A forma politicamente vesga e sociologicamente cavernícola como a nomenklatura tuga trata (d)os assuntos brasileiros reflecte-se claramente na inacreditável sucessão — em quantidade, extensão e número de envolvidos — de peças “jornalísticas” sobre a data em que, segundo não rezam as crónicas mas muito repetem alguns nas suas, Portugal deixou de “explorar” os brasileiros, de “roubar” o ouro “deles” e de cometer genocídio (!!!) sobre os povos indígenas lá dos sertões e das florestas amazónicas.
Estribados numa pretensa superioridade do Brasil e dos brasileiros em relação ao “colonizador explorador e torcionário”, essa alucinação rapidamente resvalou ainda mais para baixo, para uma forma de desprezo pelas reais origens daquele país, para a hostilização sistemática dos portugueses em geral e para uma verdadeira sanha persecutória quanto a tudo aquilo que mesmo se remotamente lhes cheire a “terrinha”. Este absurdo e insuportavelmente insultuoso preconceito está já estudado, se bem que mal, e dicionarizado, neste caso muito bem: lusofobia. Um tipo de racismo, portanto, como claramente denota o sufixo, um exclusivo que brasileiros dedicam a Portugal.
[‘Independência ou morte – 11.08.22]
Ah, pronto, cá está de novo a rapsódia do “colonialismo” dos portugueses, esses malvados que têm de pagar caro — e até ao fim dos tempos, se não mais — pela insuportável pesporrência de terem “colonizado” o 5.º maior país do mundo, o qual, de resto, até já existia antes da chegada dos ditos malvados. É que, segundo reza a Cristina, naqueles virginais e impolutos 8.510.345 Km² não há absolutamente violência alguma, tal coisa jamais existiu, o Brasil nem é um dos países mais violentos do mundo nem nada, fomos e somos nós que malignamente pecámos e pecamos ocultando a «violência da colonização portuguesa do Brasil». E não podia faltar à historinha, pois claro, o infalível, omnipresente “argumento” — que a Cristina põe na boca da criancinha — do ouro que os “cara” da “terrinha” foram lá “roubar”: «“Mostraram-se muito interessados no nosso ouro e prata”».
[‘Brasil colonizando Cristina’ – 07.03.23]
O que se há-de fazer? É uma fatalidade, um fado. O que mais há por aí é portugueses com “síndrome do colonizador”. A paranóia — ou obsessão ou monomania — está de tal forma arreigada no espírito do chamado “português médio” que dir-se-ia estarmos perante um caso evidente, iminente, perigosamente patológico; para o qual, aliás, dado o enorme número de afectados, não seria possível arranjar em tempo útil um contingente de psiquiatras e outros especialistas em afecções na caixa dos martelos, como carinhosamente diz o povo; ainda que se importassem uns quantos contentores cheios desses profissionais, nem pondo toda a indústria nacional a trabalhar 24 sobre 24 horas no fabrico de sofás seria possível deitar tantos pacientes a debitar suas lamúrias, expiando a “culpa” de Portugal por ter-se atrevido a fazer alguma coisa decente — o que para os padrões actuais da tugaria é absolutamente inadmissível, um pecado horrível.
[‘A “escravização” do Principado da Pontinha (e do Brasil, claro)’ – 01.08.23]
“A História que se aprende no liceu é uma História de brancos. Transmite-se uma ideia de superioridade europeia que é falsa. Quando digo aos meus alunos que eram os africanos que controlavam o preço no comércio de escravos, eles ficam de boca aberta”
Clara Teixeira
revista “Visão”, 15.10.23Com a publicação de ‘Portugal na História – Uma Identidade’ (Temas e Debates, 640 págs., €24,90), João Paulo Oliveira e Costa, 61 anos, historiador e professor catedrático, quis reflectir e explicar a existência longeva de Portugal, um pequeno país do extremo da Europa que se mantém independente há quase 900 anos. A recente atribuição do Prémio John dos Passos 2023, criado para perpetuar a memória do escritor norte-americano de origem madeirense, foi o pretexto para uma entrevista com o autor da obra, que o próprio define como um ensaio historiográfico de geoestratégia. O debate e a polémica sobre os Descobrimentos, período no qual se especializou, e o papel dos portugueses na escravatura, também chamados à conversa, são para ele “uma perversidade” e “uma importação do que se passa nos EUA”. E também uma consequência do facto de se ensinar “uma História de brancos” nos liceus.
O que é este livro? Não é uma História de Portugal, no sentido clássico. São as reflexões de um historiador?
Um amigo disse que podia ser a minha obra de fecho. Sempre me interessei por História e sempre viajei com a História. Como especialidade, escolhi a história dos Descobrimentos e da expansão e, como professor e investigador, interessam-me as questões da identidade. O livro é um ensaio historiográfico de geoestratégia, para tentar perceber Portugal e a mim próprio, que sou português. É uma longa reflexão, feita ao longo de 50 anos de vida.Que mensagem quis passar sobre a identidade dos portugueses?
Não quis passar nenhuma mensagem. Quis reflectir e demonstrar que somos um país profundamente europeu, e que nunca estivemos de costas voltadas para a Europa.Somos um país de certa forma improvável, tendo em conta que estamos num canto da Europa e temos os espanhóis por vizinhos? (mais…)