A escola sob Cerco

Reportagem/notícia SIC: o caso da professora de Sociologia ameaçada “a brincar” com um revólver “de plástico”.

Este episódio, passado há uns dias na Escola do Cerco, no Porto, é (mais) uma pequena amostra de como a docência se vai confundindo cada vez mais – e mais “alegremente” – com pura indecência.

Exemplo lapidar daquilo que é hoje em dia o professorado, uma profissão de desgaste rápido e, como se vê, de alto risco, porém aparentemente muito divertida, a julgar pelo número de “brincadeiras” inocentes que se praticam nas aulas. Depois de alunos ameaçando uma professora com um revólver “de brincar”, aguarda-se com alguma ansiedade o desenvolvimento de quejandas “estratégias pedagógicas”, igualmente orientadas para a brincadeira e para o sentido lúdico em ambiente escolar. Por exemplo, a simulação de enforcamento, com umas cordas “de brincadeira”, ou assim, ou mesmo o afogamento simulado de uns quantos “profes”, enfim, a imaginação de nossos estudantes é ilimitada.

Nada que se compare com a dos governantes que tais coisas permitem, mas lá chegarão, por certo, nossos “jovens” mai-las suas “brincadeiras”.


Adenda, uns minutos depois (às 17:09 h)

Como se tal ainda fosse necessário para que se possa aferir a total insanidade em que estamos mergulhados, a RTPN acaba de lançar um debate, no programa “Antena Aberta”, sobre este assunto.

Começa-se por resumir tudo a uma frase: “uma professora foi filmada com um telemóvel ao ser ameaçada na sala de aula com uma pistola e o vídeo está agora a circular na Internet”. Este é o enquadramento da questão.

Por isso, a RTPN lança a questão aos espectadores: “deverão ser permitidos telemóveis nas salas de aula?

Note-se: não se passou nada naquela sala, afinal. O problema, aliás, já vem de trás, desde que uma aluna histérica e absolutamente malcriada lutou com a sua professora, corpo-a-corpo, também por causa de um telemóvel. Igualmente nesse caso o problema não foi a histeria da aluna nem foi a boçalidade dos alunos que assistiram impávidos e serenos ao desacato enquanto filmavam aquelas cenas tristes.

O problema, segundo a RTPN (e de acordo com a política educativa vigente), não é a violência em ambiente escolar. O problema para a RTPN, senhoras e senhoras, meninas e meninos, o verdadeiro problema é que essas coisas possam ser filmadas e divulgadas!

Um extremoso paizinho acaba de telefonar para o programa, indignadíssimo, perdigotando para o bocal a sua “revolta” por causa desse crime de lesa-cultura que é o telemóvel nas aulas!

Logo, a solução é muito simples, e até se estranha como ainda ninguém tinha pensado nisso antes: proiba-se a utilização de telemóveis nos estabelecimentos de ensino!

E pronto, assunto resolvido. Desde que ninguém saiba o que se passa por detrás das circunspectas portas educativas, tudo jóia, na maior; aquele pessoal até pode jogar à macaca por cima das carteiras, fixe, que partam o focinho aos “stores”, é muito bem feita, eles que se amanhem. Mas lá filmar e gravar a bagunçada, eia, alto lá, isso é que não!

Então? Está tudo louco ou não está?

Vinte minutos e cinco telefonemas depois, ainda nem uma só alminha referiu outra coisa que não fosse a proibição dos telelés. Começo a achar que devia ser obrigatório… isso e câmeras de vigilância. Lá polícia-de-choque, pelo menos assim para já, para já, acho que não.

17:49 h: aleluia! Um “chefe da PSP” acaba de ligar a dizer que, se não fossem os telemóveis, ninguém saberia o que se passa nas escolas… e em outros lados. Que o problema não é os crimes serem filmados, gravados, divulgados, o problema é que os crimes ocorram impunemente! Haja Deus! Os meus cumprimentos, Chefe!

17:55: uma chavaleca a quem foi encomendada a figura de corpo presente, como “comentadora” convidada, diz: “os alunos trazem uma grande bagagem para a escola”. Deve estar a referir-se às mochilas onde, além de tacos de basebol e soqueiras, os alunos trazem outras tralhas pedagógicas. E acrescenta, a doutorazinha, à laia de receita para a indisciplina: “mais disciplinas voltadas para a cidadania, para que os alunos fiquem um pouco mais encaminhados”. Portanto. Licenciada em vacuidade aplicada, aposto.