«Como foi possível?»
«Algumas pessoas nos perguntam e muitas outras se interrogam: como foi possível que a entrada em vigor do “acordo ortográfico” de 1990 tenha sido aprovada pelo Parlamento? Se a esmagadora maioria do povo português demonstra a sua aversão “àquilo”, como espectacularmente demonstram todos os inquéritos e sondagens de opinião, como puderam 230 deputados aprovar a RAR 35/2008 com 17 abstenções e apenas quatro votos contra?»
Na votação de hoje na Assembleia da República, estava em causa apenas a adesão de Timor-Leste ao Acordo Ortográfico e a possibilidade deste poder entrar em vigor após três ratificações, como estabelece o segundo protocolo modificativo.[“Despacho” da agência Lusa, 16 de Maio de 2008. Este “despacho” foi reproduzido na altura pela generalidade da imprensa portuguesa.]
Eu próprio, tal como muitos Sr.as e Srs. Deputados, assisti a um lancinante apelo de um português que está em Timor e que pedia que se ratificasse este Acordo Ortográfico para que possa ser uma realidade o ensino do Português em Timor Leste, com professores portugueses mas também brasileiros, ou angolanos, ou moçambicanos.
[Excerto de intervenção em plenário de Pedro Mota Soares (deputado), durante a discussão da RAR 35/2008, em 16 de Maio de 2008.]
O que está aqui hoje em discussão — no fundo, o conteúdo deste Segundo Protocolo Modificativo — é a entrada em vigor desse mesmo Acordo Ortográfico, a sua abertura à República Democrática de Timor Leste e o prazo limite de seis anos para adaptação dos manuais. Isto, depois de um Primeiro Protocolo Modificativo que alterara o texto inicial, quando este previa, como prazo para ratificação por todas as partes signatárias, a entrada em vigor do próprio Acordo Ortográfico no ano de 1994.
[Excerto de intervenção em plenário de Rui Gomes da Silva (deputado), durante a discussão da RAR 35/2008, em 16 de Maio de 2008.]
Fica a pergunta: quantos dos 204 deputados terão votado favoravelmente a RAR 35/2008 julgando estar a aprovar não a entrada em vigor do AO90 mas apenas a admissão de Timor-Leste como Estado subscritor?
Adenda, em 04.02.13, às 16:20 h., por sugestão de Maria José Abranches.
«Sugiro que aqui, nesta mesma página, seja integralmente reproduzido o “Acordo do Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa”, feito e assinado em São Tomé em 25 de Julho de 2004. E conviria também destacar as datas e locais referidos no texto, de modo a que os portugueses percebam o decorrer de todo este processo. E destacar também esta passagem :«Evocando a recomendação dos Ministros da Educação da CPLP que, reunidos, em Fortaleza em 26 de Maio de 2004, na V Reunião de Ministros da Educação, REITERARAM SER O ACORDO ORTOGRÁFICO UM DOS FUNDAMENTOS DA COMUNIDADE (…)»
Talvez os nossos deputados ainda estejam a tempo de LER o que aprovaram à toa e de decidir ao serviço de quem estão!»
A RAR 35/2008 aprovou o Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que seguidamente se transcreve na íntegra, implicando essa aprovação parlamentar a entrada em vigor – de facto mas não de Direito – do AO90 em Portugal.
Segundo Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa
A República de Angola, a República Federativa do Brasil, a República de Cabo Verde, a República da Guiné-Bissau, a República de Moçambique, a República Portuguesa, a República Democrática de São Tomé e Príncipe e a República Democrática de Timor- Leste:Considerando que, até à presente data, o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, assinado em Lisboa, a 16 de Dezembro de 1990, ainda não pôde entrar em vigor por não ter sido ratificado por todas as partes contratantes;
Tendo em conta que, desde a IV Conferência de Chefes de Estado e de Governo da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), ocorrida em Brasília a 31 de Julho e 1 de Agosto de 2002, se adoptou a prática, nos Acordos da CPLP, de estipular a entrada em vigor com o depósito do terceiro instrumento de ratificação;
Recordando que, em 2002, por ocasião da IV Conferência de Chefes de Estado e de Governo, a República Democrática de Timor-Leste aderiu à CPLP, tornando-se o oitavo membro da Comunidade;
Evocando a recomendação dos Ministros da Educação da CPLP que, reunidos, em Fortaleza, a 26 de Maio de 2004, na V Reunião de Ministros da Educação, reiteraram ser o Acordo Ortográfico um dos fundamentos da Comunidade e decidiram elevar, à consideração da V Conferência de Chefes de Estado e de Governo da CPLP, a proposta de se aprovar o Protocolo Modificativo ao Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa que, além de permitir a adesão de Timor-Leste, define a entrada em vigor do Acordo com o depósito dos instrumentos de ratificação por três países signatários;DECIDEM as partes:
1. Dar a seguinte nova redacção ao Artigo 3 do Acordo Ortográfico:Artigo 3º
“O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa entrará em vigor com o terceiro depósito de instrumento de ratificação junto da República Portuguesa”.
2. Acrescentar o seguinte artigo ao Acordo Ortográfico:Artigo 5º
“O presente Acordo estará aberto à adesão da República Democrática de Timor-Leste”.
3. Estabelecer que o presente Protocolo Modificativo entrará em vigor no primeito dia do mês seguinte à data em que três Estados membros da CPLP tenham depositado, junto da República Portuguesa, os respectivos instrumentos de ratificação ou documentos equivalentes que os vinculem ao Protocolo.Feito e assinado em São Tomé, a 25 de Julho de 2004.