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“Whiskas saquetas”, Margarita

Ora, para alguém que está enterrada até acima do pescoço, ao serviço dos interesses brasileiros, na profissão de demolição da Língua Portuguesa, isto é doentio, é grave, é de facto uma patologia mental. [post “Margarita no sofá“]

E cá está ela novamente, desta vez aproveitando a boleia de uma moçambicana “ligeiramente” anti-portuguesa. Aliás, o tom sinistro de indisfarçável lusofobia perpassa pela verborreia de ambas estas mulheres com uma subtileza equivalente ao bocejo do hipopótamo.

De entre o chorrilho de enormidades, para não variar do seu estilo carroceiro, a “presidenta” do IILP esparrama nesta “local” do DN, por entre inúmeras passagens com a escova da bajulação ao Itamaraty, as suas “ideias” para que (ainda) mais fácil e rapidamente o seu querido Brasil tome conta disto tudo, de uma vez por todas. Parece um ‘cadinho aborrecida, porém, dado o facto — para ela, de todo intolerável — que Moçambique (além de Angola, como sabemos) ainda não tenha “adotado” o Brasileiro como língua oficial.

E que e que e que, blábláblá, Whiskas saquetas. Todo o palavreado do artigo, de cabo a rabo, é absolutamente insuportável. Transcrever esta abjecta porcaria já foi sacrifício suficiente, seja pelas alminhas, não vou agora citar ou destacar pedaços da asquerosa prosa, livra, que nojo.

Ora aqui está um caso flagrante em que se aplica o aforismo sobre a melhor forma de pegar num pedaço de esterco pelo lado limpo. Quem for capaz de tal proeza, pois então faça o favor de ler. Não se aprende nada, evidentemente, mas convém munir-se a gente de pelo menos alguns conselhos sensatos, como o de Sun Tzu (543-495 a.C.): “Keep your friends close and your enemies closer”.

A descolonização da língua portuguesa

Margarita Correia
29 Maio 2023

O discurso de Paulina Chiziane aquando da entrega do Prémio Camões desencadeou notícias e ondas de choque nas redes sociais, provando a importância e o impacto dos temas que abordou, que são daqueles que mexem com as pessoas e carecem de análise e discussão. Não pude ouvir o discurso em directo e não o encontrei na Internet; é no que vou lendo e na minha experiência que baseio a reflexão que aqui trago. Ao falar da necessidade de descolonizar a língua portuguesa, a autora deu exemplos da descrição de conceitos ligados à vivência africana recebiam em dicionários de língua. Ainda que o tópico seja relevante e preocupação constante de fazedores de dicionários e boas editoras, a questão da descolonização da língua não se circunscreve a esta espuma linguística e é bem mais funda.

O Brasil foi a primeira colónia a tornar-se independente, em 1822, em condições muito especiais. O processo de descolonização da língua portuguesa tem decorrido no país, mas não estará completamente concluído, segundo alguns – e.g. a norma escrita culta, especialmente a do mundo das apostilas para exames, parece estar desfasada e ainda muito dependente da norma portuguesa. Pela sua dimensão, o Brasil é hoje uma superpotência em termos de produção e edição (literária, científica, pedagógica, noticiosa, etc.), feita na sua própria variedade nacional, a variedade brasileira do português. O Brasil tem os seus próprios dicionários, gramáticas, pensamento linguístico, a sua terminologia, instituições reguladoras, investimentos na área, as suas política e planificação linguísticas mais ou menos claras. Pode fazer melhor? Pode, sim, mas a verdade é que faz muito, não depende dos demais estados de língua portuguesa e não surpreende a preponderância que tem vindo a ganhar no nosso espaço. A situação de Portugal a este nível pode ser explicada pela pequena dimensão do país, o proverbial atraso educativo que tem vindo a ser debelado nas últimas décadas, mas também pela falta de políticas e planificação linguística adequadas, pelos compromissos com a UE (e.g. a bibliometria) e, lastbutnotleast, pela mania de sermos “geneticamente poliglotas” e “falarmos bem estrangeiro”.

Foram os países africanos de língua portuguesa que tomaram a decisão de a adoptar como língua oficial (de estado, administração, ensino) e também de unidade nacional; lideranças de movimentos de libertação e elites desses países fizeram a sua formação em português, muitas em Portugal; a adopção da língua resultou, assim, em factor de discriminação entre os cidadãos desses países que a domina(va)m e os que não. Em Timor-Leste, a língua portuguesa foi entendida também como factor de identidade nacional; a sua adopção em 2002 deixou de fora os jovens que, à data, haviam sido escolarizados em língua indonésia.
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Margarita no sofá

Sofá… de psiquiatra, não de psicólogo. Evidentemente, confundir um cientista profissional com um amador de coisinhas esotéricas é algo parvo; o psiquiatra está para o psicólogo assim como CR7 está para um apanha-bolas: até pode suceder que, por excepção extraordinária, algum dos garotos que vão buscar o esférico às bancadas chegue a profissional, mas até lá ainda vai ter de comer muita relva. Bem, adiante, não nos emaranhemos em trapalhadas sobre estofos.

Se bem que, na verdade, também seja uma questão de estofo, isto é, de tê-lo ou não tê-lo, aquilo de que se trata no conteúdo deste textículo, da autoria de uma pessoa que até nem ganha nada à conta do AO90 e que até nem interesse nenhum em continuar a ter emprego por via do estropício, é tentar convencer as pessoas normais de que estão a precisar da “ajuda” de um profissional, ou seja, que os anti-acordistas estão contra o dito porque… são uma cambada de destrambelhados. Gente avariada da caixa dos martelos, por conseguinte, o que contrasta, na nada douta opinião da senhora, com o perfil de urbanidade e fino gosto que atribui por inerência (e mandato divino) a acordistas como ela e outros desequilibrados em geral.

Esta técnica de intoxicação política e de silenciamento da dissidência, gravando na testa de qualquer renitente o rótulo de “louco”, era o método privilegiado de aniquilação da dissidência em prática na ex-União Soviética, por exemplo. Citando, também por exemplo, o “opinion maker” e comentador Pacheco Pereira: «A dissidência era considerada uma doença mental no período de Brejnev e este argumento soviético é hoje muito usado no mundo do ataque pessoal da direita radical [“Público”, 19.06.21]

O artigalho agora transcrito (conservei nesta transcrição a cacografia brasileira do original, para não amenizar de forma alguma o nojo que provocam as baboseiras tresloucadas da amanuense acordista) é uma retumbante demonstração de que a técnica soviética (e chinesa e fascista e nazi) do silenciamento pelo “internamento” existe ainda, está pujante em algumas cabecinhas — de extrema-direita ou de extrema-esquerda, por igual — para as quais os motivos são sempre uma maçada, as razões um sacrifício intolerável, a verdade algo de odioso e sumamente insuportável.

À laia de troca de cumprimentos, devolvo a “recomendação”: esta fulana deveria procurar ajuda especializada, pois sim, ela sim, mas que ao menos nisso se abstenha do amadorismo a que está obviamente agarrada. Consulte um psiquiatra a sério, não um psicólogo a brincar. O seu caso é sério, qualquer leigo em matéria de medicina psiquiátrica poderá constatar (e até diagnosticar) facilmente o que se passa consigo.

Basta ler algumas frases suas, alucinações como esta: 《se querem “combater” a “invasão” do português do Brasil, produzam conteúdos atractivos e de qualidade em português de Portugal》.

Portanto, admite que a invasão está em curso e reconhece que existem duas línguas diferentes e não a “língua universáu”, uma invenção.

Ora, para alguém que está enterrada até acima do pescoço, ao serviço dos interesses brasileiros, na profissão de demolição da Língua Portuguesa, isto é doentio, é grave, é de facto uma patologia mental.

O sofá espera-a. As melhoras.

«Margarita Correia é doutora em Linguística Portuguesa pela Universidade de Lisboa, tendo-se especializado nos estudos do léxico. Actualmente é professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigadora integrada no Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), onde coordena o grupo de Léxico e Modelização Computacional. Coordenou a realização do Vocabulário Ortográfico do Português (VOP) e, com José Pedro Ferreira, o Lince – Conversor para a nova ortografia. Garante a coordenação científica do Portal da Língua Portuguesa.» [Webinars da DGEDA]

Linguística para psicólogos. Precisa-se.

 

Margarita Correia

www.dn.pt, 13.09.21

A palavra “terapia”, proveniente do grego “therapeia“, é usada em diferentes áreas de conhecimento e na língua corrente, significando, de acordo com a Infopédia, “meio ou método usado para tratar determinada doença ou estado patológico; tratamento; terapêutica”. Há atualmente terapias para todos os gostos: e.g. familiar, sexual, da fala, do casal, de grupo, psicoterapia, isto para ficarmos só no âmbito da psicologia. A necessidade de terapia pressupõe a existência, no indivíduo ou no grupo, de um distúrbio, doença ou patologia.

A Notícias Magazine publicou, a 26 de agosto, uma reportagem intitulada “O Brasil está a invadir o vocabulário dos mais novos”. A escolha das palavras nunca é inocente, pelo que o título da peça deixa antever uma opinião (muito) negativa relativamente ao fenómeno tratado. Olhando para algumas das aceções de “invadir”, vemos que significa “1. entrar pela força; irromper; 2. MILITAR tomar ou ocupar militarmente um lugar ou território; 3. penetrar de forma hostil ou intrusiva em; 4. infestar”. Desconfiamos que a escolha da autora da peça visou expressar a opinião generalizada das pessoas com quem conversou sobre o assunto, que olham para o fenómeno com desagrado, preocupação, hostilidade e, claro, medo, muito medo. Fez, portanto, bem em utilizar o verbo “invadir”, não tanto por ser descritivo do fenómeno, mas sim da visão predominante que encontrou.
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Margaritês para totós

«Margarita Correia é doutora em Linguística Portuguesa pela Universidade de Lisboa, tendo-se especializado nos estudos do léxico. Actualmente é professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigadora integrada no Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), onde coordena o grupo de Léxico e Modelização Computacional. Coordenou a realização do Vocabulário Ortográfico do Português (VOP) e, com José Pedro Ferreira, o Lince – Conversor para a nova ortografia. Garante a coordenação científica do Portal da Língua Portuguesa.» [Webinars da DGEDA]

Desta vez, “nossa” Margarita brinda-nos, fazendo gala da sua habitual pesporrência, com “descobertas” traduzidas em formulações que certamente a autora julgará serem, no mínimo, geniais; como, por exemplo, esta verdadeira pérola de cultura: «a maioria das ofertas de trabalho não são publicadas em inglês, mas nas línguas nacionais de cada país».

‘Margarita Correia, professora auxiliar da Faculdade de Letras de Lisboa e investigadora do ILTEC-CELGA. Coordenadora do Portal da Língua Portuguesa. Entre outras obras, publicou Os Dicionários Portugueses (Lisboa, Caminho, 2009) e, em co-autoria, Inovação Lexical em Português (Lisboa, Colibri, 2005) e Neologia do Português (São Paulo, 2010). Mais informação aqui. Presidente do Conselho Científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP) desde 10 de maio de 2018. Ver, ainda: Entrevista com Margarita Correia, na edição número 42 (agosto de 2022) da revista digital brasileira Caderno Seminal.’

in Ciberdúvidas da Língua Portuguesa, https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/autores/margarita-correia/15/pagina/1 [consultado em 27-06-2023]

Fantástico. Parece que afinal um doutoramento (ou até dois) não é coisa que se deite fora sem mais aquelas, de vez em quando as estopadas (ou estuporadas) horas de biblioteca podem dar um jeitão para, por exemplo, chegar a conclusões assim e conduzir a descobertas que nunca tinham ocorrido a ninguém. Aliás, naquilo que tange à descoberta de coisas absolutamente inéditas, há que reconhecê-lo, estamos perante uma verdadeira autoridade na matéria; até em termos editoriais, digamos, como pode ser aferido pela extraordinária descrição aposta por um pretenso leitor a um dos livrinhos de Margarita, aquele que dá pelo nome de “Dicionários Portugueses“: «Um pequeno livro que nos dá a conhecer o mundo fantástico das colecções de palavras alfabeticamente organizadas.» Lá está, até parece plágio e tudo, este “leitor” copia literalmente — e por antecipação, o que é ainda mais extraordinário — o adjectivo que inicia este parágrafo. É mesmo fantástico, vejamos, isto dos dicionários serem colecções de palavras alfabeticamente organizadas é um achado, nunca semelhante coisa ocorreu a mais ninguém nem hoje em dia nem “aqui há atrasado”.

Não estraguemos, porém, o imenso prazer que seguramente experimentarão os leitores fiéis de Margarita. Até porque, à semelhança do que sempre acontece com os seus (lá está, toca a repetir de novo) fantásticos textos, também por este, em concreto, perpassam, vibrantes de sageza, frementes de acuidade, outras ideias inovadoras, umas percentagens surpreendentes e até mesmo, como brinde, incursões pelos áridos terrenos da inteligência em geral e da artificial em particular.

É ler, é ler. É embasbacar, é embasbacar.

Tanto o incipit como o explicit são do melhorzinho que anda por aí mas, cá p’ra mim, devo confessar, o que mais me toca, salvo seja, é a frase de desfecho: «Dominar várias línguas vale a pena. E continuará a valer.»

Eish. Não fazia a menor ideia destas coisas, ambas as duas em simultâneo. Isto, verdadeiramente, merecia honras de Panteão Nacional. Ou que Marcelo, esse brasileirista declarado, a condecore com a Ordem de Mérito Cultural; pois merece, emparelhando nas pendurezas com a brasileira Janja, outro colosso cultural que o mesmo fulano agraciou.

Mas que maravilha de texto, ó Margarita. Estou varado.

Conhecimento de línguas e mercado de trabalho

Margarita Correia
www.dn.pt, 26.06.23

Foi publicado a 14 de Junho, pela OCDE, o estudo A procura de competências linguísticas no mercado de trabalho europeu: evidência a partir de anúncios de emprego online. O trabalho foi desenvolvido nos 27 países da UE e no Reino Unido (RU), com dados de 2021, e analisa os requisitos de competências linguísticas, com destaque para inglês, alemão, francês, espanhol e chinês. O documento merece leitura atenta, especialmente por parte dos decisores políticos em linguística e educação; aqui apenas poderei partilhar algumas informações de interesse geral.

Uma das principais conclusões é a de que a Europa continua a ser um mercado de trabalho linguisticamente diversificado e que quem procura emprego num determinado país tem de dominar a(s) língua(s) usada(s) nesse contexto. Em média, nos países da UE e no RU, mais de 10% dos anúncios requerem explicitamente competências em línguas que não a(s) do país; em França e na Alemanha, esses valores ascendem a 45% e 32%, respectivamente. Na Áustria, Bélgica, Dinamarca, Hungria, Itália, Países Baixos, Portugal e Suécia, mais de 15% dos anúncios requerem competências em pelo menos uma língua diferente daquela em que o anúncio é redigido.
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Tanto mar que separa a gente, cara

Nem vale a pena gastar tempo e feitio a comentar mais este folheto propagandístico.

Na transcrição do textículo inseri algumas ligações a posts anteriores, com citações apensas. Isto deve chegar e sobrar para “comentar” aquilo que já foi por diversas vezes aqui comentado e outras tantas documentado: existem portugueses que — literalmente — trabalham para o Brasil. Correndo as despesas por conta do Estado português, evidentemente. Portanto, à custa de todos nós.

TANTO MAR | Encontros com Alexandra Pinho

SESC – São Paulo (Brasil), 01/06/2023

DIRETORA DO INSTITUTO CAMÕES, ALEXANDRA PINHO NAVEGA PELAS SEMELHANÇAS E PELO OCEANO DE DIVERSIDADE QUE FORTALECEM A CONEXÃO ENTRE BRASIL E PORTUGAL

POR MARIA JÚLIA LLEDÓ

Para além da revisão histórica que vem atualizando as relações entre o Brasil e outros países lusófonos com Portugal, pontes vêm sendo criadas por uma frutífera produção cultural. A língua portuguesa, em toda sua diversidade e plasticidade, é o oceano pelo qual navegamos. Conselheira cultural na Embaixada de Portugal no Brasil, Alexandra Pinho ocupa, desde 2018, a direção do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, em Brasília, onde atua na promoção do diálogo entre os países por meio de ações culturais.

Lula da Silva “Doutor” Honoris Causa pela Universidade de Coimbra — Março 2011

Um trabalho realizado em conjunto com instituições públicas e privadas não só para a valorização e difusão da língua portuguesa, mas também para a produção de conhecimento e fomento cultural. “Eu olho para o Brasil e vejo um país vastíssimo, construído com muita diversidade, com várias identidades que se cruzam e, portanto, o primeiro grande desafio é procurar entender a melhor forma de cooperação nas diferentes áreas geográficas, e como podemos estar presentes sempre em parceria”, explica a diretora do Instituto Camões.

Neste Encontros, Alexandra Pinho, que é licenciada em línguas e literaturas modernas pela Universidade de Coimbra, e mestre em estudos alemães pela Universidade Nova de Lisboa, aborda o reconhecimento das diversidades culturais que abraçam a língua portuguesa, reflete sobre as conexões entre Brasil e Portugal e mira novos caminhos à vista.

PRÊMIO CAMÕES

O galardão mais importante das literaturas em língua portuguesa é um prêmio binacional, ou seja, é dado pelo Brasil e por Portugal de forma absolutamente paritária e, em 2019, como sabemos, Chico Buarque foi o escritor, cantor, compositor escolhido, mas não foi possível chegarmos à cerimônia de entrega do diploma [quatro anos depois, em 23 de abril de 2023, Chico Buarque recebeu o prêmio em cerimônia realizada em Lisboa]. Neste último 5 de maio, ocorreu a entrega do Prêmio Camões à querida Paulina Chiziane, galardoada de 2021. Trabalhei cinco anos como diretora do Camões em Maputo [capital de Moçambique, no leste do continente africano] e tive a oportunidade de conhecer Paulina, a primeira mulher moçambicana negra a receber este prêmio. Uma mulher que é um exemplo, sobretudo para as meninas em Moçambique, ao mostrá-las a possibilidade da emancipação. É muito importante que haja esse reconhecimento público daquilo que significa termos figuras nos diferentes países de língua portuguesa que nos representam, criam pontes e estão presentes em várias gerações. São pessoas que nos ajudam a compreender melhor o lugar onde estamos e a olhar também para o outro.

PELA COOPERAÇÃO

O Instituto Camões tem três pilares de atuação. Um na área da cooperação, que tem na Agência Brasileira de Cooperação (ABC) a sua congênere mais direta – e estamos a falar de cooperação para o desenvolvimento, em especial atenção para os Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP), mas também Timor Leste [único país lusófono do continente asiático], nas áreas, sobretudo, de educação, saúde e cultura. Temos uma segunda vertente de atuação na área da língua portuguesa, tanto no que diz respeito à difusão da língua em países que não falam português, quanto na formação de professores nos países de língua portuguesa em África e Timor Leste, bem como uma atuação muito especial no Brasil através da rede de Cátedras Camões. O terceiro pilar é a cultura, que é transversal aos outros dois pilares. Eu olho para o Brasil e vejo um país vastíssimo, construído com muita diversidade, com várias identidades que se cruzam e, portanto, o primeiro grande desafio é procurar entender a melhor forma de cooperação nas diferentes áreas geográficas, e como podemos estar presentes sempre em parceria, e da melhor forma, tanto em São Paulo quanto em Sergipe, em Belém e outras cidades. Assim, a atuação [do Instituto Camões] no Brasil está muito ligada à vertente da língua portuguesa enquanto língua que nos ajuda a compreender o mundo e a produzir conhecimento.

[vídeo]
Podcast realizado em abril de 2023, com mediação de Thaís Heinisch. Edição: Tiago Marinho

COMO ONDAS

Eu vejo [as aproximações culturais entre Brasil e Portugal] como as ondas do mar: às vezes chegam mais perto, e às vezes afastam-se um pouquinho, mas o mais importante é sabermos que as ondas existem constantemente, que esse mar está lá e que é para ele que importa olhar, e não necessariamente para momentos específicos. Evidentemente que temos que estar atentos ao momento, e ele é fundamental, mas aquilo que para mim é um grande ensinamento ao longo destes anos no Brasil é que, de fato, há um fluxo permanente que não pode ser mensurável. A grande questão é não pensarmos que já vimos tudo. Isso eu acho que é fundamental para mim: perceber que conheço alguma coisa, mas tem muito para continuar a conhecer. Essa continuidade de troca, esse permanente olhar, é muito relevante.

PERTO E LONGE

Quando cheguei a Praga [capital da República Tcheca], onde também trabalhei, efetivamente tive a noção do que é estar num país estrangeiro, de uma língua que é uma barreira até conseguirmos nos comunicar, de uma base cultural bastante distinta. No Brasil, não é assim. Quando visitei Minas Gerais, a imagem mais forte é a chegada a Ouro Preto, que tanto se assemelha com a paisagem do norte de Portugal. É a mesma, mas é diferente. E eu acho que é essa tensão, essa aproximação e, ao mesmo tempo, essa diferença que é tão enriquecedora para nós. Acho que também por isso os brasileiros se sentem tão acolhidos ou querem ir a Portugal. Porque, de fato, não há esse estranhamento inicial, esse choque e barreira. Essa diferença vai se tornando clara à medida que dialogamos, que vemos, que conhecemos, que procuramos entender o lugar onde estamos.

REVISÃO HISTÓRICA

Há agora uma questão muito importante, de olhar para a África, a África independente, os países independentes, os países que têm seu lugar, sua voz, seu destino nas mãos. Isso é um processo que está em curso em Portugal e que significa revisitar a nossa história. Nem sempre é um caminho de progresso, às vezes temos que parar, refletir, aprofundar e perceber o que é que estamos a fazer. Por exemplo, a importância do teatro na programação do Mirada [Festival Ibero-Americano de Artes Cênicas, cuja sexta edição foi realizada pelo Sesc São Paulo, em setembro passado], ao trazer grupos como o Teatro do Vestido, que refletem de uma forma sistemática sobre a questão colonial, a herança colonial. É fundamental que seja apresentado em Portugal, e várias companhias têm feito esse trabalho para trazer alguma proximidade com este assunto, e que não seja apenas colocado na esfera política, mas também possa ser sentido. A arte, a cultura, nos ajudam a pensar e a sentir.

PELA MÚSICA

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Falar margaritês ou Português, eis a questão

Falar ″brasileiro″ ou falar ″americano″, eis a questão!

Margarita Correia
www.dn.pt,22.11.21

 

Até aos 10 anos, vivi num ambiente linguístico peculiar. Os meus pais, portugueses emigrados na Venezuela, falavam um registo de contacto entre português e espanhol; a minha madrinha, brasileira do Nordeste emigrada na Venezuela, falava o seu registo de contacto. Não sei ao certo qual terá sido a primeira língua que falei, ou qual registo, mas sei que, aos 5 anos, fui alfabetizada em espanhol, língua que desde então tenho a certeza de falar. Entre os amigos da família havia falantes de português (portugueses e brasileiros, com vários sotaques) e falantes de castelhano (venezuelanos, espanhóis, cubanos, colombianos…), de galego, catalão, basco, de italiano, eu sei lá! Entre as colegas de escola havia quem falasse alemão, francês, inglês, iídiche. Cresci no meio de uma grande algaraviada! O resultado foi eu hoje falar e até ensinar português europeu e entender outras variedades do português; falar espanhol de variedade venezuelana e entender outras variedades; falar francês por o ter estudado por 12 anos e ter habilitação profissional para o ensinar como língua estrangeira; falar inglês, que aprendi no ensino básico e de que muito preciso para o exercício da profissão; falar italiano, que aprendi quase sem dar por isso, como se sempre tivesse estado dentro de mim.

Quando cheguei a Portugal, fui para a escola de uma aldeia da Beira Litoral, onde frequentei a 4.ª classe. A professora ficou muito aborrecida por eu entrar a meio do ano lectivo e ser tão burra (ela dizia “buuurrra!”) que nem sabia falar português nem percebia o que lhe diziam. Na escola havia umas meninas ainda mais burras [do] que eu, porque, além de terem vindo do estrangeiro, eram muito mais pobres. Era assim em 1971. Que ainda hoje seja assim é inaceitável.

Vem isto a propósito de uma reportagem do DN, de 10 de Novembro p.p., intitulada “Há crianças portuguesas que só falam “brasileiro””, instigadora de alarmismo social e fobias, a avaliar pela reacção nas redes sociais. No texto grassa a ignorância e as asneiras são tantas que nem posso referi-las todas. Logo o título está errado. “Brasileiro” não existe (nem angolano, moçambicano ou africano), apenas português, vivo e de boa saúde, tal como não existe americano, sul-africano, indiano ou australiano, mas apenas inglês.

Ninguém em seu perfeito juízo ficaria aborrecido se o seu filho tivesse um colega, falante de inglês, que falasse português com sotaque; se o filho viesse para casa a dizer umas palavras ou expressões em língua inglesa, os pais até ficariam orgulhosos. Também não imagino pais a preocupar-se por os seus filhos começarem a falar inglês, seja de que país for, por exposição exagerada a produtos audiovisuais nessa língua. Contudo, conheço muitos relatos de crianças discriminadas na escola portuguesa por falar português de Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné ou Moçambique; talvez seja por serem morenas, talvez por serem pobres.

Diz uma reportagem de O Globo online, de dia 16, que Luccas Neto “anunciou que passará a dublar os seus vídeos em português … de Portugal”. Alguém imagina a Disney a dobrar os seus filmes em inglês … de Inglaterra? Imaginam as criancinhas inglesas a fazer terapia por falarem “americano”?

Haja bom senso! Aos pais, sugiro que conversem com os filhos e os ajudem entender o mundo que os rodeia, seja em que língua ou variedade for. Aos professores, que se actualizem e leiam umas coisas sobre variação linguística, multilinguismo e multiculturalismo. A sociedade agradece. E as crianças também.

Professora e investigadora, coordenadora do Portal da Língua Portuguesa

 

[Transcrição integral de artigo de opinião, da autoria de Margarita Correia, publicado no “DN” de 22.11.21. Cacografia brasileira do original corrigida automaticamente. Destaques, sublinhados e “links” meus.]

«É professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigadora do Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), onde coordena o Portal da Língua Portuguesa (www.portaldalinguaportuguesa,org) e foi responsável pelo Vocabulário Ortográfico do Português (VOP). É doutora em Linguística Portuguesa pela Universidade de Lisboa.»
«Especializou-se na área dos estudos do léxico, no âmbito da qual publicou diversas obras, tais como Os Dicionários Portugueses (Lisboa, Caminho, 2009) e, em co-autoria, Inovação Lexical em Português (Lisboa, Colibri, 2005) e Neologia do Português (São Paulo, 2010).» [Wook]

«O nosso VI Simpósio tem como tema “Terminologia, desenvolvimento e identidade nacional”.
Acreditamos que, nestes tempos de globalização, (…) é muito importante que os membros da RITerm reflictam acerca das medidas a tomar para defender as possibilidades das línguas espanhola e portuguesa como instrumentos para a comunicação intra e interlinguística especializada (…).
Acreditamos que, quando defendemos os direitos das nossas línguas espanhola e portuguesa, defendemos também o nosso património cultural comum, a nossa identidade nacional.» [“Terminologia, Desenvolvimento e Identidade Nacional” – VI Simpósio Ibero-Americano de Terminologia – de Margarita Correia, Edições Colibri, 2002]

«Margarita Correia é doutora em Linguística Portuguesa pela Universidade de Lisboa, tendo-se especializado nos estudos do léxico. Atualmente é professora da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e investigadora integrada no Instituto de Linguística Teórica e Computacional (ILTEC), onde coordena o grupo de Léxico e Modelização Computacional. Coordenou a realização do Vocabulário Ortográfico do Português (VOP) e, com José Pedro Ferreira, o Lince – Conversor para a nova ortografia. Garante a coordenação científica do Portal da Língua Portuguesa [“Webinars” DGE]

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A questão consiste em falar margaritês, ou seja, penetrar num sítio deprimente e caótico e tentar entender alguma coisa que por acaso escape à proverbial desonestidade intelectual desta falante única da sua própria língua. O margaritês consiste em aturar essa tal Margarita a dizer apenas mentiras — das mais escabrosas — e a inventar teorias da treta para vender mais uns livrecos de propaganda ao AO90 e de bajulação ao seu (dela) querido Brasil. Requer um módico de coragem, por conseguinte, levar com o margaritês, e ainda assim, mesmo fazendo salientar os bíceps mentais, torna-se imprescindível munir-se a gente de uma dose cavalar de paciência para “ouvi-la”.

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