Do Portugal Arguido – VIII


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Torres Vedras, Lisboa, 10 Abr (Lusa) – O empregado Pedro Jorge, de 30 anos, da fábrica Cerâmica Torreense, de Torres Vedras, acusa a entidade patronal de o pretender despedir por ter afirmado num programa de televisão que não é aumentado desde 2003. (DN)

Aquilo que aqui está em causa não é a filiação partidária da pessoa em causa (PCP), se é ou não activista político (dirigente sindical da CGTP) ou se disse o que disse infundadamente (não sabemos).

Também não está em causa o direito de qualquer Empresa exigir dos seus funcionários o cumprimento integral de todos os deveres contratualmente previstos, nomeadamente o dever de lealdade do empregado para com a Empresa empregadora.

O que está aqui em causa, isso sim, é o facto de ter sido movido um processo disciplinar a um cidadão português pelo facto de este não ter ocultado a sua identidade. Tivesse ele dito rigorosamente as mesmas coisas com um capuz na cabeça, por exemplo, e já nada se passaria.

Este é, por conseguinte, mais um exemplo paradigmático do anacronismo e da tacanhez que vai tolhendo a máquina da justiça, em Portugal, a todos os níveis. Se não é verdade aquilo que o seu funcionário disse, então a Empresa em causa deveria ter publicado um desmentido e provado a atoarda, accionando então – e só então – os meios legais ao seu alcance; onde está esse desmentido***? Porque se recusam os responsáveis da Cerâmica Torreense a falar sobre o assunto à comunicação social?

É absolutamente indiferente, neste como em qualquer outro caso do género, que o objecto de acção disciplinar seja militante comunista, dirigente sindical, casado, electricista e, se calhar, adepto do Benfica, apreciador de caracoletas assadas, praticante de aeromodelismo ou mesmo blogger renitente. O que não é indiferente, aquilo que muda toda e qualquer perspectiva sobre estes cada vez mais rotineiros processos repressivos, é a evidente perversão das finalidades e da própria mecânica da justiça, em sentidos lato ou restrito: trata-se de perseguir por todos e quaisquer meios a personalidade do indivíduo e não os actos individuais nocivos à comunidade; trata-se de punir essencialmente quem diz o que se faz e não quem faz o que se diz; trata-se de utilizar a máquina da justiça como trituradora e cilindro compressor da opinião.

Trata-se, em suma, de mais um descarado convite ao anonimato, à voz distorcida e à face esborratada, à denúncia soez e cobarde ou, o mesmo é dizer, de empurrar a opinião individual para um estatuto legal de absoluta clandestinidade.

*** Caso exista, o que desconheço, ou venha a existir um desmentido sustentado, e nomeadamente se se comprovar que houve prejuízos envolvidos, teremos de reconhecer os direitos de resposta e de retorno da Empresa em causa – o que não invalida de forma alguma os pressupostos políticos deste incidente.

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