A diferença entre um abrupto e a «blogosfera»: a prova do monstro.

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[…] Essas pessoas falam porque têm alguma coisa a dizer? Acrescentam alguma coisa ou são elas mesmo um sinal de cacofonia? Depende como se vê a questão: elas têm alguma coisa a dizer porque querem dizer alguma coisa – essencialmente que existem e que são elas que vão mandar, que são elas que já mandam. O que têm a dizer não é novo, é ruído, é pobre, é insignificante em termos culturais, mas é a voz que fala cada vez mais alto, a voz que se ouve, a estática gerada pelas multidões e que exige ser ouvida nas sondagens, nas pseudo-sondagens dos telefonemas para dizer sim ou não, nas audiências da televisão, e que não quer esperar, não quer delegar, não quer aprender, não quer sofrer. Quer tudo e já, e só não o tem porque os «políticos» a enganam e desviam. […]

José Pacheco Pereira, colunista do jornal Público e autor do blog Abrupto, despachou ontem naquele jornal uma bula sobre aquilo que julga ser o estado geral da blogosfera; assumindo-se claramente como uma espécie de estação de triagem para reciclagem de resíduos virtuais, o articulista separa qualitativamente e quantifica por quotas o universo dos blogs nacionais: diz que 90% são constituídos por “lixo” e que os restantes 10% são “sobrantes”; por junto, ainda segundo a sua opinião, os “blogues” são, apesar de tudo, “interessantes”, [citação] “porque se move ali um monstro, que existe bem fora dos electrões. Esse monstro fala – nos blogues e nos jornais – e nós não o queremos ouvir porque ele nos coloca em causa, coloca em causa o lugar que ocupamos. Ele luta ali pelas suas regras próprias e não pelas que tomamos por adquiridas e, desse ponto de vista, convém conhecê-lo muito bem. É por isso que se aprende mesmo com os 90 por cento de lixo na blogosfera. E aprende-se ainda melhor se olharmos para os 10 por cento que não é lixo, porque para essa parte da Rede irá migrar uma parte mais dinâmica do espaço público, que conhece melhor o monstro e que já fez a prova do monstro” [fim de citação].

É isto que pensa JPP sobre a blogosfera, no essencial, e, sendo absolutamente aconselhável que se leia a referida bula por extenso(*), ficamos por conseguinte esclarecidos: todos nós, ou seja, aquelas pessoas que escrevem nos blogs, devemos ser considerados como “lixo” ou, na melhor das hipóteses, como tendo nove em cada dez probabilidades de ser “lixo”. O que não é lá muito simpático, assim a seco, posta a coisa assim de estalo, assim abruptamente como é de estilo do próprio, o verdadeiro estilo assim-assim. Estilo que, no entanto, e no caso vertente, aparece imbuído de uma irritação, quiçá um sentimento de verdadeira aversão, quase ódio incontido, por todo o universo de bloggers portugueses, o que não deixa de surpreender pela violência e pelo radicalismo; de fora da designação genérica de “lixo”, ficarão, naturalmente, os tais dez por cento (“número optimista”, segundo refere), os “sobrantes”, nos quais certamente se inclui a si próprio, e sobre os quais ameaça vir a referir-se em próximo artigo. Teme-se o pior, se tal é ainda possível.

Esperemos então sentados para ver quais serão os blogs portugueses que, não sendo “lixo”, não são também puro “ruído”, ou “estática” (electricidade?), ou simplesmente “pobres”; ficaremos cientes de quais são aqueles que não representam a “selvajaria” e que não são “inúteis, desviadores da atenção, perdulários do nosso tempo”; quais serão os tais que, por não serem “anónimos e ignorados”, não são “os degraus superiores do Inferno”. Aguardemos com ansiedade que este blogger nos esclareça, nos faça ver a luz e descubra o manto diáfano da verdade virtual.

Como diz o povo, quem não se sente não é filho de boa gente. Enquanto blogger, com muita honra me incluindo nos tais nove décimos de “anónimos e ignorados”, sentindo-me pessoalmente insultado e gratuitamente agredido, devo manifestar publicamente a mais profunda repulsa por tão ordinárias diatribes, devolvendo do mesmo passo à procedência – mas, desta vez, com conhecimento de causa – todos os epítetos proferidos por aquele autor de blogs.

Sr. Pacheco Pereira, na minha opinião o seu artigo é um exemplo de lixo escrito, e arrisca-se, tal a violência e a baixeza que demonstra, a transformar-se rapidamente em verdadeiro lixo dito e, por fim, em lixo visto, revisto e incinerado. O seu tom arruaceiro e troglodita não é um sinal de, é a mais pura e dura cacofonia, é ruído, tresanda a Praça da Ribeira, a peixeirada de mãos nas ilhargas. A forma como escreve é tecnicamente pobre, o que é lamentável, para dizer o mínimo, em quem se arvora em paladino da “cultura”, “historiador” e tudo. Pela forma desabrida e irreflectida como agride toda a gente, pela extraordinária soberba que demonstra, é a si mesmo que serve na perfeição a carapuça da (electricidade) estática. Por vezes, uns choques diz que resulta nesses casos.

Enfim, digo eu, que não mando, nem vou mandar, nem quero mandar. Mas que também não mando dizer.

João Pedro Graça

(*) A consulta on-line de artigos do jornal Público é, como se costuma dizer em linguagem “blogosférica”, a pagantimus.
Porém, houve um blog (será anónimo, será ignorado?) que se deu ao trabalho de transcrever o texto: RoubArte. Os desperdícios agradecem.
A imagem deste post é uma digitalização efectuada pelo blog Jornalismo e Comunicação.

P.S. (salvo seja): o próprio acabou de publicar uma versão ilustrada do artigo. Assim, a leitura torna-se muito mais fácil: basta ver os bonecos.

Um comentário em “A diferença entre um abrupto e a «blogosfera»: a prova do monstro.”

  1. O que o JPP quer dizer, afinal, é:

    Oh Miguel! Oh Eduardo! Vocês têm toda a razão naquilo que disseram sobre a Blogosfera.
    Concordo convosco, aquilo é lixo!
    Ah! Mas, no entanto, o que eu quero dizer é que nesse grande latão, onde colocaram as cascas de batatas, a fruta podre e as garrafas vazias, caiu, por engano, uma caixinha de surpresas muito importante e inviolável que dá pelo nome de Abrupto.
    Por favor, separem-na do resto! Tirem-na de lá!

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