Dia: 7 de Novembro, 2023

Zolgensma – PMF* (2.ª parte)

Depois das notícias sobre este assunto, o “Página Um” publicou uma peça complementando as informações veiculadas pelo “JN” e pelo “SOL”.

Trata-se de jornalismo de investigação, aliás a imagem de marca daquele jornal online, que ajuda os leitores a pelo menos entender, quando não a desmontar, aquilo que está em causa e que, por conseguinte, ou é pura e simplesmente omitido ou, como por regra sucede com a chamada imprensa “mainstream” (dita “de referência”, ou seja, a que distribui desinformação e propaganda paga pelo Estado), ocultado sob várias camadas de conversa fiada… e em “porrtugueiss universau”, ainda por cima.

De resto, qualquer cidadão — caso pretenda de facto manter-se informado — pode por si mesmo usar as ferramentas actualmente disponíveis para fazer não propriamente jornalismo, deixemos isso para os profissionais do métier, mas ao menos algum tipo de investigação. É com essa finalidade que, após a transcrição deste artigo do “Página Um”, encontra algumas pistas por onde poderá começar: uma pesquisa no “portal” governamental com um critério único poderá abrir caminho a outros tipos de busca (critérios múltiplos, sectoriais ou combinados) naquele “site” e, por outro lado, a pesquisa através do “motor de busca” mais universalmente utilizado serve como amostra de como os resultados não apenas variam (basta mudar da Google para a Bing, por exemplo), como podem até ser contraditórios entre si; depende de uma série de factores técnicos (e estes de variáveis induzidas, politicamente ou não). No fim, pode bem ser que o dito cidadão “investigador” acabe por descobrir e, se quiser, revelar dados surpreendentes.

Referência de destaque para o vídeo reproduzido no final deste “post”, o qual inclui gravações de matérias sobre o “caso das gémeas brasileiras” da CNN/TVI e da RTP.

Curiosamente, o autor do vídeo é brasileiro e ele mesmo declara coisas tão “espantosas” como “corrupção não é só no Brasil”. E a “bagunça por aqui” (em Portugal, claro). E “os hospitais aqui ’tá tudo parado”. E outras, muitas, de igual ou de ainda maior rigor… hmmm… terminológico.

Honra lhe seja feita, este brasileiro não tem papas na língua e não apenas não se arma em vítima, para variar, como chega a dizer aquilo que poucos, muito poucos, se atrevem em Portugal a sequer pensar.

Hospital de Santa Maria: Contratos do fármaco para tratar gémeas luso-brasileiras escondidos do Portal Base

“Página Um”, 05.11.23

A administração do Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte nunca registou as compras das duas doses de Zolgensma usadas para o tratamento das gémeas luso-brasileiras, que terão beneficiado de ‘cunhas’, conforme revelou na sexta-feira passadauma reportagem da TVI. Também a compra de outra dose, administrada num outro caso mediático em 2019, não se encontra referenciada no Portal Base. De acordo com uma análise do PÁGINA UM, o Estado já terá gastado 20,7 milhões de euros em 10 doses deste fármaco, mas os custos de terapias inovadoras já vão nos 46,7 milhões desde 2018, com a introdução de outro fármaco, produzido pela Biogen. Os dois fármacos estão, contudo, longe de se mostrarem milagrosos, somando já inúmeros efeitos secundários graves, incluindo mortes, que estarão a abrandar o entusiasmo no seu uso, ainda mais tendo em conta os preços milionários praticados.

O Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte – a empresa pública que gere o Hospital de Santa Maria – nunca registou no Portal Base as compras do fármaco onasemnogene para tratar em 2019 as duas gémeas luso-brasileiras e também a bebé Matilde, cujo caso espoletou uma enorme onda de solidariedade. O fármaco, comercializado sob a marca Zolgensma, tem vindo a ser usado como terapia genética para a atrofia muscular espinhal, sendo considerado um dos mais caros do Mundo. O custo por toma (única) ronda os 2 milhões de euros. O Conselho de Administração era então presidido por Daniel Ferro, que foi substituído em Fevereiro passado por Ana Paula Martins.

De acordo com a consulta do PÁGINA UM ao Portal Base, a primeira compra registada por um hospital português ocorreu apenas em 28 de Julho de 2020, ou seja, largos meses após o tratamento das duas gémeas e da bebé Matilde. Esta compra, realizada pelo Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte, não teve contrato escrito, mas terá sido para apenas uma criança, uma vez que o preço foi de 1.945.000 euros (sem IVA incluído). A justificação para a inexistência de contrato escrito, tendo a farmacêutica Avexis como adjudicatária, foi a “urgência imperiosa”. O prazo para a execução do contrato foi 157 dias, o que significa que a entrega do fármaco foi posterior a Julho de 2020.

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As gémeas luso-brasileiras Lorena e Maitê, agora com quatro anos, receberam terapia genética em 2019 num processo polémico. Contratos de aquisição não foram sequer registados no Portal Base. Foto retirada do Instagram dos pais, denominado ameemdobro.

Tanto esta compra como uma outra realizada pelo Centro Hospitalar Universitário de São João – pelo mesmo valor em Abril de 2021 – ocorreram antes da conclusão da avaliação do financiamento por parte do Infarmed ao fármaco inventado pela Avexis, que viria a ser comprada em 2018 pelo gigante farmacêutico suíço Novartis, e actualmente denomina-se Novartis Gene Therapies.

Com efeito, somente em 14 de Outubro de 2021, o regulador liderado por Rui Ivo Santos concluiu, apesar de reconhecer “o efeito benéfico” do onasemnogene, que “não existe demonstração de valor terapêutico em relação a um outro fármaco já no mercado, o nusinersen, comercializado sob a marca Spinraza. Este medicamento, produzido pela farmacêutica Biogen, foi o primeiro a obter autorização da Agência Europeia do Medicamento, em 2017, mas a frequência das tomas, depois das administrações iniciais, é de quatro em quatro meses.

Como cada dose de nusinersen tem um custo de cerca de 67 mil euros, o custo anual ronda os 200 mil euros, donde a médio prazo o Zolgensma acaba por ser mais económico. Aliás, na generalidade dos novos fármacos, o preço colocado pelas farmacêuticas é definido muito em função dos custos das alternativas terapêuticas ou nas poupanças em internamentos. Daí que o Infarmed tenha salientado que “o custo da terapêutica com Zolgensma (onasemnogeneabeparvovec) é inferior ao custo da terapêutica com nusinersen”.

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Hospital de Santa Maria lidera custos com terapias genéticas para a atrofia muscular espinhal.

Em todo o caso, já depois dessa decisão, que teve como consequência a possibilidade de o Estado comparticipar a terapia com o Zolgensma, de acordo com o Portal Base apenas foram adquiridas cinco doses deste fármaco, todas pela valor unitário de 2.069.947 euros (IVA incluído): três pelo Centro Hospitalar Universitário do Porto (duas em Maio e outra em Junho de 2022), outra pelo Centro Hospitalar de Gaia-Espinho (em Maio de 2022) e outra pelo Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (em Maio deste ano). Esta última compra de Zolgensma foi a única, até agora que teve contrato escrito.

Considerando as compras registadas por agora no Portal Base, o Estado português já gastou assim cerca de 14,5 milhões de euros na aquisição de sete doses de Zogensma, valor que sobe para quase 20,7 milhões de euros se se incluírem as duas doses administradas às gémeas luso-brasileiras e outra à conhecida bebé Matilde, agora com quatro anos.

Os custos nas terapêuticas para a atrofia muscular espinhal são, contudo, muito superiores, porque os gastos com a aquisição do primeiro fármaco (Spinraza, da Biogen), têm estado a aumentar. De acordo com o Portal Base, desde 2018 foram feitas 67 compras por diversas unidades hospitalares, com um custo total de um pouco mais de 26 milhões de euros. O Centro Hospitalar Universitário de Lisboa Norte é aquele que mais compras tem feito com 11,7 milhões de euros. Segue-se o hospital de Coimbra com quase 6,1 milhões de euros. (mais…)