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Imprensa brasilesa [2]


Ricardo Cabral Fernandes

@CabralFernande5

É preciso ter muito descaramento para se anunciar cheia de felicidade um novo jornal com o mesmo grupo que está a despedir entre 150 a 200 trabalhadores, a maior parte jornalistas, em 12 OCS. “O chefe anunciou”.
[“Tweet” de 13.12.23 reproduzido na íntegra na 1.ª parte deste post]

CEO da Global Media acusa Marcelo de “imiscuir-se” na entrada de investidor. Salários deste mês estão em atraso

Carla Borges Ferreira
“ECO”,

“O interesse excessivo do Presidente da República em todo este processo é, no mínimo, estranho — e eu estou à vontade para dizê-lo, até porque já lho disse pessoalmente”. É assim que José Paulo Fafe, CEO do Global Media Group, reage à notícia do Correio da Manhã de que Marcelo Rebelo de Sousa afirma “nada saber” sobre a compra da participação da Global Media na Lusa.

Numa declaração feita a título pessoal, e por escrito, José Paulo Fafe afirma que “um dia havemos todos de perceber qual a razão que levou o Prof. Marcelo Rebelo de Sousa a imiscuir-se, da forma insólita como o fez, em todo o processo em redor da entrada do fundo no capital do Global Media”.

E prossegue: Haveremos de perceber o que, de facto, o terá levado a ser uma das principais pessoas que, nos últimos meses, mais contribuiu para fomentar a intriga em redor do negócio, criando e veiculando boatos sobre o fundo, exercendo pressões, e tentando condicionar até algumas mudanças a nível editorial, alinhando numa campanha inqualificável contra um investidor que, ao invés do que ocorre no sector, se dispôs a investir fortemente nos media portugueses”.

Marcelo Rebelo de Sousa, que, de acordo com o título da Cofina Media, foi “surpreendido” com a possível compra da participação da Lusa, esteve reunido no início de Novembro com a nova administração do grupo, liderada por José Paulo Fafe. Um encontro documentado com imagens.

O +M questionou ao final da manhã a Presidência da República sobre se tinha ou não conhecimento do negócio, mas até ao momento da publicação do artigo não recebeu resposta.

[Transcrição parcial, incluindo destaques.
Cacografia brasileira corrigida automaticamente.
Acrescentei “links” internos (a verde).]

Despedimento colectivo na Global Media continua a fazer mossa

 

O Conselho de Redacção do Jornal de Notícias (JN) sublinha, num comunicado divulgado hoje, que a tomada de posição conjunta dos directores daquele título foi recebida com «grande consternação», sendo entendida como um «sinal inequívoco de que esta redacção e quem a lidera não aceitam que se possa denegrir publicamente um jornal, os seus leitores e até uma região e um país».

A constante degradação das condições funcionais, tecnológicas e institucionais de exercício de funções sustentou a decisão tomada esta quinta-feira pela direcção, que se mantém em funções até que seja nomeada outra equipa.

Despedimentos, mesmo depois do «osso»

Esta quarta-feira, a direcção da rádio TSF demitiu-se em reacção ao anunciado plano de «rescisões» pelo Global Media Group. Recorde-se que, no passado mês de Setembro, os trabalhadores da TSF desligaram os microfones durante 24 horas, denunciando então que tinham chegado «ao limite».

Em declarações ao AbrilAbril durante uma concentração junto à sede, em Lisboa, para exigir trabalho digno e melhores salários, o porta-voz dos trabalhadores da estação, Filipe Santa-Bárbara, denunciava então que a redacção estava a trabalhar «no osso».

No final de Novembro, após a Global Media passar a ter como accionista maioritário o fundo de investimento World Opportunity Fund Ltd, sedeado nas Bahamas, foi anunciado o chamado «plano de reestruturação», que prevê despedir entre 150 e 200 trabalhadores.

As medidas anunciadas e em preparação para o JN e as suas revistas e suplementos tornaram, assinala o Conselho de Redacção (CR), «por demais evidente o desalinhamento estratégico», tendo conduzido à demissão de directora Inês Cardoso e dos directores-adjuntos Pedro Ivo Carvalho, Manuel Molinos e Rafael Barbosa, e ainda ao director de Arte, Pedro Pimentel.

O CR enaltece «o esforço e a forma empenhada como a Direcção do JN aguentou o jornal nos tumultuosos tempos» que atravessam juntos, «particularmente difíceis nos últimos meses, tentando fazer o melhor jornal todos os dias, independentemente dos meios e vontades», e agradece o trabalho «em defesa de um jornal que não é de quem o faz, mas de quem o compra – e foram mais de 23 mil em Outubro – e de quem o lê, cerca de 400 mil, todos os dias, entre papel e online, que lideramos em Portugal».

É por eles, leitores, acrescentam, que a redacção do JN vai continuar a trabalhar, fazendo o melhor jornal que conseguir, ainda que sob a ameaça de vir a perder 40 jornalistas, cerca de metade do quadro redactorial actual.

A demissão do director do desportivo O Jogo, Vítor Santos, e do director-adjunto Jorge Maia foi também comunicada hoje ao Conselho de Redacção daquele jornal, que refere que a decisão se sustentou «na degradação das condições tecnológicas, funcionais e de recursos humanos, relevando uma vez mais o esforço e sacrifício de todos os jornalistas» para garantir o bom desempenho de O Jogo em todas as plataformas. Os mesmos profissionais, que, acrescenta, «têm sido duramente afectados nos últimos tempos por uma série de decisões e comunicações, com impacto profundo nas respectivas famílias».

Em reacção ao anunciado plano do Global Media Group, que prevê um despedimento colectivo que pode atingir 150 a 200 trabalhadores, e ao programa em curso de «rescisões por mútuo acordo» para trabalhadores até aos 61 anos, Frederico Bártolo, jornalista do jornal O Jogo e delegado sindical do Sindicato dos Jornalistas, admitiu recentemente numa entrevista ao AbrilAbril a existência de «problemas graves» que se ligam à crescente precarização. Publicações como «O Jogo, Diário de Notícias, TSF e Jornal de Notícias e as restantes, debatem-se todos os dias com uma lógica de falta de pessoas suficientes para conseguirem entregar o projecto que têm em mãos que é um produto diário», denunciou.

[Transcrição integral, incluindo “links” (a azul). Destaques meus.]

World Opportunity Fund Ltd Adquire Controlo da Global Media – EWP

“EWP- Business Consulting”. 07.11.23

Numa evolução significativa na indústria dos media, o World Opportunity Fund Ltd, um fundo de investimento sediado nas Bahamas, emergiu como o accionista controlador do grupo Global Media, que detém proeminentes meios de comunicação como o Diário de Notícias, Jornal de Notícias e TSF. Esta transformação na propriedade segue uma série de transacções estratégicas que têm reconfigurado o cenário das participações nos media.

No início deste mês, o World Opportunity Fund Ltd adquiriu uma participação substancial na empresa Páginas Civilizadas ao empresário Marco Galinha, assegurando uma maioria de 51% na Páginas Civilizadas, que, por sua vez, controla a Global Media. O fundo, registado num paraíso fiscal e gerido pelo Union Capital Group (UCAP Group), com sede na Suíça, tinha inicialmente adquirido uma participação de 38% na Páginas Civilizadas em Julho.

Essas aquisições culminaram no fundo detendo agora 50,25% da Global Media e uma notável participação de 22,35% na agência de notícias Lusa, tornando-se um interveniente dominante no sector dos media.

A mudança de controlo resultou no grupo BEL, de propriedade de Marco Galinha, perdendo o estatuto de accionista maioritário do conglomerado de media. Esta mudança foi comunicada formalmente à Entidade Reguladora para a Comunicação (ERC), em resposta ao seu inquérito sobre modificações na estrutura accionista da Global Media.

O comunicado da ERC delineia os detalhes das transacções e a progressão do fundo desde a sua participação inicial de 38% até à actual propriedade maioritária. O regulador está actualmente a rever a informação fornecida pelo fundo e aguarda mais dados na Plataforma de Transparência dos Media.

Estes desenvolvimentos trouxeram alterações significativas na propriedade e gestão da Global Media, gerando discussões e debates, nomeadamente em relação aos seus meios de comunicação, incluindo TSF e Diário de Notícias. À medida que o World Opportunity Fund Ltd assume o controlo, o panorama dos media na região sofre uma transformação notável, preparando o terreno para futuros desenvolvimentos na indústria.

[Transcrição integral. Destaques meus.]

VER 1.ª parte deste “post”

 

Imprensa brasilesa [1]


“Não tenho prazer em que se perca até 200 trabalhadores na Global Media, mas se não fizermos isso este grupo morre”

Carla Borges Ferreira, Hugo Amaral, 13 Dezembro 2023
eco.sapo.pt

Até ao final de Janeiro a Global Media terá menos 150 a 200 trabalhadores. Terá também um novo título, o É Brasil. José Paulo Fafe, CEO do grupo, explica ao +M/ECO os planos para o grupo.

A saída de 150 a 200 pessoas do Global Media Group é, para José Paulo Fafe, CEO do grupo, uma inevitabilidade. “Não tenho qualquer prazer em criar condições para que este grupo perca 150 a 200 trabalhadores, não queria fazer isso. Mas sei que é essencial, se não fizermos isso este grupo morre”, garante em entrevista ao +M. Durante este mês, os trabalhadores podem dar início, por sua iniciativa, ao processo de rescisão. A partir dessa altura, contas feitas, o passo seguinte pode ser o despedimento colectivo. “Findo este processo vamos fazer uma análise e vamos ver se temos que optar pelo despedimento colectivo ou não”, diz, reconhecendo que o termo “rescisão amigável”, no caso, é pouco mais do que força de expressão.

Entretanto, já para o primeiro trimestre de 2024 será lançado um novo título, o É Brasil. Dirigido pelo jornalista brasileiro Paulo Markun, conta com uma redacção de sete jornalistas, aos quais se junta uma rede de correspondentes. O objectivo é chegar à comunidade de brasileiros que moram em Portugal e também em outras geografias.

Como imagina o Global Media Group (GMG) daqui a um ano?

Imagino um grupo na senda a que nos propusemos a partir do momento em que viemos para cá, a crescer no mercado da língua portuguesa. Um grupo em termos de recursos e meios mais racionalizado. Obviamente mais activo e fundamentalmente mais rentável. Mas o nosso objectivo claro é crescer no mercado da língua portuguesa. Esse é o nosso projecto.

O que é crescer no mercado de língua portuguesa?

Brasil, Angola, comunidades portuguesas no exterior. Temos um veículo extraordinário para isso, o Açoriano Oriental, nomeadamente para os Estados Unidos e Canadá. No Brasil, nas comunidades brasileiras também. E em África, nomeadamente em Angola. E isso faz-se através de títulos e meios que temos. E quando muito do É Brasil, que vamos lançar.

Um título de raiz?

Um título de raiz, para começar cá, dirigido à comunidade brasileira no exterior. Tanto em Portugal, como no Reino Unido ou Alemanha.

É também em papel ou só digital?

Vai ser em digital. Mas não descuramos que ao princípio tenha uma versão em papel, aqui em Portugal. De maneira a ajudar a consolidar a marca, nos primeiros tempos. Não está decidido, mas não descuramos essa hipótese.

O lançamento vai ser quando?

No primeiro trimestre.

Já tem equipa?

Já. O director é Paulo Markun, conceituadíssimo jornalista brasileiro. A equipa é uma mistura de experiência com juventude, totalmente brasileira. Neste momento são sete pessoas, baseadas cá, com uma redacção em São Paulo e delegados em Brasília e Rio. E uma rede de correspondentes pela Europa e mundo fora, também de brasileiros. É uma redacção 100% brasileira.

Quantas pessoas, no total?

No total são sete pessoas, mais colaboradores. Temos correspondentes na Alemanha, no Reino Unido, na Rússia também. Há muitos jornalistas brasileiro que saíram do Brasil para fazer mestrados, doutoramentos e especializações. Então, muito graças ao Paulo Markun, que é um jornalista com muito conhecimento do meio, conseguimos criar uma rede de correspondentes do É Brasil e que vão ser também, de alguma maneira, correspondentes dos outros meios do grupo, um pouco por todo o mundo. O Paulo Markun trabalhou na Globo, na Veja, foi presidente da TV Cultura, conhece muita gente.

O título dirige-se aos brasileiros que estão em Portugal…

E que estão espalhados pelo mundo.

Como é que chegaram à ideia de lançar este título?

Foi a pouco e pouco. Tudo começou ao contrário, começou com a ideia de fazer o DN Brasil, que é um pouco ocupar aquele espaço que o El País deixou numa certa faixa do mercado brasileiro. Não é um projecto que tenhamos posto numa gaveta mas, a pouco e pouco, fomos percebendo que era capaz de ser mais urgente fazer um projecto para os milhões de brasileiros que estão fora.

Em Portugal, apesar de no consulado estarem registados 300 mil, há mais de 1 milhão de brasileiros e muitos luso-brasileiros. Para dar um exemplo, há cerca de 40 mil pessoas que estão em Portugal como cidadãos italianos que são brasileiros. Há também uma comunidade fortíssima no Reino Unido, forte na Alemanha, é imensa a comunidade brasileira fora do país.

Quando começámos a fazer um produto para os brasileiros em Portugal, começámos a pensar que se é feito em português, em português do Brasil, por brasileiros, se tem o nome que tem, porque é que tem que ficar só em Portugal? Porque é que este produto não pode ir para o Reino Unido, para a Alemanha, etc, etc? (mais…)

Zolgensma – PMF* (1.ª parte)


«Marcelo suspeito de “cunha” para tratamento de duas gémeas no Santa Maria»

TVI/CNN-Portugal, Sex, 3 Nov 2023

«O Hospital de Santa Maria abriu uma auditoria para perceber como é que duas gémeas que vivem no Brasil receberam em Lisboa um tratamento de quatro milhões de euros. Há suspeitas de que isso tenha acontecido por influência do Presidente da República, mas Marcelo Rebelo de Sousa nega a situação. Apesar de um parecer contra de todos os neuropediatras do hospital, o tratamento avançou mesmo e as suspeitas admitem que possa ter sido por influência do chefe de Estado. O programa Exclusivo, do Jornal Nacional da TVI (do mesmo grupo da CNN Portugal), interceptou a mãe das crianças a admitir que recorreu a uma “cunha” do Presidente da República

Marcelo envolvido em caso de gémeas brasileiras tratadas em hospital de Lisboa

“Jornal de Notícias”, 03 Novembro, 2023

[foto]
Gémeas obtiveram nacionalidade portuguesa para serem tratadas – DR

O presidente da República terá tido influência no tratamento de duas bebés brasileiras, que para o efeito terão recebido em Lisboa medicamentos na ordem dos quatro milhões de euros, noticiou a TVI.

Marcelo Rebelo de Sousa é suspeito de interferência no Hospital de Santa Maria, num caso ocorrido em 2019, altura em que duas bebés brasileiras entraram naquela unidade hospitalar de Lisboa para receber um tratamento que custou quatro milhões de euros.

À TVI, Daniela Martins, mãe das crianças, confirmou que as então bebés, que viviam no Brasil, entraram no Santa Maria em finais de 2019 para serem tratadas, tendo conseguido obter a naturalização portuguesa, para que fossem tratadas em Lisboa. A progenitora precisou ainda que a nora e o filho do presidente da República tinham interferido a esse respeito.

De resto, a convicção dos médicos do Santa Maria é que tal sucedeu por influência do chefe de Estado. Uma carta de indignação dos clínicos desapareceu entretanto dos registos hospitalares, tal como o dossier de admissão das crianças, acrescentou aquele canal televisivo. O Hospital de Santa Maria vai abrir uma auditoria, para perceber o sucedido.

Em declarações à TVI, Marcelo Rebelo de Sousa disse não se recordar de ter tido interferência no caso, negando qualquer tipo de favor no processo. “Francamente não me lembro”, vincou o presidente da República, vincando, contudo, não ter tido influência no tratamento das bebés em Portugal.

Marcelo nega ‘cunha’ no caso de gémeas brasileiras em hospital de Lisboa

sol.sapo.pt, 4 de Novembro de 2023

Presidente da República negou, este sábado, ter interferido no acesso a tratamento médico de duas bebés gémeas brasileiras num Hospital de Lisboa.

Em causa está uma reportagem da TVI, transmitida na sexta-feira à noite, que dizia que Marcelo Rebelo de Sousa teria metido uma ‘cunha’ para o tratamento das crianças.

Eu ontem disse que não tinha feito isso, se tivesse feito tinha dito. Não falei”, sublinhou o chefe de Estado, em declarações aos jornalistas.

“Ninguém aparece [na reportagem] a dizer que eu falei com essa pessoa. Ninguém. Só há um Presidente. A família do Presidente não foi eleita”, afirmou.

Para Marcelo Rebelo de Sousa, os portugueses têm direito a saber “se o Presidente está a mentir ou se está a dizer a verdade”, pelo que “se aparecer alguém” admite não ter “outro remédio se não eventualmente ir a tribunal”, para comparar a sua “verdade com a verdade dessa pessoa”.

O chefe de Estado fez ainda questão de distinguir que não é o dever da sua honra que está em causa, mas sim “o dever da defesa do Presidente da República.”

[A cacografia brasileira foi corrigida automaticamente nas três transcrições.
Destaques e “links” (a verde) meus.]

*PMF = Para Memória Futura

«A mitologia lusófona» [João Gonçalves, “JN”, 28.08.23]

Costa e Marcelo (Portugal), Obiang (Guiné Equatorial), João Lourenço (Angola)

A mitologia lusófona

João Gonçalves
“Jornal de Notícias”, 28 Agosto, 2023

 

Lula da Silva e Obiang

Cavaco Silva e Obiang

Michel Temer e Obiang

Terminou ontem, em São Tomé e Príncipe, mais uma reunião da CPLP. Convém descrever brevemente o que é a CPLP. Trata-se da mundialmente famosa Comunidade dos Países de Língua Portuguesa, uma espécie de “Commonwealth” de trazer por casa entre Portugal e as suas antigas colónias, mais um. Esse “mais um” é a extraordinária Guiné Equatorial, admitida ali há nove anos, a que preside, vai para 45 anos, o sr. Teodoro Obiang Nguema Mbasogo. Em 2014, aquando da absurda admissão da ditadura do sr. Obiang, as “condições” incluíam a “promoção do português” e uma espécie de moratória para a abolição da pena de morte num país que queria integrar uma “comunidade” com alguns pergaminhos nessa matéria, pelo menos por parte da antiga potência “colonizadora” que a abolira há muito. Quanto ao português, ignoro os progressos. E a pena de morte, apesar de teoricamente abolida em Setembro de 2022, ainda consta da Constituição autóctone. Se falo nisto, é porque à hora que escrevo ainda não é certo que, como desejava nomeadamente Portugal, ali representado por Marcelo e Costa, a próxima presidência da CPLP vá parar às mãos da outra Guiné, a de Bissau. O regime de Obiang estava a pressionar para ser a Guiné Equatorial, como se depreendeu da curta intervenção do seu presidente numa reunião restrita da “cimeira”. Desde 2010 que Portugal foi efectivamente “engolido” no processo de adesão da Guiné Equatorial à CPLP, não obstante a clara oposição do presidente Cavaco Silva. Angola, Moçambique e, muito provavelmente, o Brasil do sr. Lula (a sua antecessora Dilma deixou a coisa passar) são os mais proeminentes apoiantes de Obiang, apesar da natureza do regime, por causa do abençoado dinheiro e dos não menos abençoados negócios. Para os devidos efeitos, aquilo é uma potência económica, fale, ensine, ou não, português como língua oficial, e elimine ou não de vez a pena de morte. Em 2014, aconteceram umas promessas de negócios com petróleo e, imagine-se, de dinheiro fresco para o Banif que se extinguiria, famosamente, no ano seguinte. Dito isto, ainda falta o Acordo Ortográfico, que nós oficialmente adoptámos – e que a CPLP, como tal, não – para andar a babujá-lo por livros, escolas e órgãos de comunicação social, em modo original de libertinagem gramatical, nem carne nem peixe, enquanto os nossos parceiros, nomeadamente Angola, praticam o excelente português que herdaram antes de 1990. Já que, pelos vistos, nada se respeita particularmente na frívola CPLP, ao menos respeite-se a matriz de uma língua secular com milhões de falantes pelo Mundo fora.

[Transcrição integral (ipsis verbis, original sem parágrafos).
Destaques e “links” meus. Acrescentei imagens.]

 


Alguns outros artigos sobre a Guiné Equatorial e o “democrata” Obiang, um “lusófono” desde pequenino

Tripas à moda do Rio

Algumas pessoas, especialmente entre o Porto e Valongo (mais umas quantas simpáticas localidades ali à volta), conhecem este indivíduo da pantalha televisiva, em especial por ter figurado num defunto programa especializado em maledicência (‘A Noite da Má-Língua’) e numa outra tertúlia mais virada para o pontapé na chincha. Tem ainda no curriculum, abrilhantando a sua condição de figura pública, o facto de pertencer à Confraria das Tripas, essa prestigiosa e vetusta instituição da Cultura pátria cuja matéria (as tripas propriamente ditas) é um elemento essencial da História de Portugal, d’aquém e d’além-mar, em especial da parte do além, está visto, pois que foi à custa das tripas que Portugal deu novos mundos ao mundo e espalhou a Língua portuguesa por tudo quanto é canto, etc.

Não se trata contudo agora da parte curricular ou das viscerais confrarias do senhor, nada de actividades empresariais na florescente área da organização de eventos, ou assim. Outrossim, porém, detenhamo-nos em pormenores a seu (dele) ver irrelevantes como sejam as desprezíveis normas que regulam (ou não, para o mesmo senhor é igual) a chamada “ortografia”. Não é de todo caso único, ainda  que a bizarria no caso vertente escape a qualquer tentativa de entendimento, e se calhar até há quem conheça outros exemplos quejandos de tanto-se-lhe-dá-como-se-lhe-deu no que à escrita diz respeito. Segundo preceitua este, e há-de haver mais com certeza, é facílimo, tudo se resume a carregar pela boca e puxar o gatilho, cá vai disto, pum, sai pela mesma boca por onde entraram bolinhas de chumbo e  areia uma descarga textual catita, explosiva; ou seja, se bem entendi, isto depois da descoberta da pólvora é uma brincadeira de meninos, carrega-se o arcabuz (ora renomeado “conversor ortográfico”) com chumbadas em Português, este é detonado pela pólvora (o “acordo ortográfico”) quando se prime o gatilho (tecla “enter”) e sai pelo outro lado um tirinho em acordês.

Foi o que “aprendi” no textículo do senhor, salvo seja. Mas devo ter percebido mal, só pode.

Não poderia, no entanto, privar os dois ou três leitores deste incógnito — porém, jeitoso, porque todo virado para a inovação — repositório virtual de tão suculento pitéu. E não, não me refiro às tripas.

Uma conversa acordada

Manuel Serrão
“Jornal de Notícias”, 30.01.19

Esta semana, em conversa acordada com um amigo escritor, que por acaso também tem presença frequente na Imprensa nacional, demos por nós a discutir a diferença que tem existido entre quem se deixa regular pelas novas regras do Acordo Ortográfico e quem insiste em continuar a mover-se no universo da agora chamada antiga ortografia.

 

Também aqui no JN existem alguns textos e crónicas que no seu final advertem os seus leitores de que o autor escreveu segundo essa dita antiga ortografia.Lembro-me que na altura em que o Acordo Ortográfico entrou em vigor também alguém do JN me ligou, muito simpático, a perguntar qual seria a minha opção a partir de então, entre escrever respeitando o novo acordo ou usar da prerrogativa de continuar a escrever como sempre tinha escrito. Recordo-me que na altura a minha posição foi muito simples e por isso a minha decisão muito rápida, mesmo imediata. Perguntei ao meu interlocutor do JN o que é que o jornal, a sua Administração ou os seus directores tinham decidido fazer e tendo-me sido respondido que o jornal iria naturalmente seguir o acordo aprovado, eu limitei-me a dizer que então a minha crónica deveria alinhar, também naturalmente, com esta decisão. Nessa altura não me senti minimamente “violentado” com a questão, como não me senti de forma alguma pressionado para alinhar com a decisão geral editorial. Mas também não me senti impelido a deixar de fazer, pensar ou escrever diferente do que sempre tinha feito e aprendido ao longo da minha formação escolar.

Nesta conversa que referi acima com o tal escritor meu amigo (por sinal lisboeta) chegamos a uma conclusão que nos parece que ainda torna este caso mais límpido, a questão da advertência da conformidade ou não com o Acordo Ortográfico menos relevante e a prática que tem sido seguida até um bocadinho ridícula. Ora vamos lá ver. Uma coisa é escrever e outra, diferente, é publicar. Na minha relação com o JN, eu limito-me a escrever como acontecerá nas relações similares entre os outros cronistas e os órgãos de Comunicação Social para onde escrevem. Há uma divisão clara de tarefas: esta crónica, como as anteriores e as próximas, sou eu que as escrevo e o JN que as publica. Nunca se deu o caso, e tenho a certeza que nunca se dará no futuro, de que seja o jornal a escrever e eu a publicar. Assim sendo, aquilo que eu sempre fiz e continuo a fazer é escrever segundo a agora antiga ortografia, mas que para mim é a minha ortografia de sempre. O que o jornal faz é, recebido o meu artigo, a conversão para a nova ortografia de acordo com a decisão que tomou de respeitar o Acordo Ortográfico, publicando-a depois nesses termos. Isto quer dizer que faz pouco sentido para mim esta frase que vejo algures dizendo que o cronista escreve segundo a antiga ortografia, que é o que eu também sempre faço. Eventualmente, embora isso me pareça de certa forma desnecessário, haveria que acautelar os leitores, lembrando que o referido texto não é publicado de acordo com as novas regras porque o autor assim prefere.

Resta-me acrescentar que percebendo eu perfeitamente que os autores, como eu, gostem de escrever segundo a ortografia que aprenderam, já me custa muito mais perceber que insistam em que a publicação seja feita nesses mesmos termos, sendo que até podem estar a cometer um erro na comunicação com leitores mais jovens, para quem a nova ortografia é também para eles a ortografia de sempre.*Empresário

[Transcrição integral de “Uma conversa acordada”, “JN”, 30.01.19. Na transcrição da prosa foi feita, nos exactos termos indicados pelo autor, a conversão para a ortografia portuguesa de acordo com a decisão que o autor da transcrição tomou de não respeitar o Acordo Ortográfico, publicando-a depois nesses termos.]