Imagens ilegais salvam ladrões da prisão
O facto de as imagens do sistema de videovigilância de uma de duas farmácias e de um centro comercial assaltados em Santarém serem ilegais não permitiu ontem ao tribunal condenar de forma mais severa os quatro suspeitos de praticar os crimes. A captação de imagens não estava autorizada pela Comissão Nacional de Protecção de Dados.
Os arguidos, acusados de dois crimes de furto qualificado em co-autoria, foram considerados culpados apenas de um. Três deles, de 23, 26 e 30 anos, foram condenados a dois anos de prisão, com pena suspensa por igual período. O quarto, de 18 anos, beneficiou do regime especial para jovens e apanhou 18 meses de cadeia, igualmente suspensa.
J.N.P.
[Correio da Manhã de hoje, link n.d.]
Por conseguinte.
1. Mesmo depois de “considerados culpados” e mesmo depois de haver sentença, proferida por um tribunal competente, os condenados mantêm o direito à designação de “arguidos”, com a protecção legal associada a esse estatuto. Segundo a lei, enquanto a sentença não tiver transitado em julgado (ou seja, enquanto houver hipótese de recurso), apenas existem “arguidos” que terão (ou não) cometido “alegados” crimes, sendo vitaliciamente “suspeitos” de os terem (ou não) praticado.
2. O facto de as câmeras de videovigilância, num determinado local, não estarem autorizadas pela Comissão Nacional de Protecção de Dados, invalida a utilização em tribunal das imagens por elas recolhidas, não podendo as mesmas produzir prova em juízo ou ser dadas por reproduzidas nos autos. No entanto, as mesmas imagens produzirão todos os efeitos legais e judiciais caso exista autorização da referida CNPD. Ou seja, tudo depende não das imagens em si mas apenas de um papel.
3. Isto em Portugal não está tudo doido varrido. Não, que ideia. O que se passa é que as coisas são ligeiramente diferentes da realidade e a realidade das coisas depende exclusivamente de alguém se lembrar (ou não) de alegar determinados, inúmeros, aleatórios, mais ou menos imaginativos vícios processuais, face aos quais os factos não interessam rigorosamente para nada.
Belo.
* A Clockwork Orange, traduzido para Português como “A Laranja Mecânica”, é um romance de 1962, da autoria de Anthony Burgess, que previa com muito razoável precisão o manicómio global em que hoje vivemos.