Dia: 14 de Junho, 2023

Nacionalizando o Padre Eterno

Considered one of the largest Warships built by Portugal, The “Padre Eterno” was built in 1663 (in the Colony of Rio de Janeiro, South America). Larger than any Warship afloat at the time, she displaced 2,000 tons and was 300 feet long. Her beam (height) stood at 35-feet. Sporting 144-guns (mostly heavy), “Padre Eterno” was tasked with protecting Portugal’s interests in not only South America, but The Caribbean. During her service, “Padre Eterno” fought many Pirate engagements (for those foolish enough to try her). In 1667 however, she was lost in a hurricane in The Indian Ocean.[“Stronghold Nation“]


Este artigalho do brasileiríssimo “Estadão” é uma pequena amostra do mais absoluto descaramento hiper-nacionalista que no Brasil se propaga rapidamente e que até por cá vai já infectando alguns tugas mais deslumbraditos, coitadinhos, com o seu deles mítico “gigante”.

Trata-se, poupando nas adjectivações, de pura e dura reescrita da História.

Vale tudo, para o efeito, a começar pela súbita e radical “nacionalização” de todos os portugueses “desde o século 16” (em língua brasileira não existe numeração romana) e de tudo aquilo que eles fizeram no Brasil. Não interessa para nada que fossem portugueses, nascidos em Portugal ou filhos e netos e bisnetos até à 20.ª geração de portugueses; segundo a extraordinária “lógica” da confraria dos becharas, se alguém pisa terras de Vera Cruz passa imediatamente a ser “brasileiro” e tudo o que ali alguém fizer (de bom, claro, porque todo o mal é culpa “do colonizador”) só pode ter sido feito por “brasileiros”. Até as referências ao período colonial são altamente enviesadas, sempre de raspão e passando por sistema grandes tangentes à verdade — o que importa é exacerbar a “paixão” nacionalista.

A “Passarola” de Bartolomeu de Gusmão. Construída antes de 1720. À popa, a bandeira Real portuguesa.

Já não basta o “brasileiro” Bartolomeu de Gusmão, esse grande herói nacional do país do Cárrrnáváu; vai tudo a eito: se nasceu lá, mesmo que tenha morrido um século (ou dois ou três) antes da independência, é brasileiro; e se por mero acaso não nasceu lá mas foi lá fazer alguma coisinha de jeito, então não só a pessoa como aquilo que ela fez é do mais brasileiro que há.

Claro que o Brasil não se tornou independente em 1822 nem nada, esse pormenorzito insignificante não convém à narrativa, aliás essas coisas de datas e factos (e História e assim) são como a língua: é muito complicada, só atrapalha, toca a “simplificar”, que é nossa (deles).

Portanto, está bem de ver, o “maior navio do mundo” foi não apenas “construído no Brasil” como também, evidentemente, foi desenhado, concebido e integralmente montado por brasileiros. “Prova” disso é o “fato” de o Padre Eterno (um nome tipicamente brasileiro, vê-se logo) ter atracado num qualquer “cais de Lisboa”, entre outros portos da Europa. Muito viajado, este “gigante dos mares” em duplo sentido: gigante porque o galeão é brasileiro, feito no Brasil por brasileiros, e gigante porque é assim que os confrades do lado de cá (casteleirenses) se referem àquilo: “eles são 220 milhões e nós somos só 10 milhões“.

Convém repetir, não vá ter escapado alguma coisa, como, por exemplo, que no século XXVII — enquanto o Padre Eterno estava a ser concluído — sequer estavam definidas as fronteiras daquilo que dois séculos mais tarde viria a ser o Brasil, mas isso que interesse tem, ora, ora, deixemo-nos de pormenores embirrantes.

Enfim, se calhar terão de ficar para outra ocasião os extraordinários feitos “da Marinha brasileira”. Esta do Padre Eterno, definitivamente, não cola.

Maior navio do mundo, no século 17, construído no Brasil – Mar Sem Fim

João Lara Mesquita
marsemfim.com.br

Maior navio do mundo, no século 17, o galeão Padre Eterno foi construído no Brasil

Na segunda metade do século 17 foi fundado um estaleiro situado na atual Ilha do Governador, onde hoje fica o aeroporto Antônio Carlos Jobim. Entre outros, ele colocou no mar o galeão Padre Eterno, o maior navio do mundo no século 17.

A fonte desta informação acima é o belíssimo livro A muito leal e heroica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro. A obra é assinada pelo historiador Gilberto Ferrez. Ele não só escreveu o texto e diagramou as páginas. Também selecionou as imagens e fez pessoalmente os contatos para obtê-las no Brasil e no exterior. A concepção foi do colecionadorRaymundo Castro Maya (O Estado de S. Paulo).” Foi editado em 1965 para comemorar os 400 anos da fundação do Rio de Janeiro.

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Nos séculos 17, 18 e 19, caçava-se baleias na Baía de Guanabara. Gravura de Leandro Joaquim (1738–1798).

Importância da obra

O livro é tão importante que, em 2015 houve uma exposição e reedição da obra. Sobre este evento escreveu o Estadão: “Ferrez usou imagens icônicas do Rio, de pintores do século 18 e 19, como Debret, Rugendas, Taunay e Victor Meirelles. Até fotografias de nomes pioneiros como o de seu avô, Marc Ferrez, cujo trabalho é um dos importantes da segunda metade do século 19.”

Uma destas gravuras é a que reproduzimos abaixo, mostrando o Padre Eterno. E prossegue o jornal: “Acontecimento editorial dos festejos do quarto centenário, uma época em que era parca a bibliografia sobre a cidade. O livro foi impresso em Paris.”

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O Padre Eterno (Gravura de A muito leal e heroica cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro)

Para quem quiser polemizar sobre número de tripulantes, que discuta com Gilberto Ferrez ou o inglês Charles Boxer, historiador, bibliófilo e professor de civilização portuguesa na London University. Autor, entre outros, de O Império Marítimo Português, 1415 – 1825‘, Edições 70. Gilberto Ferrez diz em seu trabalho sobre o Rio de Janeiro que “foi o professor inglês Charles R. Boxer quem descobriu este inédito. E provou numa conferência em Londres que o galeão foi construído na ilha do Governador.”

Maior navio do mundo, no século 17, ‘made in Brazil’

De acordo com este livro, ‘o Padre Eterno era um colosso: seis pontes (ou conveses), 180 escotilhas (o que quer dizer 180 canhões). Podia carregar até 4 mil caixas de açúcar de 680 quilos cada. Sua tripulação era de 3 a 4 mil homens’ (É isso mesmo que você leu: ‘de 3 a 4 mil homens’, apesar da informação parecer equivocada. Assim está no livro de Ferrez).

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A Praça XV e o Passo Imperial na visão de Jean-Baptiste Debret (1768 – 1848).

Outra obra aborda a construção de Padre Eterno

Outra, e mais recente publicação, o livro Escravidão, volume 1, de autoria de Laurentino Gomes, também aborda a construção do galeão Padre Eterno ressaltando sua enormidade, embora os dados não sejam iguais aos do primeiro. Segundo Laurentino, “o galeão Padre Eterno pesava 2 mil toneladas. Estava pronto para receber 144 canhões. E exibia um mastro colossal, feito de tronco de uma única árvore, medindo na base quase três metros de circunferência, o que significa que, para abraçá-lo, seria necessário que três homens fizessem um círculo de mãos dadas à sua volta.” Infelizmente, não há informações sobre a tripulação no trabalho de Laurentino.

Os ecos da construção do maior navio do mundo do século 17

Segundo Laurentino Gomes, “era um navio tão grande que especulações a seu respeito começaram a circular pela Europa antes ainda que deixasse o Rio de Janeiro. Em março de 1665, o jornal português Mercúrio Portuguez, de Lisboa, referia-se à construção, no Brasil, “do mais famoso baixel de guerra que os mares jamais viram”, despertando de imediato a curiosidade da comunidade diplomática local. Sete meses mais tarde, quando, finalmente, atracou no cais no rio Tejo, foi saudado com a seguinte notícia: ‘Veio nesta frota aquele famoso galeão… o maior que há hoje, nem se sabe que houvesse nos mares’.

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A igreja da Glória. Leandro Joaquim (1738–1798).

Uma capela dourada no maior navio do mundo

Prossegue o relato de Laurentino: “Parte dos equipamentos tinha sido cuidadosamente fabricada por artesãos coloniais fluminenses. Incluindo as madeiras entalhadas e uma deslumbrante capela dourada, que acusou a admiração de dois padre capuchinhos italianos que o visitaram mais tarde no cais de Lisboa. O restante viera da Inglaterra, que então já despontava como a principal potência marítima do planeta. Mas ainda não tinha um navio daquele tamanho. A maior embarcação inglesa da época, o SovereignoftheSeas, pesava 1,5 mil toneladas, um quarto menos que o galeão brasileiro.”

‘Proeza da engenharia colonial brasileira’

Laurentino Gomes: “Essa proeza da engenharia colonial brasileira estava destinada a ser uma espécie de Titanic do século 17, na comparação do historiador Luiz Felipe de Alencastro. Apesar de suas gigantescas proporções, teria um fim trágico ao naufragar no oceano Índico algum tempo depois de passar por Lisboa, inaugurando a sina que seu congênere britânico do século 20 repetiria cerca de 250 anos mais tarde.

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O Rio de Janeiro de Debret.

Mas sua existência era testemunho das ambições da elite escravagista brasileirano auge do ciclo do açúcar e às vésperas da descoberta do ouro em Minas Gerais. Estaleiros semelhantes aos da baía de Guanabara, responsável pela construção do Padre Eterno, funcionavam em vários pontos da costa brasileira.”

Salvador Correia de Sá e Benevides, o mandante da construção

Laurentino conseguiu identificar o mandante da construção. Para o autor de Escravidão, foi Salvador de Sá, também governador do Rio de Janeiro entre 1637 e 1661. “Um dos homens mais eminentes da história da escravidão no Brasil. Nascido no Rio de Janeiro em 1602, de mãe espanhola, filha do governador de Cadiz, Salvador de Sá pertencia à mais fina flor da aristocracia fluminense que emergia ao final dos dois primeiros séculos da colonização.”

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O Rio era uma beleza. Arcos, Leandro Joaquim (1738–1798).

Descendente de Mem de Sá

“Era descendente dos fundadores da cidade, Mem de Sá e Estácio de Sá. Seu pai, Martim de Sá, tinha sido governador da capitania do Rio de Janeiro por duas vezes.” Laurentino diz que Salvador de Sá foi um dos maiores traficantes de escravos de então.

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