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Descolonização, já!

«Em exposição desde o dia 12 de junho, no Centro Cultural Brasil-Angola.
Escritor Ondjaki coordena programação cultural»

«Primeiro museu no mundo totalmente dedicado a um idioma, o Museu da Língua Portuguesa foi inaugurado na Estação da Luz, prédio-símbolo de São Paulo, em 2006. Em quase dez anos de funcionamento recebeu cerca de 4 milhões de visitantes. Hoje está em reconstrução.»

«A exposição “A Língua Portuguesa em Nós” é uma iniciativa do Itamaraty, em parceria com o Governo do Estado de São Paulo, a Fundação Roberto Marinho, o Museu da Língua Portuguesa e o Instituto Internacional da Língua Portuguesa, com coordenação da Expomus.»

«O Museu da Língua Portuguesa é uma iniciativa do Governo do Estado de São Paulo, por meio da Secretaria de Estado da Cultura, concebido e realizado em parceria com a Fundação Roberto Marinho. Tem como patrocinador máster a EDP, patrocinadores Grupo Globo, Grupo Itaú e Sabesp e apoio do Governo Federal, por meio da lei federal de incentivo à cultura. O IDBrasil é a organização social responsável pela gestão do Museu.» [“Plataforma 9” (Brasil)]

Lá diz o ditado, mais depressa se apanha um mentiroso do que um coxo. Se bem que neste caso sejam vários os coxos e, ainda por cima, com a agravante de serem esses mesmos também os mentirosos. Ou, parafraseando não sei que “intelectual” de igual coturno, mas não coxo nem mentiroso, “isto anda tudo ligado”.

No que diz respeito ao AO90 e, portanto, no que respeita aos mentirosos que o engendraram e às mentiras que propagam, existem diversos factores comuns facilmente identificáveis.

O primeiro pressuposto a considerar, em especial quanto à matéria agora considerada, é que as empresas privadas às quais são adjudicadas arbitrariamente a montagem e organização de “exposições” sobre a língua brasileira limitam-se a criar ambientes de “espetáculo” onde actuam os palhaços do costume, também eles sempre os mesmos, os dos sapatões clássicos, trajados a rigor com seus casacos de lantejoulas e ceroulas turcas mai-lo inevitável remate do pom-pom vermelho a fazer de nariz “engraçado”.

As técnicas utilizadas nesses espectáculos circenses são igualmente sempre iguais e resumem-se a divertir o “honorável público” com umas “iniciativas”, umas “discussões” e, como presigo, fotografias de exemplares amestrados (os obedientes aprendizes de brasileiro) e de outros mais selvagens (alguns palavrosos anti-acordistas confusos), segundo acham os organizadores, mandantes da pantomina, tudo regado a aguardente de cana e outros acepipes regionais.

Uma dessas técnicas, porventura a mais especializada, é a da chamada “mesa-redonda”, ao redor da qual abancam 90% de acordistas, brasileirófilos em geral, agentes e bufos da polícia política e os inerentes cães-de-fila (ou farejadores ou Bloodhound), todos fingindo discutir o AO90, a CPLP, o IILP, “o” Camões, a “difusão e expansão da língua” brasileira no mundo, “o valor económico da língua” brasileira, que “ninguém é dono da língua” brasileira (exceptuando o Brasil, calculo), tudo coisas assim, penas de pavão pesando toneladas, halteres de cortiça erguidos com imenso esforço acima do cocuruto, toda aquela gentinha aferrolhando um ar sorumbático, grave e sério.

Por exemplo, aquilo que agora se pretende levar a cabo em Glasgow, segundo diz a agência BrasiLusa, não apenas tresanda a pura propaganda como não passará efectivamente (basta ler os nomes dos participantes) de mais uma sessão de intoxicação da opinião pública, promovida (e paga?) pelas entidades portuguesas que habitualmente, estruturalmente, ideologicamente, gananciosamente servem os interesses geo-estratégicos e político-económicos do Brasil. Na habitual proporção de 90% de acordistas, esta “discussão” não passará de mais uma das ratoeiras circenses que a seita acordista armadilha amiúde.

  • Tem a ver com o aspecto das variantes, dos sotaques, que na verdade são variedades do português, são línguas que são diferentes, mas são a mesma língua portuguesa
Não, não é uma questão de sotaque. O Português e o brasileiro “são línguas que são diferentes”, evidentemente, e por isso mesmo… não são a mesma língua! Aliás, ou uma coisa ou outra — as duas na mesma frase ou ambas como premissas da mesma ideia são incompatíveis entre si e auto-excludentes.
  • “Em certa medida, ainda há uma sensação de que Portugal é o dono da língua portuguesa, quando, na verdade, a maior parte dos países que falam português têm mais falantes do que Portugal, salvo algumas excepções. É uma questão que está muito presa na língua portuguesa, mais do que noutras línguas, como o inglês

Uma das patranhas favoritas deste tipo de prestidigitadores: a língua depende do número de falantes; a destruição liminar da Língua Portuguesa deverá ocorrer porque os Brasileiros são mais do que 200 milhões e Portugal apenas tem dez milhõezinhos de almas-penadas. Seria ocioso comentar de novo semelhante bojarda ou explanar de novo as mordentes evidências que por excesso servem para estraçalhar tão imbecil delírio.

  • «A apresentação do Dicionário do Português de Moçambique (DiPoMo) pela coordenadora, Inês Machungo, da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, vai abrir o simpósio e lançar o debate»

E pronto. Ora cá está. Aquilo é só mais uma sessão de propaganda do AO90. Qualquer “discussão” prévia é mero engodo. A rapsódia dos “dicionários” parcelares sempre foi uma “exigência” de anti-acordistas confusos e de outros confusionistas. Moçambique… check. Portugal, check. Brasil, check. O resto do “evento” será mais do mesmo, pura treta para enganar os alvos predilectos dos acordistas: papalvos.

A seu tempo farão outros dicionários, um por cada ex-colónia portuguesa, e assim, de mentira em mentira, de check em check, julga o estado-maior acordista que algum dia chegarão a checkmate.

Académicos no Reino Unido debatem descolonização da língua portuguesa

Simpósio realiza-se em Glasgow, na Escócia, com a presença de professores e académicos que vão discutir questões relacionadas com as “variedades, ou variantes, da língua portuguesa no contexto da descolonização do currículo”.

“Público”, 26 de Junho de 2021, 12:41
Lusa

 

A “descolonização do currículo” e as variantes da língua portuguesa vão estar em debate este sábado em Glasgow, Escócia, num simpósio da Tropo UK, a Associação de Professores e Investigadores de Língua Portuguesa no Reino Unido.

Professores e académicos vão discutir questões relacionadas com as “variedades, ou variantes, da língua portuguesa no contexto da descolonização do currículo”, adiantou a organização, a cargo do departamento de Português da Universidade de Glasgow.

O tema surgiu do incentivo, sobretudo no último ano, da instituição britânica a docentes e alunos para analisarem o impacto da colonização no programa lectivo, tendo inclusivamente criado um centro de estudos sobre a escravatura.

Sensibilizado por esta questão, Luís Gomes, co-organizador e professor de Português naquela universidade, considera importante debater a descolonização do ensino do português como língua estrangeira, segunda língua e língua de herança. “Em certa medida, ainda há uma sensação de que Portugal é o dono da língua portuguesa, quando, na verdade, a maior parte dos países que falam português têm mais falantes do que Portugal, salvo algumas excepções. É uma questão que está muito presa na língua portuguesa, mais do que noutras línguas, como o inglês”, disse Luís Gomes à agência Lusa.

Isto reflecte-se, refere, na ideia existente em muitos dos membros da Comunidade dos Países da Língua Portuguesa (CPLP), como Moçambique, de que é mais correcto o “português de Lisboa ou o português de Viseu” do que a própria variante ou sotaque local. Outro exemplo é o facto de o português de Cabo Verde ser normalmente denominado por “crioulo” e não visto como uma variante do português ou português de Cabo Verde.

“Tem a ver com o aspecto das variantes, dos sotaques, que na verdade são variedades do português, são línguas que são diferentes, mas são a mesma língua portuguesa”, argumentou Luís Gomes, questionando: “Se há o português do Brasil e o português europeu, porque é que não há o português de Angola ou de Moçambique ou da Guiné?”. A discussão, acrescenta, não pretende influenciar necessariamente decisões políticas, mas contribuir para a forma como os professores trabalham, ensinando e aceitando diferentes formas de escrever e falar português.

A apresentação do Dicionário do Português de Moçambique (DiPoMo) pela coordenadora, Inês Machungo, da Universidade Eduardo Mondlane, em Maputo, vai abrir o simpósio e lançar o debate. Numa mesa redonda vão estar a presidente do conselho científico do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), Margarita Correia, a directora da Organização de Estados Ibero-americanos para a Educação, Ciência e Cultura e antiga presidente do Instituto Camões, Ana Paula Laborinho, e rapper brasileiro Vinicius Terra, bem como os professores Fernando Venâncio (Universidade de Amesterdão), Francisco Calvo del Olmo (Universidade Federal do Paraná, Brasil) e Sílvia Melo-Pfeifer (Hamburgo, Alemanha).

[Transcrição integral. Publicação: “Ípsilon”, suplemento do jornal “Público”, em 26 de Junho de 2021. Imagem da exposição “deles” de: “Plataforma 9“. Fotografia de cão da raça Bloodhound de: “Vetstreet“. Destaques, sublinhados e “links” (se não constantes dos originais citados) de minha autoria, por regra a cor verde.]

No doubt about it

O que tem a ver com o AO90 um texto sobre a Língua Inglesa escrito por um russo em Inglês?

Bom, tem tudo a ver. Qualquer semelhança entre este argumentário sólido e as tretas acordistas é mera coincidência, bem entendido, seguindo o autor uma linha de raciocínio coerente (e inteligível) que radicalmente difere do discurso errático, polvilhado com “inverdades” escabrosas, que é típico do paleio de Malaca, Bechara, Reis, Canavilhas e outros portadores de mitomania.

E se quanto a semelhanças estamos conversados, já no que diz respeito a diferenças temos apenas esta: não existe a mais leve referência a ortografia. Nem explícita nem implicitamente. Nem claramente expressa nem vagamente aflorada.

O que faz todo o sentido, evidentemente. Tratando-se de anglofonia, falando-se de países anglófonos, analisando-se a (real, efectiva) difusão e expansão da Língua Inglesa, a “questão ortográfica” jamais ocorreria sequer a qualquer anglófono: a ortografia do Inglês permanece intocada há séculos. Aliás, por alguma razão é essa e não outra, hoje em dia e desde há séculos, a única língua-franca universal.

Afinal, vendo bem, este texto tem tudo a ver porque não tem nada a ver.

 

The English Language No Longer Belongs to Britain and America»

Brits and Americans No Longer Own English

By Leonid Bershidsky
“Bloomberg”, 02.03.19

 

The Brexit circus and the unpopularity of President Donald Trump are causing apprehension about the future of the Anglosphere, the cultural, intellectual and political influence of the core English-speaking nations: Britain and the U.S.

As a non-native English speaker who works in the Anglosphere, though, I’m not worried about that; Americans and Brits are merely facing increasing competition from within their accustomed domain rather than from without.

The English language, which has just 379 million native speakers, is spoken at a useful level by some 1.7 billion people, according to the British Council. That has long ensured that U.S. and U.K. voices are heard louder than any others.

There is no indication that the language’s popularity is declining despite the recent damage to the two countries’ soft power. Last year, the British Council forecast that the number of potential learners in Europe will decline by 8.8 percent, or some 15.3 million, between 2015 and 2025. Brexit has nothing to do with this: the expansion of English teaching at schools is expected to cut demand for the organization’s courses. Overall, the market for English in education is predicted to grow by 17 percent a year to reach $22 billion in 2024. That, in large part, is thanks to insatiable demand in Asia.

I learned it in the Soviet Union. I have to admit I did it because of British and U.S. soft power: I wanted to understand rock song lyrics, watch Hollywood movies in the original, and read books that weren’t available in translation. But that wasn’t the reason high-quality instruction was available to me in Moscow in the 1980s: English was the adversary’s mother tongue. Russian President Vladimir Putin is no fan of the U.S. or the U.K., but he has learned their language well enough to speak to other foreign leaders without a translator.

It’s impossible to avoid: 54 percent of all websites are in it. The next most widespread language is Russian, with 6 percent. The most popular translation requests on Google all involve English. The global academic community speaks it, and not just because U.S. and U.K. universities are important: If they all closed tomorrow, scholars would still need a common tongue, and they aren’t going to vote to adopt another one.

Nor will the global political community. The European Union is a case in point: After Brexit, English could lose the status as one of the bloc’s working languages because no remaining members use it officially. Yet the legal departments of all the EU governing bodies have agreed that it can retain its status on the rather thin argument that it’s used in Irish and Maltese law. It’s also the lingua franca for all the Eastern European officials who have never learned French or German. Even after Brexit, it will share with German the status of the most widely spoken language in the EU – that is, as long as one takes into account non-native speakers.

(mais…)

“Lost in translation”

lostintranslationNunca entendi esta “questão”. Há-de ser decerto um assunto importante, a julgar pelo número de pessoas (pelo menos aparentemente) normais que a ele se referem amiúde, mas confesso que me ultrapassa mesmo “o” para que raio isto interessa. Em que é que este antiquíssimo fenómeno, esta trivialíssima parvoíce, tal vulgaríssima labreguice afecta a Língua Portuguesa enquanto corpus são e escorreito?

Pois é claro que a TVI (por exemplo, mas com direito a destaque) capricha na liquidação sumária do Português. Pois sim. Mas isso, raios, não tem absolutamente nada a ver com aquilo que nos interessa!

Anglicismos? Francesismos? Barbarismos? Estrangeirismos?

Sim, sempre houve disso. So what?

O “acordo ortográfico” é que é assunto, ok?

Peço desculpa pelo estilo blunt: isto é pura e simples conversa fiada, verbo de encher, bull shit. Tentem lá mudar o chip, caramba, deixem-se de conneries.

 


logo_sharePerdidos na tradução

Nuno Pacheco

29/04/2016 – 00:10

Faz-nos falta a Grande Cruzada da Tradução Nacional!

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Anda por aí um vírus, teimoso e persistente, ao qual nos vamos habituando com alguma moleza: o vírus do Anglicismo. Nada de muito grave, diga-se. O seu irmão mais velho, o Galicismo, imperou com pompa e proveito no século XIX. Depois auto-extinguiu-se, sem intervenção de qualquer vacina. Os pais, esses, são eternos: o Desdém e a Tolice. Antes de continuar, convém dizer duas coisas positivas. A primeira é que os portugueses são, ou tentam ser, saudavelmente poliglotas, e para isso muito contribui o facto de não haver, por exemplo, tradução oral mas sim legendagem de filmes, documentários ou séries (ao contrário do que sucede, por exemplo, em Espanha, França ou Inglaterra), e assim desde muito novos que todos sabem como soa o inglês, o francês, o espanhol, o alemão ou o japonês. A segunda, é que o uso de palavras ou frases estrangeiras no dia-a-dia, por necessidade ou brincadeira, não faz mal a ninguém e nem sequer é criticável. Ninguém se lembraria, a não ser os mais puristas, de traduzir Facebook por Livro de Caras ou Twitter por Gorjeio.

No entanto, há casos onde o abuso do inglês se torna caricato. Vejam-se, por exemplo, muitos concursos televisivos nacionais (The Big Picture, Got Talent Portugal, Cook off, The Voice Portugal, Fama Show, Love on Top, etc); os nomes que travestiram tantas universidades; a gíria que infesta a economia e a gestão; ou o recém-inaugurado e prometedor News Museum. Quem escolheu o título em inglês deve tê-lo achado mais cosmopolita. Museu das Notícias? Que saloiada! Mas e o também recente Museu do Dinheiro? Não será este tão ou mais universal do que as notícias? Então, o que esperam para fazer dele um Money’s Museum, hã?

Ah, faz-nos falta a Grande Cruzada da Tradução Nacional! Ponhamos em Belém uma Tower e um Monastery, para ajudar os turistas; troquemos as ruas por streets; chamemos trains aos comboios e ATM aos multibancos, sejamos, como se diz?, universais! — que o Desdém pelo nosso idioma e a Tolice de ignorá-lo farão o resto.

«O português que os pariu» [Carlos Fino, jornal “Tornado online”]

PeroVazCaminha

jornaltornado_logoBRASIL – PAÍS AUTOFÁGICO?

22 de Abril de 1500 – Frota de Cabral chega ao Brasil

Texto: Carlos Fino, em Brasília · 23 Abril, 2016

Ao contrário dos norte-americanos, que celebram sem complexos e com orgulho o dia de Colombo (12 de Outubro é feriado nos EUA) os brasileiros não celebram nem nunca celebraram o dia da descoberta do país pela frota de Pedro Álvares Cabral

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O desejo de forjarem a sua própria identidade como se fossem filhos de si próprios desde cedo levou o Brasil – os seus ideólogos e intérpretes – a menosprezar a herança portuguesa e quase tudo o que com ela se prende, a começar pela descoberta.

Questiona-se se ela foi acidental ou planeada, contesta-se que tenha sido Cabral o primeiro, sublinha-se que o território já era habitado. Depois, sublinha-se toda a herança negativa – matança dos índios, destruição da mata atlântica, escravatura, burocracia, corrupção.

Raramente se reconhece a herança positiva – o desbravamento do território, um vasto património arquitectónico hoje reconhecido como valor universal pela UNESCO, um país de dimensões continentais unido sob a mesma língua e um fundo cultural comum, uma convivência tolerante entre as diferentes etnias…

Na leitura do passado histórico, a regra seguida pelos brasileiros é esta – se foi mau, a culpa é dos portugueses; se foi bom, é porque já eram brasileiros, mesmo que tudo se tenha passado antes da independência, em 1822.

O ressentimento anti-português (transversal, mas cultivado mais à esquerda do que à direita) é tanto mais estranho quanto é certo que em 1822 – data da independência – não havia ainda propriamente uma nação brasileira formada. E a separação deu-se mais por responsabilidade portuguesa (a exigência das Cortes liberais de retirar ao Brasil o estatuto de reino que lhe havia sido reconhecido por D.João VI em 1815) do que por exigência brasileira.

Numa palavra – foi mais a intransigência dos portugueses de cá que levou os portugueses de lá a declararem a independência. Tivesse havido mais compreensão e talvez o Reino Unido tivesse podido prolongar-se por mais tempo para benefício mútuo.

Na célebre Semana de Arte Moderna de 1922 – que assinalou o primeiro centenário da independência – os modernistas lançaram a ideia do Brasil como país antropofágico – aquele que tudo devora e assimila, tornando-se mais forte do que os elementos exógenos que a ele chegaram ou o tentaram dominar.

A partir daí, o Brasil passou a revalorizar as suas raízes negras e índias, recalcando ou votando ao esquecimento as raízes portuguesas. “Nunca fomos catequizados. Fizemos foi o Carnaval” dizia o Manifesto Antropófago, sublinhando – “Tupi, or not tupi – that is the question.”

É compreensível que queiram matar o pai. Mas o terrível drama com que os brasileiros se debatem é este – cada vez que se olham ao espelho, por mais que o queiram apagar ou negar, por mais que se pintem de preto ou de vermelho, sempre se defrontam com o português que os pariu.

Não seria mais sensato, então, admitirem-no francamente e reconciliarem-se de vez com a herança lusa?

É que esse recalcamento, mais do que um enriquecedor gesto antropofágico, acaba por ser – dada a profundidade das raízes que os portugueses aqui deixaram – um altamente prejudicial gesto autofágico.

[Transcrição integral de artigo com o título “BRASIL – PAÍS AUTOFÁGICO?”, da autoria do jornalista Carlos Fino, publicado no jornal “Tornado online” em 23.04.16. Destaques meus. Imagem de topo de Fundação Torino (Brasil).]

«Lusofonia económica» [Luciano Amaral, “CM”]

correio_da_manha_logoLusofonia económica

Andamos sempre com a Irlanda na boca mas o seu segredo foi não ter medo de americanos e ingleses.

Luciano Amaral

11.04.2016 00:30

A lusofonia económica anda mal. Vejam-se as coqueluches da elite político-económica portuguesa. O Brasil está devolvido ao colapso económico, político e institucional; Angola revelou na semana passada o desastre do seu capitalismo de monocultura petrolífera: caiu o preço do petróleo e foi logo preciso chamar o Fundo Monetário Internacional.

As esperanças que recorrentemente Portugal coloca no Brasil e em Angola tarde ou cedo confrontam- -se com a sua profunda disfuncionalidade social, económica e institucional. São essas disfuncionalidades que fazem esboroar rapidamente os seus aparentes êxitos económicos. O carinho por estes parceiros explica-se pelo facto de Portugal ser também um pouco como eles. O que é sobretudo visível nas elites do capitalismo rentista, que esperam, graças aos negócios com as elites idênticas desses países, perpetuar o ambiente de protecção e compadrio em que viveram até à crise. Veja-se, a título de exemplo, a história do Banco Espírito Santo e suas várias conexões angolanas (ESCOM, BESA…).

O medo que essas elites têm do capital de países mais desenvolvidos é o medo de se verem sujeitas a práticas empresariais mais transparentes e exigentes. Um exemplo que diz tudo é o da administração do recém-resolvido BANIF, cheia de medo do dinheiro espanhol mas ansiosa pelo da Guiné Equatorial: esperava certamente recebê-lo para tudo continuar como dantes, quartel-general em Abrantes.

As conexões lusófonas serão muito interessantes para essas elites. Para o comum dos portugueses, interessaria mais que o país se tornasse atractivo para investimento externo vindo de países que sabem fazer melhor as coisas. Andamos sempre com a Irlanda na boca, mas o seu segredo foi esse: não ter medo de americanos e ingleses. A crise de Brasil e Angola devia ser uma oportunidade para esquecermos essas fontes de dinheiro fácil.

Transcrição de: http://www.cmjornal.xl.pt/opiniao/colunistas/luciano_amaral/detalhe/lusofonia_economica.html