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«Requiem pela Língua Portuguesa» [por Francisco João da Silva]

Requiem pela Língua Portuguesa

Ao CAVALO DE TRÓIA (1) que é o “acordo” ortográfico (1ª tentativa em 1986 e a 2ª em 1990) seguiu-se (2) em 2000 o chamado TRATADO de AMIZADE entre PORTUGAL e o BRASIL, dois actos eminentes políticos implementados concomitantemente (3) com o REPOVOAMENTO POPULACIONAL de Portugal, eufemisticamente chamado “CRÉDITO MIGRATÓRIO”!

Continuar a lutar e a bater unicamente na tecla “vertente linguística” não levou até hoje a nenhum resultado tangível, desde 1990 até 2023, isto é, há já 33 anos!

Versão condensada publicada no blogue Apartado 53
Versão completa disponível nesta hiperligação:
https://docs.google.com/document/d/1U4QIc1YZONehtN1m_jRf7zGMV4ERowRpx7C8PtnsjD4/edit

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A estratégia das castas políticas, misturada de trafulhices no que respeita às datas dos respectivos instrumentos de ratificação do Tratado Internacional AO-1990 enviados ao país depositário, ainda não foi bem compreendida por muitos portugueses incluindo aqueles que lutam pela RESTAURAÇÃO da LÍNGUA PORTUGUESA em Portugal! Só depois dessa estratégia política ter sido bem assimilada e estar perfeitamente clara para todos os portugueses é que os três pontos acima referidos, serão apreendidos pelo que são na realidade: são decisões políticas que estão relacionadas estreitamente entre elas e a única maneira de serem derrubadas é combatê-las doravante da mesma maneira que foram impostas: politicamente!

A casta política detém todas as alavancas do poder, ela apoderou-se do aparelho de Estado há já muito tempo e o regime consequentemente instaurado é claramente também o de uma ditadura ortográfica. O regime dispõe até da sua própria língua, um dialecto estatal , uma “novilíngua” orweliana, que lhe é própria e é, apenas praticada em Portugal, é o tal “acordo “ortográfico AO-1990! A sua revogação só pode ser feita, evoluindo da luta linguística contra o acordês, para outras formas de luta política, complementando-as com acções judiciais.

Esses três elementos principais são os que constituem a Agenda Oculta a ser implementada pelas duas castas políticas cúmplices, dos dois lados do Atlântico, cujo objectivo a médio prazo é o de eliminar a LÍNGUA PORTUGUESA internacionalmente (já actualmente com algum sucesso, linguística e culturalmente falando) para que possa ser substituída pela sua variante brasileira (a futura língua brasileira). Para evidenciar o que precede, citarei José Manuel Diogo, Director da Câmara de Comércio e Indústria Luso-Brasileira que afirma publicamente numa entrevista no dia 8 de Fevereiro de 2023, à Folha de São Paulo «(Brasil) que o “ Português do Brasil “ é verdadeiramente uma língua oficial de Portugal “, o que dispensa qualquer comentário.

Mais pormenores nestas hiperligações :

https://zap.aeiou.pt/portugues-brasil-lingua-oficial-portugal-521192

https://cedilha.net/ap53/2023/02/18/connect-the-dots/

https://cedilha.net/ap53/2023/02/17/que-lhes-faca-bom-proveito/

Segue mais abaixo outra prova sobre a eliminação em curso da LÍNGUA PORTUGUESA substituída a nível internacional pela sua variante brasileira. Há inúmeros exemplos destes. Até a Bandeira Nacional de Portugal foi substituída pela do Brasil. O mesmo NÃO sucedeu com a Bandeira da Espanha. Comprovem aqui: https://www.stopworldcontrol.com/?inf_contact_key=b8e264d08599f0daecad25d1009d5f06d18a532c4142cb79caf2b269de1401fa

O vídeo é igualmente falado na variante brasileira do português, assim como a redacção do texto, comprovem aqui: https://stopworldcontrol.com/pt-br/dellasuno/

Na versão completa deste artigo, que estão agora a consultar podem inteirar-se de como as duas castas políticas cúmplices estão a tentar transformar ( já com algum sucesso, linguística e culturalmente falando) a NAÇÃO PORTUGUESA, com quase 1.000 anos de existência, no 28º Estado da República Federativa do Brasil!

Uma das formas, dito melhor, um dos mecanismos políticos muito bem encapotado é o tal Tratado de Amizade, Cooperação e Consulta entre a República Portuguesa e a República Federativa do Brasil”, igualmente conhecido pelo nome de “Estatuto de Igualdade, ou de Amizade“ e que revoga o de 1972.

Uma outra dessas formas, efectuada de maneira bem disfarçada é o REPOVOAMENTO de Portugal através de uma substituição populacional, ou seja uma “COLONIZAÇÃO INVERTIDA” sobre a qual até já se fala subtilmente em público, como se pode constatar neste vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=UgySUABfWmU e aqui igualmente.

A terminologia usada pela união dita “europeia” como já referido acima, é uma horrorosa metáfora quando se fala de “CRÉDITO MIGRATÓRIO”, que é igualmente uma política mundialista. Na versão completa deste meu artigo, faço apenas duas perguntas.

A primeira pergunta que ocorre é: como é que foi possível que o Tratado, assinado em 2000, ou seja há mais de 22 anos seja tão pouco conhecido dos portugueses, pouco ou nada citado pela Imprensa (que eu saiba) e que eu, como decerto milhares ou mesmo milhões de portugueses, nunca ouvimos falar desse tal Tratado, com imensas implicações e consequências que estão muito longe de serem boas ou favoráveis para Portugal?

A segunda pergunta deriva da constatação de uma discriminação feroz, primeiramente de Portugal (leia-se do regime actual) que, cobardemente (será?) aceitou vergar-se aos interesses do Brasil, agindo consequentemente contra os outros 6 (seis) países membros da CPLP, que aparentemente não reagiram (tanto quanto eu saiba).

O silêncio destes países é, portanto, ensurdecedor! E porquê? O que é que isto esconde ou significa? Não será a continuação da lenta agonia da Matriz da Língua Portuguesa?

Convida-se, portanto, o Povo Português a enviar os seus pêsames e participar no já longo VELÓRIO em BELÉM. A IRONIA nem sempre faz sorrir, por vezes é triste.

As castas políticas são apátridas, por definição. Quando a maioria dos portugueses compreender isso já será demasiado tarde, mas nem tudo estará perdido. A liberdade, a justiça, a resistência fazem parte da dignidade humana e jamais foram vencidas definitivamente. Quanto à substituição da LÍNGUA PORTUGUESA pela sua variante brasileira, é-me difícil continuar a ser optimista, se a hipnose colectiva do Povo Português não for também eliminada!

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Artigo da autoria de Francisco João DA SILVA, Membro Fundador do Movimento em Prol da Língua Portuguesa (MPLP).

Contacto : restauracaolingua.portuguesa2011@yahoo.com

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Versão completa disponível nesta hiperligação:

https://docs.google.com/document/d/1U4QIc1YZONehtN1m_jRf7zGMV4ERowRpx7C8PtnsjD4/edit



A transcrição deste texto, remetido por e-mail pelo autor, reproduz exacta e integralmente o original, incluindo imagem, pontuação, destaques a “bold”, realces em maiúsculas, sublinhados e links.

Nas Jezik [por Rui Valente]

Há dias, numa conversa caseira, fui testemunha da enorme influência que a cultura inglesa exerce sobre os mais novos. Ao contar a história de um amigo que se candidatou a um emprego, o meu filho tropeçou no vocabulário — só lhe ocorria qualquer coisa à volta de “aplicou-se para”, numa clara influência do Inglês “to apply for”.

Vem isto a propósito da polémica em torno da enorme pressão a que está actualmente sujeito o Português Europeu, em risco de se descaracterizar completamente por força da enorme penetração de conteúdos brasileiros no nosso país — uma tendência que tem como expoente máximo o fenómeno Luccas Neto.

Embora afecte particularmente os mais novos, esta “brasileirização” está em todo o lado. Nas crianças, é assustadora — no curto espaço de uma geração corremos o risco de ver toda a estrutura do Português Europeu desaparecer, dando lugar à (des)ortografia, à construção frásica, ao vocabulário e até ao sotaque brasileiros. Mas também existe nos adultos, embora de forma mais subtil, muitas vezes sem que os próprios se apercebam. Veja-se, por exemplo, dois artigos consecutivos de Ana Cristina Leonardo no PÚBLICO: no artigo do dia 28 de Janeiro denuncia, e bem, o Acordo Ortográfico, estabelecendo uma ligação entre a sua influência e a crescente estupidificação da campanha eleitoral. Na semana seguinte, num outro texto, referindo-se a uma aplicação para telemóvel, a mesma autora dá preferência ao termo “aplicativo” (em Português de Portugal: aplicação).

Estranhamente, parece haver, entre os “influenciados”, quem desvalorize esta influência brasileira — a começar pelos pais das próprias crianças. Por um lado, dizem, essa influência sempre existiu. É anterior às próprias telenovelas brasileiras e nunca veio daí mal ao mundo. Por outro lado, acrescentam, não é pior do que a influência do Inglês. Há até quem diga que é melhor, referindo-se aos termos ingleses como “estrangeirismos”. Como se “aplicativo” e outras expressões similares não tivessem origem, também elas, noutro país.

Não é fácil desmontar este raciocínio porque a argumentação tem um fundo de verdade. Sim, a influência brasileira sempre existiu. Mas também sempre existiu entre todas as Línguas, em maior ou menor grau. Em larga medida, é desta forma que as Línguas evoluem.

A relação entre as Línguas do mundo sempre foi fluida. Quaisquer duas Línguas estão, ao mesmo tempo, a aproximar-se e a afastar-se, embora o saldo natural deste movimento seja sempre favorável ao afastamento. Português e Inglês, por exemplo, aproximaram-se no momento em que ambas escolheram a palavra “internet” para definir “rede informática à escala global”. Mas a tendência natural é a do afastamento.

Qual é então o problema da influência brasileira? Desde logo, há o facto de essa influência estar a acontecer em doses industriais. Mas, acima de tudo, estamos perante uma influência que não ocorre de forma espontânea. Pelo contrário, tem um cunho forte de imposição, pela aplicação da lei do mais forte. A influência do inglês, por grande que seja, não ameaça a nossa identidade — o meu filho jamais tentará convencer alguém de que “aplicar-se para um emprego” é uma expressão portuguesa. Pelo contrário, no caso da influência brasileira, há um risco real de termos de “debater” com terceiros a propriedade de expressões como “registro”, “econômico” ou “pantorrilha”.

Com a influência brasileira, hoje em dia, e residindo eu em Portugal, já tive de preencher formulários de “registro” numa actividade. Na internet, pedem-me que me “cadastre”. E, numa consulta a uma empresa portuguesa, recebi uma proposta para a realização de um estudo “socio-econômico”.

O que é que isto tem que ver com o Acordo Ortográfico? Tudo.

Na era pré-acordo, não passaria pela cabeça de ninguém, numa empresa portuguesa, escrever a um cliente uma carta em Português do Brasil.

Mas imaginemos, por absurdo, que isso acontecia. Qual seria a minha reacção? Sem o Acordo Ortográfico, o meu raciocínio só podia ser um: por alguma razão que não compreendo, uma empresa decidiu escrever-me em Português do Brasil. E, com um encolher de ombros, seguiria em frente.

Na era pós-acordo as fronteiras desapareceram. Pode muito bem acontecer que quem me escreve em Português do Brasil esteja convencido — e a tentar convencer-me — de que o faz em “Português”, um Português “universal” que dizem existir agora e que mais não é do que Português do Brasil.

Com a imposição do Acordo Ortográfico estamos, portanto, perante mais um fenómeno de engenharia social, de cariz eminentemente político, em que a Língua é usada não como meio de comunicação mas como forma de construir — ou destruir — identidade.

E, como sempre, quando a política mete as mãos na Língua — seja por estratégia geo-comercial, seja por conflito étnico ou religioso, seja por absoluta falta de senso — as consequências não são boas. Regra geral, acontece uma de duas coisas: a substituição forçada de uma Língua por outra, ou a criação de duas Línguas “diferentes”. Veja-se o caso do Bósnio, do Sérvio e do Croata. São apenas variantes do Servo-Croata, perfeitamente inteligíveis entre si. No entanto, num cenário de pós-guerra na ex-Jugoslávia, Bósnia-Herzegovina, Croácia e Sérvia entenderam por bem sublinhar as pequenas diferenças existentes, apresentando-as agora como três Línguas distintas. É frequente encontrar-se cartazes “triligues” onde se vê a mesma coisa escrita três vezes, sendo que a única diferença é que o Sérvio, que também pode ser escrito com caracteres latinos, está geralmente escrito em cirílico. São experiências “contra-natura” que tendem a correr mal: na Croácia, a legendagem de filmes Bósnios foi abandonada depois de ter sido ridicularizada e as pessoas da região, independentemente da sua origem, limitam-se a usar a expressão “Nas Jezik” (a nossa Língua) quando se referem ao idioma que usam.
(mais…)

Gente que não tem noção [por Rui Valente]

 

Gente que não tem noção

 

No já longo percurso da ILC-AO [Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico] temos falado do AO90 como um “corpo estranho” no seio da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Se o objectivo da CPLP é aproximar os diversos povos que, de algum modo, foram tocados pela Língua portuguesa, faz todo o sentido que cada povo preserve, nesse encontro, a variante da Língua com que se identifica e que sente como sua.

Acontece que, em rigor, o “Português universal” do Acordo Ortográfico não só não é universal como não é mesmo de ninguém. Como é possível promover-se a troca de experiências ou o verdadeiro conhecimento do “outro” se a própria Língua utilizada, pretexto e mote desta ligação, é adulterada pelos participantes? Imagine-se um encontro internacional de gastronomia em que todos os intervenientes, independentemente da sua origem, apresentam aos congéneres a “sua” receita de pizza.

A frase lapidar de Sérgio Rodrigues — “o Acordo Ortográfico é gasolina no fogo do anti-brasileirismo em Portugal” — é apenas mais um reflexo deste trágico equívoco em que chafurda o Acordo Ortográfico.

Através das lentes embaciadas do AO90 não é possível conhecermos este “outro” que temos diante de nós — torna-se difícil, desde logo, percebermos o que representa para esse “outro” o próprio Acordo Ortográfico.

Neste campeonato da “falta de noção”, os brasileiros dão cartas. É lendária a intervenção de Amini Hauy, doutora em Filologia e Língua Portuguesa no debate sobre o Acordo Ortográfico promovido pela Câmara dos Deputados do Brasil: a propósito das “cedências” do Brasil no Acordo Ortográfico a emérita professora da Universidade de São Paulo ia enumerando(minuto 53): perda do acento nos ditongos (como “européia”), 1-0 para Portugal; perda do acento em “pára”, 2-0 para Portugal…

É claro que nada disto faz sentido. As “cedências” do Brasil no Acordo Ortográfico são acentos de que o país já tinha abdicado em 1945 e correspondem, na prática, a uma acentuação “que já ninguém usa”, para citar outro linguista brasileiro. Aliás, apresentar a perda do acento em “pára” como uma cedência do Brasil é particularmente caricato, tendo em conta que é em Portugal que a falta desta diferenciação se faz sentir.

Mas o que importa destacar no discurso de Amini Hauy é a retórica de confronto. É certo que a professora abomina o Acordo Ortográfico. Mas consegue, no meio de muitas críticas certeiras, introduzir a espantosa pirueta de apresentar o AO90 como prova do neo-colonialismo português.

De facto, é possível que alguém, no lado português, tenha cometido o absurdo de pensar o AO90 como forma de mantermos “algum controlo” da Língua. Mas é preciso muita falta de noção, no lado brasileiro, para percepcionar a aplicação do Acordo Ortográfico como uma imposição portuguesa e, como tal, neo-colonialista.

De forma mais moderada, o próprio Sérgio Rodrigues incorre nesta falta de noção, quando diz que, resistindo ao AO90, os portugueses recusaram a ideia de um “Português sem centro”. Só um brasileiro muito centrado em si próprio poderia acreditar que o AO90 iria ser visto como “coisa neutra” em Portugal. Além do Brasil, Portugal é o único país onde a Língua portuguesa é Língua materna. Qualquer português minimamente ciente das suas raízes sabe que o AO90 implicaria sempre um rude golpe na nossa identidade. Mas, na prática, a sua aplicação está a resultar num cenário ainda mais desastroso: à boleia da ortografia, intensificou-se a pressão sobre outras características identitárias do Português Europeu, como o nosso vocabulário e a nossa sintaxe. Na prática, a aplicação do AO90 em Portugal tem resultado na terraplanagem pura e simples, do Português Europeu, seguido da sua substituição pelo Português do Brasil.

Do ponto de vista da ortografia e do vocabulário, a meia dúzia de “peculiaridades” que se quis preservar (“facto” em vez de “fato” ou “aplicação” em vez de “aplicativo”) é de tal modo irrisória que não resiste à enxurrada.

Na reportagem que motiva o texto original de Sérgio Rodrigues dá-se conta de uma realidade em que brasileiros altamente qualificados vêem o seu trabalho reconhecido noutros países europeus, mas descartado em Portugal. “Para que serviu o Acordo Ortográfico, afinal”? Boa pergunta.

O facto é que nenhum brasileiro pensaria chegar a França ou à Alemanha, por exemplo, e singrar no mercado de trabalho escrevendo e falando em Português do Brasil.

Mas, em Portugal, graças à ilusão de unidade promovida pelo Acordo Ortográfico, esse desiderato parece ser possível. E as tais “peculiaridades”? Valerá a pena a diáspora brasileira em Portugal aprender, pelo menos, essa meia dúzia de excepções? Bem… para quê? Quando nós próprios enchemos o Diário da República de “fatos”, quando permitimos que empresas de “streaming” legendem o seu catálogo num “Português” que é afinal Português do Brasil, porque há-de um brasileiro preocupar-se com essas miudezas? Foi assim que, quando há dias consultei uma empresa que promove visitas guiadas ao Pico, nos Açores, tive de preencher um formulário de “registro”.

Estarei a ser picuinhas? Para o colunista Rui Tavares, sem dúvida. Não foi por ler “registro”, “usuário” ou “setembro” que deixei de perceber o que me foi pedido. O que importa é que a gente se entenda, não é verdade?

Mas… quem é o colunista Rui Tavares para decidir o que é e não é importante?

ILC-AO

Diz-nos a experiência que, hoje em dia, sempre que há contacto entre Portugal e o Brasil, o esforço de comunicação e de inteligibilidade é quase todo nosso — porque vemos novelas, porque os nossos filmes não são dobrados, porque a nossa escolaridade não será assim tão má, os portugueses têm geralmente mais “ouvido” e estão quase sempre mais capacitados para fazer as despesas do entendimento.

Do nosso ponto de vista, o Acordo Ortográfico não tem outra utilidade que não seja facilitar ainda mais a vida dos brasileiros em Portugal. Não admira, portanto, que, volta e meia, alguém diga “assim, não”. E daí a “acusação” de anti-brasileirismo ou xenofobia.

Mas não tenhamos ilusões. Num mundo feito de acções e reacções, este recém-descoberto anti-brasileirismo não é mais do que a resposta possível ao gigantesco acto de anti-portuguesismo que constituiu o Acordo Ortográfico. E, disso, os brasileiros não têm culpa.

Pela parte que me toca, sempre me senti próximo da cultura brasileira. Na infância, lia “O pato Donald” da Editora Abril. Em adulto li todo o teatro de Nelson Rodrigues, todas as biografias de Ruy Castro. De Manoel de Barros a Ruben Fonseca, de Caetano Veloso a Chico Science, do MASP à terça-feira aos teatros da Praça Roosevelt, a cultura do Brasil resiste a tudo e é incontornável. Sempre gostei da ideia de falarmos duas variantes da mesma Língua, bebendo do “outro” aquilo que mais nos encanta. Mas há uma diferença abissal entre uma proximidade que é querida pelas duas partes e a situação actual, em que o “outro” nos é imposto em doses cavalares, sem hipótese de escolha e em detrimento da nossa própria identidade.

Se a única hipótese de retomarmos o controlo da nossa variante da Língua — e o nosso amor-próprio enquanto portugueses — for a separação oficial das duas variantes, então, obviamente, prefiro a separação. Eis aqui, finalmente, um resultado concreto do Acordo Ortográfico!

Chegados a este ponto, para os movimentos independentistas brasileiros a minha mensagem só pode ser esta: andem lá com isso! E se os rótulos de “neo-colonialistas” ou de geradores de “preconceito linguístico” ajudarem, venham eles.

Mas depressa! — não vá algum iluminado do Acordo Ortográfico lembrar-se de manter em Portugal a ortografia do AO90, mesmo quando já não houver (oficialmente) acordo algum.

Rui Valente

Ciências da morte [por Olga Rodrigues]

«The United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization (UNESCO) (In French: Organisation des Nations unies pour l’éducation, la science et la culture) is a specialized agency of the United Nations (UN) based in Paris. Its declared purpose is to contribute to peace and security by promoting international collaboration through educational, scientific, and cultural reforms in order to increase universal respect for justice, the rule of law, and human rights along with fundamental freedom proclaimed in the United Nations Charter. It is the heir of the League of NationsInternational Committee on Intellectual Cooperation.»
[Wikipedia]

 

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Prémio Internacional UNESCO | Guiné Equatorial para a Investigação em Ciências da Vida (ou da Morte?)

Subsídios para a formação de uma distinta classe de inteletuais

A guiné equatorial (assim mesmo, com letra minúscula), estado soberano, patrocina um prémio para a Investigação em Ciências da Vida. A UNESCO empresta-lhe a credibilidade e o prestígio do seu nome para o tornar visível na esfera internacional.

A notícia, sintomaticamente, aparece no “site” da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto englobada no item “Fontes de Financiamento / Bolsas / Oportunidades”.

Será uma boa oportunidade ganhar um prémio monetário no valor de US $300,000, além de um diploma e uma medalha? Com certeza. Tal distinção confere prestígio a quem a obtém? Dificilmente.

É simplesmente um expediente, uma fonte de financiamento que se pode obter de forma rápida, mas que, ao contrário do que os seus promotores pensam, não confere qualquer tipo de prestígio nem de distinção tanto a quem obtém o prémio, como a quem o confere.

É, para utilizar um anglicismo corrente, “business as usual”.

É a viciação e distorção da linguagem no seu máximo esplendor. É patrocinar um prémio de Ciências da Vida com dinheiro obtido da forma mais duvidosa possível e que foi criado apenas para reabilitar o nome mal-afamado de um ditador com demasiados crimes no seu já longo historial.

É aproveitar a situação de vulnerabilidade por que estão a passar as Universidades para as fazer aceitar o inaceitável, para reduzir os seus investigadores e professores a funcionários amestrados; atentos, veneradores e obrigados.

É dar um passo mais para a criação de uma novel classe de inteletuais que nada inteligem e que apenas papagueiam de cor e amoralmente a cartilha que os senhores do dinheiro lhes põem à frente.

E quem pensa que a língua não é para aqui chamada, engana-se, pois, uma língua, qualquer que ela seja, serve sobretudo para nos entendermos e fazermo-nos entender melhor, para interrogarmos o mundo à nossa volta e ir obtendo algumas respostas.

É com ela que se faz Ciência, qualquer ciência, que a comunicamos aos outros e vamos construindo com ela uma grande parte da nossa cultura.

Podemos por isso dizer sem medo de errar que quando uma instituição como a UNESCO promove um prémio que pressupõe de forma tácita a abdicação forçada da língua original de uma dada comunidade, no caso presente a nossa, que tem sido obrigada a estropiar a sua língua unicamente para fazer sobressair os projectos pessoais de alguns, está claramente a violar os princípios que a própria organização instituiu: “contribute to peace and security by promoting international collaboration through educational, scientific, and cultural reforms in order to increase universal respect for justice, the rule of law, and human rights”.

Na prática mata a Ciência, e logo na raiz, pois defendendo e promovendo activamente  o uso de uma língua artificialmente modificada unicamente para satisfazer fins políticos, estão na realidade a inutilizar o próprio substrato da sua concepção e feitura, logo, estão a inviabilizar o desenvolvimento da Ciência que tanto dizem defender.

É  por isso um evento que premeia as Ciências mortas e as Ciências da Morte.

É, em suma, a negação mais absoluta do trabalho, do estudo e da investigação que tão extremosamente enaltecem (da boca para fora), que querem substituir pelo nada, pelo vazio, pela negação de tudo o que vive e faz mexer qualquer investigador, em qualquer área.

É, no fundo, e ao arrepio de tudo o que afirmam, a mais perfeita negação de tudo o que seja a Vida, nas suas mais sofisticadas manifestações para a substituírem pelo Vazio e pelo Nada que caracterizam a Morte do indivíduo enquanto tal.

Olga Rodrigues

Uma ilha à deriva [por Diana Guerreiro]

dgr_swO acordo ortográfico é uma aberração que transforma o português numa ilha linguística à deriva. Temos que aprender com os montanheses helvéticos que a língua é para se preservar como ela é. Assim num jeito de labregada à taxista, a língua portuguesa é como uma mulher a quem um grunho quer obrigar a gostar dele, de repente já está a tratá-la como esposa sem a ter pedido em casamento.

Temos as crianças da diáspora portuguesa a aprender em francês durante o dia, para depois irem desaprender em português ao final do dia. Com a brincadeira do acordo, com a disrupção total da etimologia da língua portuguesa, cada vez se torna mais difícil fazer o paralelo e aprender a ortografia das duas línguas percebendo o porquê de se escrever assim. E se não há uma lógica, um fio condutor, o caminho é feito às apalpadelas e demora muito mais, além de que nem sempre se chega lá.

Pharmacie, photographie, farmácia, fotografia, etc e tal.

Para uma criança que aprenda a ler antes de ter entrado na escola é a coerência da fonética e o respeito pelas raízes das palavras que lhes traça o caminho. É assim como se fosse automático… Aquele “c” ou “p” têm um propósito, não é apenas um vestígio de tempos idos da dominação romana. É uma ponte que nos liga aos outros povos sul-europeus. É o que nos faz ir para fora e tão depressa aprender a falar e escrever as línguas latinas, assim como o inglês com a sua grande influência do francês e por isso tão próximo do português, tão fácil para nós, às vezes é só mudar *acção para *action.

Obscurantismo, o oximoro “cultura da ignorância”.

Sempre houve os engraçadinhos da turma, os espertinhos, inseguros porque sabiam que o saber não era o seu forte, que tentavam sempre parecer mais e melhor perante alguém que sabia a resposta. “ena, és buéda inteligente!” É isto que queremos cultivar? Naquela máxima que a narrativa tenta contar de que é bom manter o povo ignorante? É daquelas coisas, quando não se consegue fazer igual ou melhor tenta-se mudar as regras. Quando não se consegue produzir nada de construtivo, tenta-se destruir o que está feito. O que interessa é ir para a tumba com o nome conhecido, a bem ou a mal.

A Alemanha também tentou um acordo ortográfico e obviamente falhou. Os Suíços mandaram-nos passear. Na terra deles mandam eles, ora essa, e se querem dizer e escrever Chäs chüechli e não Käsekuchen, fazem-no mesmo. Estão-se bem a borrifar se mais não sei quantos milhões escrevem de outra maneira. A língua portuguesa é rica como outras não são devido ao esforço neoclassicista dos linguistas, dos cientistas e restantes eruditos. Por isso temos o vulgar rotura e o mais erudito ruptura. Mas NUNCA, NUNCA “rutura”. Aquela ortografia que nem é carne nem é peixe, é mesmo diarreia.

O francês, oralmente, é uma língua de mono e dissílabos, mas o escrito nem tanto. É isso que lhe dá algum encanto e ao mesmo tempo desencanto, para pessoas como eu, nativas de um português em que dizer “u” ou “ü” é uma questão de sotaque; são surdas às subtilezas da língua dos Gauleses. O latim de pronúncia celta, dizem alguns. E quer uma academia de meia dúzia de tachistas tornar-nos ainda mais surdos. Talvez assim não ousemos tanto fugir do cantinho atlântico tão mal frequentado e gerido desde quando ainda nem um cheirinho de latim por lá se tinha dado. Esta eterna inferioridade, regada a chico-espertismo, que eu cada vez mais temo que não seja apenas cultural e que já nos esteja a começar a ser impressa nos genes. Naturalmente ou à força, através de fantasias masturbatórias de iletrados, como o AO90 e outras coisas que tais.

Temos muito a aprender com os helvéticos. É com os casos de sucesso que se aprende, digo eu.

Diana Guerreiro (Suíça)