Coimbra é um pagode (ou um samba)

director da Câmara Luso Brasileira de Comércio e Indústria Janja, Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique
Castelo de Belmonte (Portugal) Ministro português, bandeira do Brasil

«Portugal precisa de boa imigração e de investimento, do Brasil e dos países de língua portuguesa, da mesma forma que o Brasil e os outros países precisam de uma porta de entrada para um mercado europeu.»
«O primeiro-ministro português sabe isso e vai lutar na União Europeia por um regime especial para os cidadãos dos países de língua portuguesa, tentando aprovar – ou pelo menos permitir – a criação de uma primeira “cidadania da língua” na história universal.»

[José Manuel Diogo, C,C.I. L-B e APBRA200]
[post
«Portugal, um Estado brasileiro na Europa»]

 

Nasce em Coimbra casa para celebrar a língua portuguesa brasileira e falar de temas “desconfortáveis”

Casa da Cidadania da Língua foi inaugurada com a proposta de ser um espaço artístico e literário do idioma português brasileiro, mas também para debater temas como colonização, racismo e xenofobia.

Amanda Lima
“Diário de Notícias”, 13 Outubro 2023

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O coordenador José Manuel Diogo, o autarca José Manuel Silva e o presidente do Senado federal brasileiro, Rodrigo Pacheco, inauguraram o espaço na Alta de Coimbra.

Não há uma língua portuguesa, há línguas em português”, já dizia o escritor José Saramago. Décadas depois de uma das frases que mais resume[m] o idioma, Portugal passa a ter um local que celebra a complexidade e riqueza da língua portuguesa brasileira, mas também dos seus mais de 260 milhões de falantes pelo mundo. Fica na Alta de Coimbra, no prédio histórico da Casa da Escrita.

O local, por si só, já possui uma tradição literária, tendo abrigado variados escritores portugueses. “Esta já foi uma casa de cidadania, de literatura e de luta antifacista[sic] contra a ditadura”, lembrou José Manuel Silva, presidente da Câmara Municipal de Coimbra, durante a inauguração oficial, ocorrida na quinta-feira.

A programação arrancou com actividades de literatura, arte e música representados por artistas de pelo menos três países da lusofonia. A proposta é que todas as actividades desenvolvidas no local tenham a presença de pessoas de todos os países que possuem o português como um dos idiomas oficiais.

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Rute Simões Ribeiro, Simone Paulino, Luiza Romão e Raquel Lima protagonizaram a primeira mesa literária da nova casa

O trabalho de curadoria será realizado por seis pessoas de Portugal e do Brasil, que prometem trazer vozes de Angola, Cabo Verde, Moçambique, entre outros. Para o curador brasileiro André Augusto Diasz, o local simboliza “uma outra forma de conviver, de se relacionar, de viver, em sua dimensão mais ampla, uma cultura forjada na língua portuguesa” brasileira.

Se conviver e se relacionar é uma proposta da Casa da Cidadania da Língua, temas que dizem respeito aos laços históricos que unem os povos não ficam de fora. Segundo José Manuel Diogo, coordenador do espaço, temas “desconfortáveis” serão debatidos. “Vamos falar de racismo, de xenofobia, das consequências da colonização que vemos até hoje. Acreditamos que o conhecimento é o melhor antídoto contra o ódio e aqui vamos produzi-lo ao mais alto nível, não queremos que as pessoas se sintam desconfortáveis com isso”, explica.

No discurso de inauguração, o presidente do Senado Federal do Brasil, Rodrigo Pacheco, disse que a cidadania “não é, nem nunca será, um muro entre os povos”. Acrescentou que a língua portuguesa brasileira “não legitima discriminação ou preconceito, segundo critérios de alfabetização, acentos, ou ajuste à norma culta“.

A primeira mesa literária, mediada pela editora Simone Paulino, já mostrou a que veio, com o título “Dicções de uma escrita feminista”. Três jovens autoras foram convidadas: a brasileira Luiza Romão, a angolana Raquel Lima e a portuguesa Rute Simões Ribeiro. Raquel afirmou que o idioma hoje “apresenta uma hierarquia entre os falantes, dando o exemplo dos estudantes estrangeiros que chegam a Portugal, mesmo em Coimbra, e não são considerados da mesma forma”.

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A Casa da Escrita acolhe agora o espaço de celebração da lusofonia e da riqueza da língua.

Luiza, vencedora do Prémio Jabuti, o mais importante da área no Brasil, afirmou que uma das principais motivações da sua escrita é a inquietação com temas das mulheres, que em outras épocas foram vozes ainda mais silenciadas na literatura. Já Rute, que acaba de vencer o Prémio Hugo Santos, exaltou a inauguração da Casa em Coimbra, cidade em que nasceu e que acredita ser um bom local para as discussões de vozes que nem sempre são ouvidas.

Livros mais acessíveis

Uma das iniciativas da Casa da Cidadania da Língua é ter um selo editorial oficial, que permite a impressão através do método ‘print on demand’, em parceria com gráficas sediadas em Portugal. Na prática, significa que livros de autores e autoras da língua portuguesa brasileira poderão ser impressos em 48 horas com um preço mais acessível.

José Manuel Diogo estima que obras literárias de 100 páginas, por exemplo, custarão menos de 10 euros. “O problema da importação de livros hoje é o alto custo, resolvemos com tecnologia e quem escreve ainda ganha mais”, ressalta.

Na própria Casa já existe uma biblioteca com mais de cinco mil exemplares, incluindo parte da biblioteca do escritor português Eduardo Lourenço, falecido em 2020. Os livros estão disponíveis para consulta gratuita nas salas e a ideia é ampliar o acervo.

Para os próximos meses, também estão confirmadas duas residências literárias de três semanas cada. A primeira convocação está prevista para Janeiro de 2024. Uma delas terá a particularidade de ser dedicada a escritores seniores e mais detalhes serão revelados em breve. Estão ainda programadas ao menos seis exposições artísticas anuais.

A primeira delas, já inaugurada, é denominada “Real imaginário” e apresenta o trabalho do actor e pintor brasileiro Chico Dias. A programação de abertura contou também com o concerto “Na ponta da língua”, do músico brasileiro Zeca Baleiro e participação especial do cantor e autor português Sérgio Godinho. A Casa da Cidadania da Língua está aberta ao público de segunda a sexta, das 09.00 às 12.30 e das 14.00 às 17.30, com entrada gratuita. As próximas programações especiais serão anunciadas no site da instituição.

[Transcrição integral. Destaques e “links” meus. Cacografia brasileira corrigida automaticamente.
Corrigi manualmente alguns erros de Português e também a designação “língua portuguesa”
nos casos em que se trata de pura apropriação cultural e, portanto, é abusiva.]

Embora o artigo do “DN” transcrito já tenha uns meses desde que foi publicado na edição do jornal em papel, parece-me justificar-se apenas agora a sua reprodução, não apenas por uma questão de “timing” como também — ou principalmente — porque as informações dele constantes vêm consolidar o entendimento dos acontecimentos que nos últimos dias têm ocupado a agenda mediática.

Fica assim mais facilmente entendível a lógica do encadeamento entre alguns episódios mais recentes (a “Casa da Cidadania” em Coimbra, a cidadania “online”, a ponte aérea, a condecoração de Janja da Silva, os 4 milhões gastos em Zolgensma) e outros mais antigos (o doutoramento de Lula da Silva por Coimbra, as queixas de “racismo e xenofobia“, a vitimização sistemática, a “adoção” forçada da língua brasileira).

Se bem que desde há muito esteja perfeitamente delineado (e entendido) o plano de anexação do 28.º Estado brasileiro, não deixa de ser curioso que a mesma cidade Capital dos séculos da Fundação de Portugal esteja agora transformada na capital oficiosa da mais recente província brasileira.

Não merecia Coimbra tão fatal, tão triste fado.

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