7/7/2001

 
 
 
 
 
TIMOR-LESTE
Missão de urgência
 
Nas Nações Unidas, as principais potências querem cortar na missão em Timor-Leste, e um alto funcionário da ONU demite-se, por discordar da orientação da ONU no território. Em Díli, assinou-se um acordo-chave para o seu futuro
 

 
Soldados portugueses em Timor, no princípio deste ano: uma missão que passará a custar cara a Portugal, se a ONU decidir diminuir o empenhamento no território
 
QUANDO Jorge Sampaio esteve em Nova Iorque, na semana passada, na conferência da ONU sobre a sida, não só teve os habituais encontros bilaterais com o secretário-geral Kofi Annan, como jantou com funcionários superiores do gabinete de Annan. O objectivo deste encontro, tão pouco habitual, foi definir uma estratégia comum para derrotar qualquer tentativa dos Estados Unidos, da Grã-Bretanha ou da França para limitarem o empenhamento militar ou civil em Timor-Leste, antes de o futuro país poder andar pelos seus próprios pés.

O EXPRESSO soube que tem havido discussões entre o Departamento de Estado norte-americano, o Pentágono e o Conselho de Segurança Nacional, com a administração Bush a avaliar se deve exigir que qualquer compromisso internacional para com Díli, após a independência, deva ter como base contribuições voluntárias, pagas pelos Estados-membros interessados - como a Austrália e Portugal - em vez de continuar a ser um programa da ONU pago por todos os Estados-membros. Essa estratégia concordaria com a pretensão da equipa de Bush de reduzir os compromissos externos dos Estados Unidos e limitar os custos operacionais da ONU. Mas iria impor severas exigências financeiras a Portugal, numa altura em que o orçamento do Estado já está muito solicitado.

Falando anonimamente, os funcionários de Bush dizem que os aspectos civis de qualquer operação da ONU «devem ser restringidos à garantia de apoio do Congresso. Devem ser encarados como pequenos adicionais ao elemento militar. O Congresso não acha que devamos entrar no negócio de construir países».

A próxima batalha

John Miller, porta-voz da Rede de Acção para Timor-Leste, com sede nos EUA, discorda dessa avaliação. «Ainda há muito apoio para Timor-Leste no Congresso e duvido seriamente que o Congresso objectasse ao pagamento de qualquer apoio ao país, após a sua independência», disse ele.

«Mas não me surpreende que a equipa de Bush queira cortar o programa, só que estão a usar uma má desculpa», acrescentou. «O nosso entendimento é que, no final, a administração se irá revelar flexível e concordar na continuação de uma componente civil para a operação da ONU a ser financiada pelas contribuições de todos os membros da ONU», rematou o porta-voz.

Mas a verdade é que os britânicos também deixaram claro o seu desejo de reduzir o custo da operação. Na última reunião do Conselho de Segurança para Timor-Leste, a 18 de Maio, o embaixador britânico, Sir Jeremy Greenstock, exigiu que a ONU seja «consciente dos custos» relativamente a Timor-Leste e «melhore a sua gestão orçamental, particularmente a falta de progresso na recuperação de custos - ou seja, tarifas de electricidade e água, registo de veículos e taxas aeroportuárias».

Têm sido os franceses, contudo, os mais cépticos quanto ao prosseguimento de uma grande operação civil em Timor. Acham que o dinheiro poderia ser mais útil para operações em locais mais estrategicamente vitais, como o Congo.

Foi com este pano de fundo que o jantar de Sampaio decorreu na residência oficial do embaixador de Portugal na ONU, Francisco Seixas da Costa, que disse ao EXPRESSO que prevê «uma próxima batalha no Conselho de Segurança». Segundo disse, «Portugal está preocupado com a tentativa de alguns países para reduzirem fortemente as forças em Timor-Leste».

Reunião concorrida

No encontro, estiveram presentes a secretária-geral-adjunta, Louise Frechette, que esteve toda a semana em Timor; Iqbal Riza, chefe de gabinete de Kofi Annan; Sir Kieran Prendergast, subsecretário-geral para os Assuntos Políticos; Jean-Marie Guéhenno, subsecretário-geral para as Operações de Manutenção de Paz; e Mark Malloch Brown, o administrador do Programa de Desenvolvimento da ONU.

Igualmente presente esteve o presidente da Assembleia Geral da ONU, o antigo primeiro-ministro finlandês, Harri Holkeri; o embaixador sueco, representando a presidência da UE e o embaixador de Portugal em Washington.

História de sucesso?

Os funcionários superiores da ONU concordam com a posição portuguesa. «Fazer nascer um país é um processo que requer paciência e ternura», disse um deles ao EXPRESSO. «Não podemos meramente sair depois da independência, pois as milícias veriam isso como um sinal, uma luz verde para retomarem os ataques. Toda a gente nesse jantar concordou que Timor-Leste ainda não tem uma base forte de sobrevivência e que vai precisar de um forte apoio da comunidade internacional, durante algum tempo».

Sem ser referido, existe a sensação de que Timor-Leste pode vir a ser considerado como uma «história de sucesso» da ONU, e a organização teve muito poucas nos últimos anos. «Kosovo, Timor-Leste - parece muito possível que, nos próximos anos, a ONU seja chamada a efectuar mais trabalhos destes como governo de transição», prosseguiu o mesmo funcionário. «Seria excelente fazer isso tendo por detrás uma experiência bem sucedida em Timor».


TONY JENKINS, correspondente em Nova Iorque

 
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