e jornalista portuguesa Isabel Lucas, ela também antecipa este movimento, afirmando: “O futuro da língua portuguesa e a sua grande potência é o Brasil”. Precisará de Portugal?
*Presidente da Associação Portugal Brasil 200 anos
[Transcrição integral de artigo, da autoria de José Manuel Diogo, publicado pelo