Chipciolina

Dispositivo Electrónico de Matrícula gratuito nos primeiros seis meses

2009-02-05

Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações

Governo aprova Dispositivo Electrónico de Matrícula

Gratuito nos primeiros seis meses

O Conselho de Ministros aprovou hoje, 5 de Fevereiro de 2009, o diploma que estabelece a instalação obrigatória de um dispositivo electrónico de matrícula (DEM) em todos os veículos automóveis, reboques, motociclos e triciclos autorizados a circular em auto-estradas e vias equiparadas, bem como a legislação referente à sociedade SIEV, Sistema de Identificação Electrónica de Veículos, SA, entidade que terá o exclusivo da exploração deste sistema.

O DEM será gratuito nos primeiros seis meses (o prazo conta a partir da entrada em vigor da Portaria Regulamentar).

O carácter inovador do sistema de identificação electrónica de veículos, as suas características tecnológicas e a necessidade de salvaguardar o direito à privacidade dos proprietários e/ou condutores, tal como a questão crucial do tratamento e protecção dos respectivos dados pessoais, exigem que a prestação deste novo serviço público seja assegurada, com carácter de exclusividade, pelo Estado, através de uma entidade empresarial própria – uma empresa pública, a SIEV, SA, – que garanta a idoneidade e a legitimidade de todos os procedimentos.

O Decreto-Lei 612/2008 estipula a obrigatoriedade de instalação do DEM em todos os veículos e seus reboques, motociclos, bem como triciclos autorizados a circular em auto-estradas ou vias equiparadas. O DEM é um dispositivo electrónico que se coloca na viatura e que emite um código, cuja transmissão permite a sua detecção e identificação pelas entidades legalmente autorizadas para o efeito. Esta identificação electrónica de veículos através do DEM permite efectuar a cobrança electrónica de portagens, em conformidade com o Serviço Europeu de Portagem.

A tecnologia de comunicação a instalar no DEM e nos equipamentos de detecção automática é a tecnologia micro-ondas a 5,8 GHz, especificamente a DSRC (Dedicated Short Range Communications). Saliente-se todavia que os dispositivos de identificação ou detecção electrónica de veículos através do DEM serão dotados de um alcance meramente local, de forma a permitir o simples reconhecimento de veículos situados nas proximidades, não podendo, em caso algum, fazer o acompanhamento geral e permanente dos veículos como seria possível caso se tivesse adoptado a tecnologia GPS ou GPRS.

Para garantir a salvaguarda da privacidade dos proprietários e/ou condutores dos veículos, o diploma aprovado pelo Governo refere explicitamente que não haverá cruzamento automático e permanente entre as bases de dados dos DEM e os dados relativos aos proprietários constantes do registo automóvel. O DL 612/2008 estipula igualmente que o Instituto da Mobilidade e Transportes Terrestres, IP, (IMTT), será a única entidade a poder associar em permanência o código do DEM ao registo nacional de matrículas, não tendo, contudo, acesso à informação obtida através dos equipamentos de detecção do DEM. Também o sistema de cobrança electrónica de portagens, ao introduzir as modalidades de pré e de pós-pagamento (com prazo de cinco dias), assegurará o anonimato dos utentes. Na sequência de um processo alargado de consultas, o Governo recolheu e incorporou diversos contributos, nomeadamente recomendações da Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD).

A cobrança electrónica de portagens assegura a fluidez do tráfego rodoviário e o descongestionamento nas praças de portagem, com a consequente diminuição do impacte ambiental negativo decorrente do «pára-arranca» dos veículos. Este sistema permite igualmente uma melhoria da gestão do tráfego.

O DEM é um projecto inovador com impactos positivos na modernização competitividade da economia portuguesa: vem dinamizar o sector da telemática e criar simultaneamente uma oportunidade de negócio para as empresas na área das novas tecnologias na ordem dos 150 milhões de euros.

Portal do Governo

«Alguém duvida que em momento posterior, face a assaltos violentos seguidos de fuga, raptos, ou simples alegações de ondas de criminalidade, insegurança ou outra treta qualquer, rapidamente não seria aprovado um decreto que permitisse o cruzamento de dados, a vigilância permanente, o traçar de percursos?» [Gabriel Silva, blog Blasfémias]

Não, presume-se que ninguém duvida daquilo que é evidente. Com uma ressalva ao seu enunciado, porém: a ser aprovado, como será certamente, esse decreto-lei não irá permitir “o cruzamento de dados, a vigilância permanente, o traçar de percursos” – irá apenas autorizar a sua utilização para fins judiciais. Isto porque, como é ainda mais evidente, essas três coisinhas singelas serão feitas de imediato, logo que os chips estejam instalados. Aliás, já eram feitas antes, de forma voluntária, pelos proprietários de viaturas que instalaram sistemas de localização por GPS.

A diferença (precisamente porque existe a alternativa técnica), a questão base, reside – como diz – na imposição brutal de um meio de vigilância e controlo que se destina a limitar drasticamente aquilo que hipócrita e estupidamente diz proteger: a liberdade individual.

E não nos esqueçamos também de que, enquanto está toda a gente distraída com este lado do problema, a poucos ocorre uma outra chatice, grave, igualmente perigosa: esta engenhoca irá facilitar enormemente a vida da gatunagem; não apenas sabem quem está em casa, ou se está em casa (ou na firma) e, portanto, se é ou não conveniente assaltar o local, como ficam a saber exactamente onde está o popó que têm em agenda para gamar. Num caso de “carjacking”, por exemplo, em que as vítimas tenham a sorte de conseguir fugir, os perseguidores já saberão, ao certo, onde dar com eles outra vez e até qual a forma mais rápida de lá chegar…

Os bandidos esfregam as mãos de contentamento, mal podem esperar por esta esplendidamente cretina ajuda governamental.

Por mera economia de esforço, vulgo “matar dois coelhos com uma cajadada só”, a parte de escrita própria deste post é uma cópia integral de comentário deixado no blog Basfémias.

Já agora, uma notinha sobre o termo técnico “chip“: porque o assunto ameaça voltar à baila, aguarda-se com alguma (masoquista) ansiedade o momento em que alguém grafará “chip” como “chipe” e “chips” como “chipes”, à semelhança do que desgraçadamente sucedeu com “blog” e “blogs”. Vai ser engraçado passar a ouvir os mecânicos de automóveis a pedir ao balcão das lojas de electrónica: “ó amigo, dê-me aí meio quilo de chispes, fáxavori”.


Nota a posteriori, a respeito de um comentário neste post.

Lembram-se de que, antigamente, toda a gente tinha no “tablier” do carro um cartão-de-visita? Até havia, nesses não muito longínquos tempos, uns modelos específicos, gravados em metal.

Pois já lá vão uns anitos valentes desde que aprendi com um bandidote a nunca (NUNCA) deixar semelhante coisa à vista. Os bandidotes, mesmo – como era o caso – os menos especializados, sabem perfeitamente que isso é um convite descarado do condutor a que lhe assaltem a casa. É isso e é baixar todos os “estores” quando se vai de férias.

Mas, já agora, pergunto ainda: o que foi feito dessas chapinhas? Porque será que já ninguém as usa? Será questão de moda ou, ao menos sub-conscientemente, aquilo desapareceu da circulação porque toda a gente entendeu que não se pode estar em dois lugares ao mesmo tempo?

Então? Qual é a diferença entre uma chapinha gravada com o nome e a morada e uma chapinha electrónica com a morada, o nome e mais uma série de dados? Ah, pois, esta nova até dá para “gamar” e tudo. Dá para clonar e tudo. Enfim, dá para tudo.


Outro acrescento, em 08.02.09.

Existe uma petição online contra esta coisa inqualificável:

http://www.ipetitions.com/petition/siev/

Mesmo para quem não quiser assinar, a leitura desta petição confere – ao menos – alguns conhecimentos básicos sobre o assunto.

5 comentários em “Chipciolina”

  1. JPG, eu acho esta história do chip uma imposição nojenta e um ataque à privacidade dos cidadãos, mas não percebo bem como é que vai ajudar a gatunagem.

    Acha que se o carro estiver, por exemplo, em Lisboa e a morada associada ao chip for de Almada, os ladrões acharão que não está ninguém em casa em Almada? E que se vão dar ao trabalho de ler chips de carros para os irem buscar à noite a casa?

    É isto?

  2. Não, não é (bem) isso. Existem inúmeros relatos (principalmente de americanos) sobre as chatices que aquilo pode dar; e, note-se, nos USA (como em todo o mundo civilizado) o chip não é obrigatório.

    Alguns exemplos concretos de como aquela porcaria pode ajudar a gatunagem.

    1. Uma família vai de férias, de avião, e deixa o Bentley na garagem. Sem chip, os gatunos teriam de arrombar a garagem para ver se o carro lá está…
    2. A mesma família vai de férias, mas no Bentley. Sem chip, os gatunos teriam de arrombar a casa, à pressa, porque não saberiam a que distância estavam os proprietários, que poderiam regressar a qualquer momento. Assim, é nas calmas, até podem tomar um cafezinho à conta.
    3. O Bentley é assaltado na estrada, com a família lá dentro. No entanto, o senhor do Bentley defende-se, atropela um deles, o puto mais velho dá uma marretada na cabeça de outro, conseguem fugir a toda a velocidade e desaparecem da vista dos assaltantes, que vão imediatamente atrás deles; “graças” ao chip, estes sabem perfeitamente onde o carro está. Quando acaba a gasolina, no meio de nenhures, a família é calmamente cercada e… vingança!
    4. A família tem três carros, todos com chip (como mandará a lei portuguesa). Nenhum deles está na garagem, no passeio ou nas proximidades: a casa está pronta para a “limpeza”.

    Etc. É só puxar pela cabeça e fazer alguma investigação na net.

  3. «Acha que se o carro estiver, por exemplo, em Lisboa e a morada associada ao chip for de Almada, os ladrões acharão que não está ninguém em casa em Almada? E que se vão dar ao trabalho de ler chips de carros para os irem buscar à noite a casa?»

    Não ridicularizemos aquilo que não tem graça nenhuma. Os relatos existem na net. Por alguma razão, nos USA a localização de veículos é paga (e cara), além de estar sujeita a uma série de restrições legais.

    O “trabalho de ler chips de carros” é… nenhum. Um carro de 20.000 contos vale bem o “investimento” em localizadores de 300 ou menos.

    Então ficar a saber instantaneamente que automóveis estão, por exemplo, numa oficina, sem ter de a arrombar primeiro, não é um excelente negócio para os “negociantes” de peças?

    A clonagem de chips vai tornar-se rapidamente um outro negócio florescente. Existe o risco para os cartões de crédito mas para isto já não?

    E, afinal, vivemos ou não vivemos – cada vez mais – num Estado policial altamente vigiado? Quem será suficientemente ingénuo para aceitar que os chips servem apenas para proteger as pessoas de bem? Não era esse o papel das polícias e dos tribunais?

  4. Obrigada pelas respostas, JPG. Eu não estava a querer ridicularizar nada, só a tentar perceber. As suas respostas foram esclarecedoras, já percebi e vou divulgar.

    Outra pergunta: e não se pode avariá-los? 🙂

  5. Olá, Gi, de novo.

    Olhe que, ao que sei, “avariar” o dispositivo vai dar multa! Aliás, bem à portuguesa, tudo aquilo vai implicar uma série de novas multas e chatices sortidas. Por exemplo, não estranhava nada se, a partir de agora, uma chapa de matrícula nossa que tenha sido clonada nos faça chover em casa (automaticamente) as despesas dos gatunos…

    E os inerentes encargos para provar que não fomos nós quem passou naquelas portagens ou que assaltou aquele banco…

    É esta a principal diferença entre a chapa metálica e a chapa electrónica: até agora, eram as entidades que tinham de provar que fomos nós; agora, somos nós quem tem de provar que não fomos.

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