Já nos vamos habituando, é verdade, mas não deixa de ser surpreendente que tanta gente decente ainda dê alguma espécie de crédito ao analfabetismo, à grosseria, à mitomania, ou seja, em suma, aos números circenses de muitos brasileiros em Portugal e de alguns portugueses apátridas que por aqui vegetam, uns e outros, todos trémulos e frementes, chorosos, largando baba e ranho por tudo quanto é pasquim, coitadinhos, a estalar de saudades da sua deles pátria. Aqueles porque foram violentamente forçados a imigrar, é claro, e como desde sempre terão sido os “colonos” portugueses a corrê-los do Brasil a pontapé, pelo que não tiveram alternativa a fazer o favor de vir para cá honrar-nos com a sua excelsa presença. E os tugazitos porque, apesar de serem brasileiros “adotivos” — aborrecidíssimos com a vidinha paupérrima que levam na “terrinha” onde por acaso nasceram –, fartam-se de trabalhar para a “causa” brasileirista, facilitando ao máximo a instauração do Estado europeu da sua querida República Federativa.
É de facto espantoso que alguém — e, ainda por cima, sabendo escrever e tudo — conceda o exorbitante crédito de rebater com argumentos técnicos, epistemológicos e históricos as asneiras monumentais de neo-imperialistas-lusófobos-acordistas. Mas enfim, parece que existem mesmo portugueses assim, de infinita pachorra, vá-se lá entender porquê e para quê.
Este artigo de opinião é o episódio mais recente de tão bizarra (e persistente) condescendência para com… errrr… enfim… não exageremos na adjectivação… idiotas chapados, vá.
Tudo o que diz Luís Reis Torgal aplica-se perfeitamente às bacoradas de um brasileiro qualquer (em artigo também aqui reproduzido), mas assim, ora bolas, respondendo com razões a perturbações como a paranóia ou a mania da perseguição, ou a ambas, já que uma integra a outra, bom, nesse caso lá se vão os argumentos racionais, então vale o bíblico aforismo atirar pérolas a porcos.
Que História? O colonialismo português ainda “persegue” as religiões afro-asiáticas?
Luís Reis Torgal
“Público”, 02.03.231. Sabemos que hoje a História faz parte também, no contexto de uma visão vaga e apressada do mundo e de um conhecimento que não tem por base o documento e a consciência do pretérito, de um grande chapéu-de-chuva que alberga todas as opiniões sobre o passado, o presente e até o futuro. Já lá vai o tempo, no nosso caso desde Herculano, em que se lutava por uma História objectiva, narrada e interpretada com base em fontes de toda a espécie, o que implica muito tempo de trabalho.
Todavia, há responsabilidades que não podem deixar de ser assumidas. Por isso este meu texto não visa tanto a jornalista do PÚBLICO, Ana Marques Maia, a quem parece dirigir-se, como o próprio jornal de que sou leitor de sempre e, por vezes (raras vezes), seu articulista, na qualidade de simples cidadão interventivo.
2. Na terça-feira de Carnaval, ao comprar o PÚBLICO, deparei-me logo, em chamada de primeira página no cabeçalho, com o seguinte texto: História. O colonialismo português ainda persegue as religiões afro-brasileiras. Logo fui ler o artigo. Em duas longas páginas ilustradas aí vem o texto da jornalista, encimado por pequenas letras a vermelho que podem passar despercebidas, com um texto mais esclarecedor: “Cultura: Intolerância religiosa no Brasil”.
A História é um processo científico que não pode jogar com a simples opinião, sobretudo quando ela é coada por um fotógrafo da National Geographic (instituição que me merece todo o respeito, mas que deve ser encarada como um magazine), Gui Christ, que vem reclamar — por certo com alguma razão — que no Brasil ainda se perseguem as religiões afro-brasileiras, citando concretamente o bolsonarismo e as crenças radicais contra essas religiões, mas também contra a religião católica apostólica romana.
Muito bem, mas atribuir isso à herança colonial, como também faz, é ultrapassar as raias da análise histórica tanto quanto possível rigorosa, pela falta de consciência do tempo. Não só porque na era da colonização e do “colonialismo” se tinha — apesar das alterações da Inquisição depois da reforma de Marquês de Pombal (1774) e da sua extinção em 1821 — uma visão bem distinta das religiões e das práticas de feitiçaria (não me refiro às religiões, mas, sobretudo, às simples práticas de bruxaria), que eram consideradas como falsas e punidas de forma exemplar, mas porque, formalmente, o colonialismo português terminou com a independência do Brasil em 7 de Setembro de 1822, ou seja, há mais de dois séculos.
Isto é, o que, aparentemente mas espectacularmente, parece, neste caso, ser imputado a Portugal deve ser afinal considerado em relação ao Brasil, que não conseguiu superar em séculos a tal “herança colonial”.
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