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CHINESICES, PRINCÍPIOS E VALORES (E TRAPAÇAS)

E porque é fundamental assinar a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico

João Roque Dias, CT

8 de Abril de 2013

Avante, mesmo com imprecisões, erros e ambiguidades, dizem eles

Está para nascer um acordista que não aponte ao acordo ortográfico (AO90) «imprecisões, erros e ambiguidades». A começar, e à cabeça, pelo principal autor do Disparate pela parte portuguesa, Malaca Casteleiro, quando subscreveu, em 2008, o manifesto de Evanildo Bechara, o acordista-mor brasileiro, — “Considerações em torno do Manifesto-Petição dirigido ao senhor Presidente da República e aos Membros da Assembleia da República contra o Novo Acordo Ortográfico de 1990” —, divulgado durante o 3.º Encontro Açoriano da Lusofonia, no qual se pode ler:

«Só num ponto concordamos, em parte, com os termos do Manifesto-Petição quando declara que o Acordo não tem condições para servir de base a uma proposta normativa, contendo imprecisões, erros e ambiguidades».

Agora, que na Assembleia da República foi constituído um Grupo de Trabalho para analisar a aplicação [sic] do acordo ortográfico, devemos perguntar aos nossos Deputados que loucura lhes passou pela cabeça para votar favoravelmente o Segundo Protocolo Modificativo do AO90, perante uma declaração deste teor? Não lhes bastou – aos Deputados e ao Presidente da República – terem ignorado TODOS os pareceres qualificados que receberam sobre o Disparate, e ignorarem também mais esta verdadeira certidão de óbito, emitida – pasme-se! – pelos autores do próprio óbito!

A este Grupo de Trabalho, apresentou o ILTEC um ”parecer” onde se lê:

«O ILTEC é crítico em relação ao AOLP90, mas opõe-se a qualquer retrocesso na sua aplicação. (…) O ILTEC tem, como não poderia deixar de ser, uma postura crítica sobre o AOLP90. (…) O AOLP90 não permite criar, por si só, traduções únicas para o português. Nenhuma alteração à ortografia o poderia permitir. (…)»

No entanto, Malaca Casteleiro, pai do Disparate, afirma prazenteiro, mas mentindo:

«A língua portuguesa é a única com duas variantes que têm que ser traduzidas nas Nações Unidas.» (citado no Ciberdúvidas).

Avante, mesmo que não exista unificação, dizem eles

Lê-se na Nota Explicativa do AO90 que a unificação ortográfica total teria sido obtida com o Acordo Ortográfico de 1945, o tal que o Brasil renegou 10 anos depois, porque ficariam com a sua escrita demasiado “lusitanizada”! No entanto, com o AO90, os acordistas preferem ignorar o passado (mas apenas quando lhe interessa) e, como não conseguem defender o Disparate pelos seus méritos, defendem-no pelos seus putativos, miríficos e celestiais efeitos: a “unificação” da ortografia da Língua Portuguesa (mesmo que o Disparate declare não ser possível e que a sua aplicação prática atesta, como a compilação Choldra Ortográfica em Portugal – – comprova à saciedade). Claro que, na sua loucura, os acordistas dizem agora, perante o caos ortográfico instalado em Portugal, que erros e gralhas sempre existiram! Como se o Diário da República e os documentos de Universidades, de Escolas, de órgãos de comunicação social e de empresas cheios de (após 2012) “fatos de direito”, “contatos”, “impatos” e “seções” se devesse apenas a uma “simples questão de gralhas” e a “pessoas ignorantes que não sabe escrever”… Não, loucura é pouco para descrever esta gente! É má-fé, perfídia e falsidade mesmo! Com que objectivos?

Avante, mesmo com ilegalidades e violações ao tratado ortográfico, dizem eles

  • Mesmo quando existem duas versões diferentes do tratado ortográfico publicadas nos jornais oficiais de Portugal e do Brasil? Sim!
  • Mesmo que tal viole a Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados? Sim!
  • Mesmo sem nunca ter existido um “vocabulário ortográfico comum” ou um fantasmagórico “vocabulário das terminologias científicas e técnicas”? Sim!
  • Mesmo depois de o Brasil ter publicado um vocabulário unilateral e ilegal, porque viola diversas disposições do tratado ortográfico? Sim!
  • Mesmo depois de Portugal ter feito o mesmo, publicando também um vocabulário unilateral e ilegal, porque também viola diversas disposições do tratado ortográfico? Sim!
  • Mesmo se ambos os vocabulários violem o tratado ortográfico cada um à sua maneira e cada um para seu lado? Sim!
  • Mesmo quando o Estado português declara, em documento oficial de Estado, que o Disparate tinha “entrado em vigor” UM ano, QUATRO meses e QUATRO dias ANTES? Sim!
  • Mesmo que a Constituição declare que tal declaração esteja ferida de “ineficácia jurídica”? Sim!

Esta gente – os acordistas, o Presidente da República, o Governo e os Deputados – não param perante nada? Para quê e em nome de quê?

Avante, mesmo que a nossa ortografia não seja a nossa, dizem eles

Outros acordistas, talvez envergonhados pelo que vêem escrito por aí “ao abrigo do acordo ortográfico”, mas sem nunca terem espinha para denunciar o caos, agarram-se a estafadas miragens e mentiras. Uma das mais persistentes é que, como Portugal não é dono da sua própria língua (afinal, que diabo, quem poderá ser o dono da língua falada e escrita em Portugal, ou em qualquer outro país?) e que as nossas regras não poderiam ser “impostas” (dizem eles, como se alguma vez o tivessem sido!) aos outros, com uma população muitas vezes maior do que a nossa? Um bom exemplo desta gente é José António Saraiva, director do semanário Sol. Em 2012, Saraiva contou-nos como o pai lhe tinha “aberto os olhos”:

«Tudo o que pudermos fazer para aproximarmos a grafia uns dos outros é decisivo para nós. Perante isso, não tem qualquer interesse discutir chinesices, como a escrita desta ou daquela palavra

“Chinesices”, pois claro! E, depois de deslumbrado com a luz paterna, Saraiva diz mais:

«Portugal tem 10 milhões de habitantes – mas o Brasil tem 200 milhões. Só por arrogância ou por capricho se pode defender que devemos ficar ad aeternum agarrados às nossas regras.» Perante isto, Saraiva não teve qualquer problema em declarar logo a seguir: «a ortografia não envolve princípios nem valores

“Arrogância e capricho”? Claro! É preciso criar um sentimento de culpa para engolirmos o Disparate e assim expiarmos e purificarmos sentimentos tão impuros para com quem é tão maior do que nós. Sobre a arrogância e capricho brasileiros, quando foram eivando a sua ortografia de desvios e derivas em relação à matriz original portuguesa (por exemplo, com o abandono das consoantes diacríticas, ou quando rasgaram, 10 anos depois, o Acordo Ortográfico de 1945 ou, até, quando revogaram, em 1919, a adopção, em 1914, da Reforma Ortográfica portuguesa de 1911), o pai e o filho Saraiva não dizem nada. Para esta gente, a “arrogância e o capricho” são sentimentos apenas reservados a países com muitos habitantes e a nós, portugueses, estão-nos vedados os “princípios”!

Só que, feitas as contas, alguns valores deve envolver a escrita das palavras, já que o jornal de que é director, financiado com capitais angolanos, não escreve com a ortografia repudiada, ignorada e eternamente adiada por Angola! Afinal, a desgraçada realpolitik dos cifrões obriga a engolir a “arrogância e os caprichos” e importa-se mesmo com “chinesices”!

Avante, nem que seja com a trapaça dos 200 milhões vs. 10 milhões, dizem eles

Defendem os acordistas que não temos remédio, que factos são factos, que a vida é assim, e que a realpolitik (mesmo a mais enviesada) deve também ser aplicada à língua dos países: se a “unificação ortográfica” implicar a importação de uma ortografia estrangeira, estranha e espúria, que assim seja! Sim, porque “eles” são muitos mais do que nós! Hoje, dirão os acordistas, com este Disparate – mesmo com «imprecisões, erros e ambiguidades» – e amanhã com qualquer outro Disparate, quaisquer que sejam as «imprecisões, erros e ambiguidades» que venha a conter e que o Brasil anuncia já à boca cheia, nem que seja, para já, a título não oficial.

Comecemos por fazer uma simples continha, muito grada aos acordistas, quando apenas contam a população portuguesa como utilizadora da ortografia do português europeu: 200 milhões de brasileiros / 10 milhões de portugueses = 20:1. Com esta proporção – arrasadora, dizem eles – a Portugal – dizem eles – resta apenas comer e calar!

Contudo, na hora do pagamento das suas miragens, os acordistas esquecem sempre as outras contas (estas, sim, da mais pura e dura realpolitik). Por exemplo, em 2012, para o Orçamento de Funcionamento do Instituto Português da Língua Portuguesa (entidade criada para justificar o albergue espanhol em que transformaram a Língua Portuguesa), Portugal teve de pagar (e calar) o seguinte montante:

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Ou seja, na hora de pagar, Portugal é rigorosamente igual ao Brasil e a regra do 20:1 já não é aplicável. E, nem de propósito, o presidente do IILP declarou recentemente (3 de Abril, LUSA):

«O IILP está com muitas dificuldades, sobretudo financeiras e burocráticas. Um dos maiores contribuintes, o Brasil, ainda não pagou a sua contribuição e não aprovou o orçamento, deixando o instituto num sufoco financeiro”, disse, lembrando que “a maioria dos restantes membros da CPLP já cumpriu com as obrigações financeiras”.»

O que disseram os acordistas, perante este miserável comportamento do Brasil que sufoca a sacrossanta cruzada da lusofonização do Mundo, a expansão do português “unificado” e, até, a elaboração do eternamente retardado “vocabulário ortográfico comum”? Nada! Deles, não se ouviu nada. Mas, continuaram a ouvir-se, na ortografia de trapos de um pomposo “parecer” de 4 páginas da Prof. Maria Helena Mira Mateus enviado ao Grupo de Trabalho da AR, coisas destas:

«Passados 26 [sic] anos sobre a negociação deste acordo ortográfico, estamos agora numa ocasião em que constantemente se fala sobre problemas da nossa economia. Seria um grande erro não considerar o uso e a difusão da língua como uma mais-valia no campo das interações [sic] económicas e um dos mais importantes instrumentos que cabem à iniciativa governamental e coletiva [sic]

Já antes, em 2008, o Presidente da República tinha defendido a mirífica língua-portuguesa-língua-oficial-da-ONU (para a qual, o Disparate seria condição sine qua non):

«Foi desenvolvida uma estratégia para tornar o português numa língua oficial da ONU, que envolve um custo de alguma dimensão, mas a importância política é de tal monta que justifica que os países se juntem para suportar os custos».

Pois, já sabemos que “língua e oficial” e “custos” é mais uma trapaça: acaso Portugal paga do seu bolso o português, língua oficial da União Europeia? E quais custos? Nunca nos disseram, e os acordistas nunca se preocuparam em perguntar.

Um pouco mais tarde, em 2009, como um muro onde bateram as cabeças das ideias fantásticas da “língua oficial da ONU”, a XIV Reunião do Conselho de Ministros da CPLP (Praia, 20 de Julho de 2009) foi obrigada a dar o dito por não dito:

«Considerar as medidas necessárias para a possível introdução do português como “língua de documentação” das Nações Unidas, através da publicação sistemática em português de documentos da Assembleia Geral e do Conselho de Segurança, e por meio da criação de um corpo de tradutores especializados no âmbito do Secretariado das Nações Unidas, cujo funcionamento seria financiado por contribuições dos Estados Membros da CPLP».

Viram? Leram bem? A tal “língua oficial” passou a “língua de documentação”, mas a pagar! E, considerando que o pagamento seguiria princípios semelhantes aos da Língua Alemã (situação já existente na ONU), com os custos a ser repartidos ao pro rata das contribuições dos países da CPLP para o orçamento regular da ONU, a realpolitik dos pagamentos seria o seguinte:

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Pois é! Na hora de pagar na ONU, o Brasil é apenas 6,2 vezes maior do que Portugal e a regra da 20:1 (que justifica, dizem os acordistas, o abrasileiramento da ortografia portuguesa) deixa de ser aplicável: de um total de contribuições “lusófonas” para a ONU de 87 100 319 dólares, o Brasil “vale” apenas 85% e Portugal “vale” uns “miseráveis” 13%. E, falando ainda de custos, a norma brasileira do português “vale” 86% e a norma europeia (Portugal + PALOP + Timor-Leste) “vale” 14%. Como se vê, muitíssimo maior do que a relação 20:1, quando os acordistas contam apenas os números de habitantes em Portugal e no Brasil!

O Disparate só cairá por decreto, devemos dizer nós!

Vinte e quatro – 24 – anos depois de ter sido dado à luz, e depois de todas as trapaças jurídicas para o fazer entrar “em vigor” (apesar de o Decreto que instituiu a Reforma Ortográfica de 1945 nunca ter sido revogado), e de todas violações a que já foi submetido, o Disparate só pode desaparecer por efeito de algum acto jurídico.

Depois de a Assembleia da República ter ignorado as vozes dos que entregaram ao Presidente da República as primeiras 17 300 assinaturas do Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa Contra o Acordo Ortográfico e, em 15 de Maio de 2008, à Assembleia da República, as 33 053 assinaturas existentes nessa data, tornou-se claro que devia oferecer-se ao Estado português uma nova oportunidade – mais uma – para arrepiar caminho. E que, perante a inacreditável incapacidade e cegueira do Estado para o fazer, tal oportunidade deveria ser proveniente dos cidadãos portugueses.

Passam hoje 3 anos sobre a data em que foi iniciada a recolha de assinaturas para a Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico (ILCAO). A tarefa afigurava-se gigantesca: era necessário recolher 35 000 assinaturas em papel e não apenas uns cliques de rato para apoiar uma qualquer petição que enxameiam o universo da Internet. Note-se que, no Brasil, o tal país dos 200 milhões, bastaram 20 000 assinaturas recolhidas por um Movimento (para quem o Disparate ainda não é disparate suficiente) para influenciar a presidente brasileira a adiar por 3 anos a obrigatoriedade de aplicação da “nova” ortografia.

Iniciativa Legislativa Contra o Acordo Ortográfico (texto):
http://cedilha.net/ilcao/wp-content/uploads/2011/10/ILCAO3netB.pdf

E hoje, 3 anos depois, já foram conseguidas as 35 000 assinaturas? Não!

Vergonhosamente, é um facto que ainda não foram obtidas as 35 000 assinaturas em papel. Mas esta vergonha deve recair sobre TODOS os portugueses e não por quem tem dado – TODOS – o seu melhor na recolha das assinaturas, eu incluído. Sendo verdade que não se podem extorquir assinaturas a ninguém, deve reconhecer-se a “entusiástica” mobilização dos portugueses para outras causas recentes:

  • Contra o abate do cão Zico foram recolhidos – em apenas alguns dias – 70 000 “apoios”. Mas, 3 anos depois do seu lançamento, a ILCAO ainda não obteve as 35 000 assinaturas necessárias. A culpa é de quem? De todos os que se esforçam e esforçaram por recolher assinaturas? Ou de quem não a assinou?
  • Um dos grupos anti-acordistas no Facebook tem mais de 97 000 “aderentes”. Mas, 3 anos depois do seu lançamento, a ILCAO ainda não obteve as 35 000 assinaturas necessárias. A culpa é de quem? De todos os que se esforçam e esforçaram por recolher assinaturas? Ou de quem não a assinou?
  • Em 4 dias, contra a presença de um ex-primeiro-ministro na RTP, foram recolhidas mais de 100 000 apoios. Mas, 3 anos depois do seu lançamento, a ILCAO ainda não obteve as 35 000 assinaturas necessárias. A culpa é de quem? De todos os que se esforçam e esforçaram por recolher assinaturas? Ou de quem não a assinou?

Dizem alguns, agora muito vocais, que a culpa deve ser atribuída à falta da divulgação do número de subscritores. Mas não dizem, também alguns, que retêm em seu poder algumas subscrições da ILCAO, não as enviando para os responsáveis legais (leram bem, “legais”) pela sua contabilização e guarda. Importa saber com que justificação, que só pode ser a de um inqualificável “abuso de confiança” de quem lhes confiou, de boa-fé, as suas assinaturas.

E, afinal, a divulgação do número de subscritores iria “entusiasmar” as pessoas e levá-las a assinar a ILCAO? Duvido sincera e seriamente de tal relação entusiasmo-assinatura e por isso me oponho, como simples subscritor da ILCAO, a que tal número seja divulgado. Não é o número dos que já assinaram a ILCAO que faz falta. O que faz falta são as assinaturas que ainda não existem.

E não é uma qualquer atitude de bacoca curiosidade e de voyuerismo que levará à ILCAO as assinaturas que ainda faltam. E, afinal, se o maravilhoso número fosse divulgado e o “entusiasmo” não se materializasse com a rapidez desejada? Não teriam sido causados danos a uma iniciativa que deve merecer o apoio de todos?

Se estiver a ler este texto e ainda não tiver assinado a Iniciativa Legislativa contra o Acordo Ortográfico, onde a pode assinar?

É fácil! Basta imprimir a ÚLTIMA PÁGINA deste texto, preenchê-la com todos os dados indicados e enviá-la por correio (a Lei assim o obriga) para o endereço indicado.

Ou importar o impresso aqui:
http://cedilha.net/ilcao/docs/ilcassinaturaindividual.pdf

E olhe que está em muito boa companhia:
http://cedilha.net/ilcao/?page_id=832

João Roque Dias
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