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Director Mário Bettencourt Resendes    Director Adjunto António Ribeiro Ferreira
Segunda Feira
29 de Outubro
de 2001
edição n.2130

 
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Tempo dos heróis da guerra acabou

JOÃO PEDRO FONSECA


Desde há um ano que Timor deixou de ser notícia no mundo, porque deixou de haver violência. É uma boa notícia para os timorenses. A que se deve esta situação?

É boa notícia? Eu digo que é boa e é má. Má porque as pessoas podem começar a esquecer mas é boa nessa optica. Porque há paz. Deve-se a um grande esforço da UNTAET, das Forças de Segurança e devo realçar o papel do Contingente do Sector Central, (militares portugueses) dos mais sensiveis em questão de violência, dos partidos, dos políticos e da sociedade civil. Também da Igreja, claro, na mediação de confitos, atenuamento de tensões.

Na sua opinião por quanto tempo precisará Timor do apoio da ONU.

Em tempo não posso dizer. Mas posso definir em efeitos, objectivo e resultados. E isso é muito simples. Quando os timorenses estiverem com capacidade de seguirem sozinhos.

Uma estudante perguntou-lhe porque "hesitou" em aceitar candidatar-se a presidente. Não gostou da palavra "hesitar", porquê?

Todo esse processo foi muito custoso. Tenho que explicar isto bem. Acabou a luta da resistência com o referendo. Depois acabou o CNRT e há milhares de homens que deram a vida por esta luta pela independência. Quando chorei, no fim do CNRT, não foi de tristeza. Era muito importante cortar os laços com o passado. Aqueles homens ganharam esta guerra. Têm o direito de, agora, colher os frutos. Ter um lugar ao sol. Mas não podia ser assim. Estes homens lutaram como eu, mas não servem para aquilo que precisamos agora: a construção de um País. Tive que lhes mostrar que o passado acabou. "Fomos ontem algo".

Mostrar-lhes que agora começa um novo capítulo?

Eu disse várias vezes, para que os meus companheiros compreendessem: "Isto agora é um tempo novo, são precisas novas capacidades". Se eu não fizesse isto, se eu não explicasse que tive o meu papel, que agora é o tempo de outros entrarem em cena, eles reinvidicavam um lugar ao sol. Quando percebessem que não havia lugar para eles diziam que eu só queria o poder.

Está explicado por que razão andou sempre a dizer que não aspirava a ser Presidente, que queria ser um cidadão normal...

Aquele era um momento que precisava de uma resposta. Deveríamos pensar no sistema e não nas pessoas. É o sistema que pode garantir ao povo as suas satisfações, não são as pessoas. Eu simplesmente respondi ao processo.

Acredita que os timorenses perceberam isso?

Eu acho que sim. Que perceberam.

E sabem que podem contar consigo se precisarem?

Claro. Também disse que nunca iria falar em abandonar. Nunca tomaria a atitude de me desligar do processo sabendo que estamos a atravessar um período difícil. Mas sei que a modificação da sociedade civil para uma maior responsabilidade tomará um papel mais efectivo.

Em termos formais, como se candidatará, como independente?

Não. Eu não me candidato. O que eu fiz foi aceitar a candidatura feita pelos partidos.

E aceitará disputar eleições mesmo que existam outros candidatos?

Mas claro.Melhor ainda. Nesses termos seria optimo, eu até gostaria de perder...

No seu íntimo, perder era antecipar o sonho, fotografar, estar com a família, tratar da terra...

É verdade. Cumpriria o sonho, só que mais rapidamente...

Está a angariar ajuda para os veteranos da Resistência?


Cá em Portugal? Não. Fui a Perth e Melbourne participar em conferências e deram-me dinheiro. Eu dei à Associação dos Veteranos. Aqui, (em Portugal) se por acaso receber algum dinheiro, será para esse efeito.

Estão em dificuldades esses 18 mil homens?

Muito estão. Não têm meios sequer para levar os filhos à escola. São quadros da Resistência clandestina.

Megawatti, se tivesse sido Presidente em 1999 talvez não tivesse havido referendo. Hoje não vê nela quaisquer riscos para Timor?

Nós fomos lá (a Jacarta) mesmo a calhar com o ataque terrorista a Nova Iorque e foi muito cordial. Aliás, a 17 de Agosto, Dia Nacional da Indonésia ela expressou que o caso de Timor era diferente e que o Governo indonésio reconhece o processo, apoia a construção da Nação de Timor.

O poder dos generais que "comandaram" a ocupação de Timor é ainda um risco? Já estão afastados do poder político?

Não todos. Mas penso que o TNI, as Forças Armadas indonésias viraram para uma nova doutrina, embora possa ainda haver alguns elementos descontentes. Ficou um sentimento de tristeza, de frustração mas incapazes de contrariar um processo, lento, de mudar a sua doutrina.

Em Fevereiro de 1999 estive consigo em Jacarta, quando recebeu os líderes políticos pró-integração, Domingos Soares, João Tavares, Hermínio da Silva, e outros. Todos vocês choraram e deram abraços em promessas de reconciliação. Ao mesmo tempo eles armaram as milícias. Já falou com eles recentemente sobre esses tempos?

Sim. Encontrámo-nos em Bali. Juntaram-se numa organização, a Untas. verificámos que o processo de reconciliação e regresso dos refugiados não estava a andar bem com eles. Estamos a ter contactos com os comandantes de milícias. Esse processo sim está a ter êxito, estão a vir em grandes grupos.

Esses líderes políticos não querem voltar a Timor?

Muitos deles querem. Mas existem muitas diferenças entre eles e não conseguem responder de forma consensual a todas as condições inerentes ao processo.

Que pensa da Igreja ter impedido que Filomeno Jacob fosse ministro?

Aí não faço nenhum comentário. Não tenho o direito de me imiscuir nas regras da própria Igreja.

Mas a Igreja ainda tem um papel importante em Timor a nível político?

Sim, a nível político e em termos pedagógicos, para apoiar a mudança de mentalidades, a mudança de consciências, porque este processo necessita que os timorenses ganhem nova percepção dos problemas.

O processo de construção democrática em Timor pressupõe uma separação de poderes entre Política e Igreja?

A Igreja definiu isso com clareza.

Como se vê, ainda interfere...

Não, não penso que interfira. Actua ao nível da sociedade civil. Se interferir... bem, eu tenho a minha opinião pessoal e em democracia defende-se a liberdade de expressão, em termos de tolerância, respeito pelas instituições.

NÃO CREIO QUE O POVO INDONÉSIO SEJA VIOLENTO

Já disse que é contra os bombardeamentos no Afeganistão. Defende-o por princípio...

É por princípio, de quem passou por uma guerra. Eu não sou contra a acção tomada pelos americanos, eu disse apenas que testemunhei muito sofrimento. Tenho os meus ideais. Preferia qualquer solução que não a guerra.

Quando estava no mato sofreu com bombardeamentos...

Ainda no mato, durante a guerra ouviamos muito falar da nova ordem mundial, os dois blocos mundiais. Assistimos ao colapso do bloco socialista e pensámos que se prosseguíssemos a luta e adquiríssemos a paz poderiamos estar integrados nesta ordem mundial. Só que esta nova ordem não apareceu. Antes de acabar a guerra em Timor apareceu um outro slogan, a globalização. E, hoje, o esforço de construir a paz com os vizinhos, sinto que não existe essa ordem mundial. Ou pelo menos é muito diferente daquilo que almejávamos.

Timor está a nascer num mundo diferente. Pior ou melhor?

Não sei, mas é muito diferente. É um mundo de receios. Um mundo em que cada um desconfia do outro, tem medo de sair.

Refere-se ao terrorismo?

Agora estou em Portugal. Vou para Macau e dali para Timor. Sei que se a rede terrorista mundial estiver implantada nesse itinerário não serei eu o alvo. serão certamente outros, mas eu estava ali e morri por uma estupidez de coincidências. Eu apoio todos os esforços contra a rede de terroristas.

Xanana conhece bem alguns líderes islâmicos indonésios. Parece-lhe que há algum perigo de uma reacção negativa contra os bombardeamentos?

Não é essa a posição dos líderes religiosos muçulmanos, nem é a posição do Governo de Jakarta.

Os movimentos islâmicos indonésios são moderados?

Eu creio que, na sua essência são. Existem facções radicais. No processo de Ambon também havia um movimento jihad. Quando estive em Jakarta a 30 de Setembro, havia um grupo de contestação, que depois se tornou maior. Mas não creio que o povo indonésio tenha um cariz violento, de defender o terrorismo.

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